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Alagoas vivia rebuliço na Independência

Tribuna mostra como era cenário político, econômico e aspectos da sociedade alagoana no rompimento com regime da Monarquia

Por Wellington Santos com Tribuna Independente 07/09/2018 10h17
Alagoas vivia rebuliço na Independência
Reprodução - Foto: Assessoria
O Brasil celebra nesta sexta-feira (7) os 196 anos da Independência do país com o tradicional desfile militar em vários Estados. Naquele setembro de 1822, Alagoas tinha uma população de, aproximadamente, 120 mil habitantes, sendo que cerca de 40 mil eram escravos. A Tribuna Independente relembra detalhes da sociedade de então e revela que mais de 90% da população viviam nas áreas rurais, no campo, trabalhando em atividades agrícolas. O eixo da economia era a produção para exportação, desde as madeiras, o açúcar e do couro ao algodão. “Os duzentos engenhos de açúcar e as centenas de fazenda de gado comandavam a economia. O algodão dava suas primeiras grandes safras, mas o domínio era dessas duas atividades tradicionais. A grande propriedade – o latifúndio canavieiro ou pastoril - era o padrão geral no campo”, conta o economista Cícero Péricles. Na área canavieira, acrescenta Péricles, predominava o trabalho escravo, que permaneceu até seis décadas depois e, na pecuária, era o trabalho servil dos caboclos, mestiços e descendentes de índios que tocavam as criações de gado bovino. Era uma sociedade de base rural, quase sem vida urbana, com baixíssimo nível de escolaridade, com poucas e pequenas escolas primarias. A primeira escola de nível médio, o Lyceu Alagoano, somente foi criada em 1849, quase três décadas depois da Independência. Do ponto de vista político, ressalta o historiador Douglas Apratto, havia pessoas e movimentos que desejavam a independência. As ideias republicanas e de separação, depois da Revolução Francesa e da Independência Americana e de vários países latino-americanos, sacudiam o continente. [caption id="attachment_176244" align="aligncenter" width="1200"] Historiador Douglas Apratto relembra fatos marcantes de Alagoas na época da Independência do Brasil (Foto: Sandro Lima)[/caption] “Em Alagoas mesmo a Junta de Porto Calvo é um exemplo disso.  Manoel Vieira Dantas e sua mulher Ana Lins eram adeptos das ideias republicanos no País do futuro Visconde de Sinimbu.  Claro que os partidários monarquistas e a fortíssima colônia portuguesa eram contrários à  Dom Pedro I, que foi convencido da ideia de Independência por figuras de governo como José Bonifácio”, diz Apratto. “Alagoas era recém-emancipado da Capitania de Pernambuco, ocorrida cinco anos atrás e iniciava sua vida de capitania independente. Organizava sua estrutura administrativa e acompanhava os acontecimentos que se passavam no Império sediado naquele momento na Corte do Rio de Janeiro”, acrescenta o historiador. Episódios fortalecem defensores da Independência Com a partida de Melo e Póvoas para Portugal, a segunda Junta foi eleita no dia 31 de janeiro de 1822, sendo presidida, também, por um português, José Antônio Ferreira Braklamy e tinha ainda os seguintes membros: José de Souza Melo (secretário), Manoel Duarte Coelho (outro coronel português), Nicolau Paes Sarmento e Antônio Holanda Cavalcante de Albuquerque. Braklamy, que tinha a mesma postura de apoio às Cortes de Lisboa, teve que enfrentar o crescente movimento nacionalista motivado pela primeira vitória importante: a decisão de D. Pedro de ficar no Brasil (9 de janeiro de 1822). Com este fato, os defensores da Independência ganharam ânimo, se fortaleceram, enquanto que a Junta governativa se divide e perde forças. O próximo episódio envolvendo D. Pedro com repercussão importante em Alagoas foi a entrega, em 13 de maio de 1822, do título de Defensor Perpétuo do Brasil, uma homenagem da Maçonaria adotada pelo Senado da Câmara do Rio de Janeiro. Para aclamar o Defensor Perpétuo, foi marcada um ato na Vila das Alagoas para o dia 28 de junho de 1822. A reunião aconteceu na Igreja Matriz com a participação da Junta de governo, clero, Senado da Câmara da Vila, oficiais de guerra, milícias e ordenanças, além da representação popular de diversos pontos da Província. Segundo a Ata da reunião, a Junta havia requerido dias antes uma assembleia para “chamar à ordem a fermentação interna, difundida por movimentos políticos dignos de atenção superior”. Braklamy de fato queria que o ato fosse uma demonstração de respeito à autoridade do príncipe regente. O que aconteceu foi muito diferente do planejado. Um verdadeiro levante revolucionário exigiu o afastamento de todos os portugueses do governo alagoano, com a exceção de três autoridades, entre elas o sargento-mor João Eduardo Pereira Colaço, comandante da tropa de linha da capital. O movimento pela Independência transformou a reunião numa rebelião. Assim, populares cercaram a Igreja Matriz, ao lado do corpo de Tropa de Linha, que estava sublevado, e mais 400 voluntários amotinados sob o comando de Jerônimo Cavalcante de Albuquerque. Uma nova Junta foi nomeada e Braklamy permaneceu provisoriamente na presidência até que o seu sucessor, o juiz Caetano Maria Lopes Gama, voltasse de viagem. O tenente-coronel português Manoel Duarte Coelho requereu licença da Junta por um ano, acreditando que poderia haver uma reviravolta política que o trouxesse novamente ao poder. Correspondência informa ao príncipe os acontecimentos na província Lopes Gama assumiu por somente um mês, afastando-se para assumir o mandato de deputado da Constituinte Brasileira, onde se projetou conquistando uma cadeira no Senado do Império, para em seguida atingir o baronato com o título de Barão de Maranguape. Em 11 de julho de 1822, em correspondência enviada ao príncipe regente, a junta informa os acontecimentos de 28 de junho e comunica que havia escolhido José de Sousa e Melo para a presidência da Província. Coube ao próprio José de Sousa e Melo levar a correspondência a D. Pedro, mas este somente chegou ao Rio de Janeiro com a Independência já proclamada. Sousa e Melo levava também correspondência do Senado da Câmara de Alagoas, parabenizando o príncipe regente e, no mesmo documento, pedindo proteção para a Vila, que avaliavam ter sido abandonada pelo governo anterior, de Melo e Póvoas. Essa insatisfação contra Melo e Póvoas era motivada pela preferência que o governante externava por Maceió. É essa reclamação que dá início a uma rivalidade entre as duas vilas e que somente foi resolvida em 1839 com a mudança da capital para Maceió. Outro fato que provocou desdobramentos foi a ascensão de Jerônimo Cavalcante de Albuquerque a vogal da junta. O grupo político liderado pelo coronel Jacinto Paes de Mendonça, liderança de Porto Calvo, não ficou satisfeito com o poder acumulado pelo adversário político. Essa disputa entre os grupos oligárquicos terminaria por derrubar a Junta em 1823. Uma novidade para a Vila de Alagoas após os episódios de 28 de junho foi a criação da Companhia de Infantaria Miliciana dos Pretos Forros Henrique Dias. Tinha um efetivo de 114 praças, dois sargentos, quatro cabos e não recebia soldo. Há registros da criação de outras companhias deste tipo em Alagoas. Alagoas ainda teve participação nos momentos que antecederam a Independência quando elegeu cinco deputados à Assembleia Constituinte Brasileira. Os escolhidos foram: Caetano Maria Lopes Gama, José de Souza e Melo, Inácio Aciolli de Vasconcelos, padre José Antônio de Caldas e Dr. Miguel Joaquim de Cerqueira. Este último não tomou parte da Constituinte. O grupo político de Porto Calvo não concordou com a eleição e denunciou a Dom Pedro o processo como fraudulento, informando que foram prejudicados os candidatos Floriano Vieira da Costa Delgado Perdigão e padre Francisco José Correa Franco. A reclamação não prosperou, mas os termos utilizados contra os três membros da Junta acusados de fraudadores serviram para acirrar os ânimos, aumentando a disputa inter-oligárquica que no ano seguinte provocaria a sedição de Porto Calvo. Segundo Craveiro Costa em História das Alagoas, os acontecimentos de 28 de junho na Vila de Alagoas colocaram a província como a primeira a se insurgir ostensivamente contra a metrópole, formando um governo de brasileiros e demitindo dezenas de portugueses de suas funções. Nem mesmo após a proclamação da Independência os ânimos se acalmaram em Alagoas. “A campanha conta o elemento português intensificou-se”, revela o historiador alagoano. Alagoas segue onda nacionalista O fato é que o sentimento nacionalista que mobilizava muitos brasileiros na luta pela independência, em 1822, encontra uma Alagoas recém-nascida em sua própria autonomia, conquista surgida de um movimento emancipador que eclodiu no dia 6 de março de 1817 em Recife e Olinda, então principais cidades da Capitania de Pernambuco. Foram os primeiros sinais da radicalização das animosidades que as lideranças da próspera economia nordestina tinham com a Família Real  e seu séquito, que haviam desembarcado recentemente no Rio de Janeiro (1807) e precisavam de muito dinheiro para custear salários, comidas, roupas e festas da Corte. A emancipação de Alagoas ainda é considerada por muitos historiadores como resultado de uma sanção de João VI aos revoltosos pernambucanos e um prêmio aos proprietários rurais do sul da Capitania, que se mantiveram fiéis à Coroa. Os fatos de 1822 vão mostrar que na jovem província de Alagoas havia o mesmo sentimento contra a decadente monarquia portuguesa, que há séculos ‘sugava’ as riquezas da colônia. Nos anos imediatamente após a emancipação, os embates entre as Juntas de Governo Provisório, que claramente atuavam em apoio às Cortes de Lisboa, e os nacionalistas vão marcar todo o processo político que levou a colônia à Independência. Eleita em julho de 1821 por exigência da recém-promulgada Constituição portuguesa, a primeira Junta foi presidida pelo coronel português Sebastião Francisco de Melo e Póvoas, que já tinha tomado posse em 22 de janeiro de 1819 como capitão-general da Capitania das Alagoas. Melo e Póvoas, sentindo o ímpeto pela Independência, 11 dias depois da posse cobrou das Câmaras da Vila das Alagoas (atual Marechal Deodoro) e de Maceió que se pronunciassem prometendo obediência à Corte. Espaço urbano tinha menos de 5 mil habitantes Em 1822, Alagoas tinha quinze freguesias, que seriam os futuros municípios, nas quais se destacavam oito vilas. “As três maiores eram: a Vila de Alagoas, a antiga capital alagoana, hoje município de Marechal Deodoro; e ainda os municípios de Penedo e Porto Calvo. Na verdade, essas vilas eram pequenas povoações com menos de cinco mil habitantes. Maceió ainda que estivesse crescendo, em função do porto de Jaraguá, era um povoado recentemente separado da freguesia de Alagoas, em 1815, e demoraria dezessete anos para ser a capital, em 1839”, informa Cícero Péricles.