Cidades

Xangô Rezado Alto: O respeito como tradição

Cortejo no Centro de Maceió relembrou 107 anos da Quebra de Xangô lutando contra intolerância religiosa

Por Emanuelle Vanderlei com Tribuna Hoje 01/02/2019 19h17
Xangô Rezado Alto: O respeito como tradição
Reprodução - Foto: Assessoria
História, cultura, política e religião. Em mais uma edição do Xangô Rezado Alto, as ruas do Centro de Maceió foram tomadas na tarde desta sexta-feira (01) pelo maior cortejo dos povos de cultura africana do Estado. O evento é em memória a um dia trágico na história de Alagoas, quando em 1912 todos os templos de religiões africanas foram invadidos e destruídos pela intolerância, que ficou conhecido como “Quebra de Xangô”. Mais que um culto religioso, o Xangô Rezado Alto é um ato político. As pessoas vão às ruas lutar contra a intolerância religiosa, elevar suas vozes contra o preconceito que ainda sofrem.

Pai Célio exige respeito às religiões de Matriz Africana (Foto: Edilson Omena)

Pai Célio ressaltou o significado emblemático da data “os nossos terreiros foram quebrados, nossas peças sacralizadas foram queimados . É necessário estar nas ruas dizendo não a essa intolerância, a esse pensamento negativo relacionado à matriz africana.”. Ele explicou o que estão exigindo da sociedade. “Eu só me sinto respeitado quando as pessoas não me olham com desdém com relação à minha roupa, com relação à minha conta, com relação ao meu turbante, meu chapéu, meu boné. Tem que entender, ou no mínimo respeitar. A palavra de hoje é respeito, respeito, respeito!” Crianças, idosos, homens e mulheres de várias cores, idades e crenças caminharam juntas exaltando a tradição de seus ancestrais com orações, músicas, danças e gestos. A forte identidade cultural era vista nas roupas, acessórios e expressões. O orgulho e empoderamento de um povo que sofre cotidianamente com o preconceito prova a importância deste dia na ruptura com a cultura do racismo e da intolerância que ainda persistem em nossa sociedade. A população da cidade teve a oportunidade de acompanhar as apresentações, desmistificando o preconceito. Samara dos Santos estava no calçadão quando o cortejo passou. Apesar de sua crença ser em outra religião, defendeu o direito de liberdade de cada um. “Cada um tem sua religião, pra mim o que importa é o respeito”, disse ela.

Mesmo com o pé machucado, Mãe Vera participou do cortejo em uma cadeira de rodas (Foto: Edilson Omena)

Mãe Vera, uma das maiores lideranças do movimento  estava com o pé machucado, sem poder andar. Mas foi levada durante todo o percurso em uma cadeira de rodas por seus “filhos de santo. “A gente quer o apoio e o respeito pela nossa religião”, disse ela explicando porque não poderia deixar de estar ali. Segundo ela, 107 anos depois a realidade do preconceito melhorou um pouco, mas ainda há muito a mudar. “Agora a gente tem cada vez mais procurado mostrar o que nós somos”. Iniciado com um ritual religioso na Praça da Assembleia, o cortejo seguiu pela Rua do Comércio, onde 4 tendas abrigavam grupos de cultura afro que se apresentavam, e encerraram com uma grande  festa na Praça dos Martírios, com palco montado para apresentação de grupos e artistas ligados à cultura africana. O evento foi organizado pela Fundação Cultural de Maceió, que lançou edital e selecionou grupos para participar da programação cultural. Amaurício de Jesus, coordenador de políticas culturais da FMAC, ressalta a importância do evento para o município. “É o reconhecimento da importância dessa comunidade que atua dentro da cidade formando cidadãos. É fazer o cidadão ser visto independente da sua religiosidade, percebendo a importância dessa diversidade conviver na cidade de Maceió. A ação traz lideranças estão à margem desses espaços de dialogo para dentro da cidade, utilizar um espaço de direito”. Segundo a assessoria de comunicação, o Município investiu R$ 61 mil entre estrutura e cachês dos grupos que participaram do evento. Os 15 grupos que se apresentaram foram selecionados por meio de chamada pública, lançada no final do ano passado.