Cidades

Pescadores de Alagoas contabilizam prejuízos

Diversos tipos de atividade têm sido prejudicados com o derrame de óleo; seguro-defeso não contempla maioria dos casos

Por Evellyn Pimentel e Lucas França com Tribuna Independente 31/10/2019 08h54
Pescadores de Alagoas contabilizam prejuízos
Reprodução - Foto: Assessoria
O derrame de óleo que atinge o litoral nordestino desde o fim de agosto tem causado danos econômicos graves a produtores e pescadores alagoanos. Por aqui, as primeiras manchas foram detectadas no início de setembro e, além da perda das produções atingidas por óleo, outros fatores como a proibição antecipada da pesca de camarão e lagosta, o medo em consumir pescados e até de adentrar ao mar geram incertezas e muitos prejuízos. Na tentativa de amenizar os prejuízos para os produtores, os Ministérios do Meio Ambiente (MMA) e da Agricultura e Pecuária (Mapa) liberaram parcelas extras do seguro defeso e anteciparam o período de defeso para a pesca de arrasto, camarão e lagosta. A expectativa é de que 60 mil pescadores do Nordeste sejam beneficiados. No entanto, o impacto vai além, porque o seguro defeso não contempla todos os tipos de produtores e pescadores afetados direta ou indiretamente. Em todo o Nordeste são 360 mil pescadores cadastrados das áreas continentais (rios) e marinhas – atingida pelo vazamento de óleo. O Mapa, juntamente com os ministérios da Economia e do Meio Ambiente, está construindo um ato administrativo para embasar o pagamento da parcela do seguro-defeso. “O Governo Federal está trabalhando para amparar os nossos pescadores artesanais”, disse o órgão. No entanto, não haverá mudança no calendário de pagamento do seguro defeso para os pescadores não afetados diretamente pelo vazamento de óleo. A reportagem da Tribuna Independente solicitou os números de pescadores que teriam direito a parcela extra por estado, mas segundo a assessoria de comunicação do órgão, os dados ainda estavam sendo levantados. A reportagem esteve em contato com diversas comunidades que dependem dos pescados para a subsistência. Do Litoral Norte ao Sul de Alagoas a reclamação é a mesma: prejuízos. Produtores de ostras em Coruripe, no Litoral Sul, amargam a perda de produção. A região foi severamente atingida, inclusive com o avanço do óleo em 7km no Rio Coruripe. Como as ostras são organismos filtradores, foram os primeiros a sofrer os impactos da chegada do óleo. De acordo com a presidente da Associação de Ostreicultores de Coruripe, Rosedite Pereira, são 13 famílias vivendo do cultivo. Ela conta que os produtores estão preocupados porque não sabem como restabelecer a produção ou quanto vai demorar para que a natureza se recomponha do dano. “Nós que trabalhamos com as ostras tivemos um impacto muito forte porque acabou com os bancos da semente. Onde o óleo pegou vai levar muitos anos para reproduzir novamente as ostras. São 13 famílias dependendo diretamente e nós não recebemos defeso. Aqui não temos o defeso de ostras. Na Bahia a compensação para as pessoas que foram prejudicadas veio pela Secretaria de Assistência Social. Aqui não tivemos”, detalha Rosedite Pereira. Comunidade depende apenas das ostras para sustento   O pescador Claudionor Roberto da Silva trabalha há 19 anos na atividade pesqueira e recentemente começou na produção de ostras. “Tenho navegação, motores, rede de pesca, tenho nylon, pesco em alto mar, pesco lambuda, puxo rede, pesco de arrastão”, resume. Ele afirma que o clima por lá é de insegurança. “Essas manchas de óleo estão prejudicando todos os pescadores tanto os de alto mar, quanto da costa. Nos rios também”. Antônio Barbosa Neto também é da mesma comunidade produtora de ostras e trabalha há cerca de três anos com a produção. “Aqui no povoado em que moramos o problema maior está sendo com as ostras. Os prejuízos que nos estamos tendo é que está morrendo alguns peixes e mariscos. E não temos nem ideia de quando esse óleo vai parar de nos dar prejuízos. Porque se os mariscos morrerem nós ficamos sem mariscos para vender e quanto tempo vai passar para que nos voltamos a trabalhar com os mariscos? Tínhamos ostras no manguezal que íamos coletar para vender, mas agora não podemos mais, porque não sabemos que risco esse óleo traz e mesmo assim aonde esse óleo pega está fazendo com que as ostras morram”, explica. Prejuízos vão de Norte a Sul do estado   No Litoral Norte do estado a situação de perdas é semelhante. Jovina Ferreira Lopes, tesoureira da Associação Mariostra, em Porto de Pedras, avalia que houve perda de 70% da produção. Por lá, o óleo chegou ao estuário do Rio Manguaba, mais precisamente a 4,5km mangue adentro. “A perda prejudica diretamente 22 famílias que trabalham com o cultivo das espécies. Infelizmente, até segunda ordem, estamos com nossas atividades paradas. Tivemos uma reunião no fim de semana com a presença dos ostreicultores e o Secretário Municipal do Meio Ambiente de Porto de Pedras, técnicos do IABS [Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade] a nível federal e estadual. Foram coletados materiais para análise do óleo, da água e a lama do mangue para ver o nível da contaminação. Enquanto isso aguardamos o resultado. Todos os impactos econômicos e ações  serão melhores avaliados e definidos quando o resultado técnico sair’’. Jovina acrescenta que os membros da associação trabalham com as ostras nativas e com as sementes de ostras desenvolvidas no Laboratório da Universidade de Santa Catarina. “Então esse seguro, caso saia, vai ajudar. Mas não sabemos de fato o impacto real’’, lamenta. Outro membro da Associação Mariostra, Pedro Oliveira, afirma que o óleo levou embora um trabalho árduo de adaptação da espécie. A substância causou contaminação nos organismos e ele questiona o que vai ser feito para minimizar os prejuízos. “Com certeza o mangue também está sendo contaminado, assim como os animais que vivem por lá. As ostras, por exemplo, vieram de Santa Catarina e tiveram que passar por uma adaptação em laboratório para conseguir a reprodução nas nossas águas, que são mais quentes que as do Sul. Todo nosso trabalho foi perdido. Agora, resta saber se vamos ter apoio do poder público e de qual forma”. “Governo precisa avisar o que está em risco e o que pode ser consumido”   Se por um lado há morte de massunins, ostras e diversos outros organismos, por outro, produtores tentam minimizar os efeitos negativos. O engenheiro de Pesca, professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e doutor em Aquicultura Luciano Amorim é presidente da Associação dos Criadores de Camarão de Alagoas (Accal) e relata a tensão que os produtores têm vivido desde a chegada das primeiras manchas de óleo. “Os preços pagos ao produtor já estão em queda, reflexo da redução do consumo. Os prejuízos são reais, mas ainda não podemos medir o tamanho do impacto. E, para nossa tristeza, não sabemos até quando isso vai durar. O Governo precisava avisar a população o que está em risco e o que pode ser consumido”, alerta Amorim. A produção utiliza captação de água das regiões afetadas e a preocupação é de que haja contaminação dos animais. “Ainda não identificamos mortalidade nos camarões de cultivo... Estou falando dos viveiros de cultivo. Pode acontecer sim [contaminação]. As probabilidades são altas. Captar uma água com resíduo químico aos viveiros irá acarretar em mortalidade. Não resta dúvidas. Esperamos não encontrar”, pontua o presidente da Accal. Amorim destaca que o cuidado tem sido redobrado para que o camarão produzido e ofertado aos consumidores esteja livre de contaminação. “Os produtores estão avisados para observarem bem a água, antes de sua captação. Agora, com o controle que estamos fazendo, somado a uma produção importante com água de poços artesianos, estamos colocando no mercado um camarão livre de qualquer risco à saúde.” “Infelizmente, todo mundo está sofrendo”   Há cinco anos trabalhando com a criação de camarão em cativeiro, Iury Amorim lamenta o crime ambiental em curso. Segundo ele, todos estão sofrendo com os prejuízos. “Tivemos uma retração nas vendas de uns 40%. Acredito que seja momentânea. Tem muita gente com receio de comprar frutos do mar. O impacto que a gente está sentindo na carcinicultura é referente a impressão. Esse tipo de produção é feito um pouco mais para dentro do continente, e isso está ajudando na questão do óleo, porque não está chegando na cultura. Nem onde eu crio nem onde dou assistência ouvi relatos. Graças a Deus não. Mas muita gente está confundindo, achando que o camarão é do mar e não compra. Estamos sofrendo por má interpretação, porque as pessoas não estão querendo comer de origem nenhuma. Como o consumidor não sabe de ontem está vindo, fica com receio”, comenta.