Cidades

'Ascensão da sexualidade feminina está em alta'

Especialista diz que autoconhecimento das mulheres na hora do prazer ainda assusta os homens

Por Daniele Soares com Tribuna Independente 06/09/2018 08h45
'Ascensão da sexualidade feminina  está em alta'
Reprodução - Foto: Assessoria
No dia do sexo, mulheres comemoram a quebra de tabus que por anos foram disseminados e absorvidos por uma humanidade machista e patriarcal. Em era de igualdade, mulher falar sobre sexualidade e fazer suas escolhas vai muito além de estar na moda, é questão de reconhecimento próprio. Com tudo, a educadora em sexualidade e acadêmica em psicologia, Laylla Brandão, afirmam que os homens ainda estão aprendendo a lidar com o empoderamento sexual feminino. Ela diz que a realidade da vida sexual das mulheres mostra o quanto elas estão vivendo numa revolução de aceitação. De acordo com Laylla Brandão, os paradigmas sociais vêm corroendo a cultura feminina a décadas, mas a realidade agora é viver de descobertas, sejam elas de corpo, gosto, permissões ou possibilidades. “Atualmente nós mulheres podemos sentir prazer, curtir nosso corpo e se tocar. A gente vê em livros que antigamente nós tínhamos a função de cuidadora e de satisfazer o parceiro. A mulher não podia sentir prazer ou falar sobre sexo pra manter a postura moral e social. Mas falar de sexualidade não é apenas a penetração, mas sim aceitação do nosso corpo. Os tabus ainda existem, mas essa revolução vem nos ajudando a nos posicionar da forma que devemos nos enxergar”, explica a educadora. Sobre como os homens veem essa nova mulher, Laylla afirma que essa realidade ainda os assusta. “A mulher bem resolvida e bem vista por si mesmo assusta. Estamos numa era de igualdades e de reconhecimento próprio. E a sociedade ainda não está acostumada a ver mulheres tomando à frente de suas vidas e se amando. Principalmente em relação à sexualidade, pois ainda vivemos numa sociedade machista, onde o homem provê tudo”, explica, acrescentando que por anos as mulheres foram impedidas de falar abertamente sobre seus desejos e vontades. Ela diz que o diálogo ainda é um dos principais fatores para uma boa relação a dois. “A princípio pode atingir o ego masculino, mas eles precisam baixar ‘certas guardas’ pra trazer uma harmonização para a relação. O diálogo precisa sempre acontecer dentro do sexo, ele é essencial, pois sem a conversa não se abre novas portas, não se têm novos caminhos, muito menos novos prazeres.” Para a educadora sexual, a quebra dos enquadramentos do papel da mulher e da sua autonomia é a tendência para esse século. E o primeiro passo para o empoderamento sexual feminino inicia-se pelo autoconhecimento. “É preciso inicialmente se conhecer em gostos, desejos e aceitação. Depois dessa firmeza pessoal, vem o diálogo com o parceiro, se houver parceiro. Se não houver, o primeiro passo de conhecer-se é essencial também. O segundo é permitir-se, conhecer novas formas, gostos, caminhos. Até porque no sexo não existe nada errado. Existe apenas o que gostamos ou não de fazer, e só sabemos o que gostamos experienciando”, pontua Brandão. AUTOESTIMA De acordo com a psicóloga e especialista em violência contra mulher, Regina Coeli Japiá Mota, a autoestima é um muito importante dentro da questão da sexualidade e do orgasmo. Ela diz que sentir prazer é um fator primordial para o bem estar da mulher. “A autoestima é uma importante parte do nosso autoconceito e é fundamental para o bem-estar psicológico. Se amar e se aceitar são alicerces para a nossa qualidade de vida e influencia até mesmo no surgimento de distúrbios psicológicos, a exemplo da dependência emocional. A cultura tem uma forte influência no aumento ou rebaixamento da nossa autoestima, por exemplo, através da imposição de padrões de comportamento e de modelos de beleza (quase inatingíveis). O autoconhecimento, o reconhecimento das próprias qualidades, o desenvolvimento da inteligência emocional e a autonomia (emocional e financeira) são aspectos que contribuem para o fortalecimento da autoestima”. Busca por conhecimento aquece mercado erótico em Maceió   Ir ao sexshop deixou de ser um momento de compras de produtos e acessórios eróticos para agradar o companheiro e se tornou um momento de autoconhecimento. Isso têm feito o rendimento de um sexshop no Centro da capital aumentar. Conforme Williane Henrique, funcionária do estabelecimento, a cada ano o número de clientes têm crescido. “A gente fala que aqui é um consultório médico, pois, têm mulheres que vêm pedindo ajuda, contando histórias e nosso papel é corresponder às necessidades delas. A gente procura deixá-las elas bem à vontade, e consequentemente elas voltam. Somos treinados por uma sexóloga pra sempre indicarmos os produtos que dentro do perfil de cada uma. A maior procura é por géis, óleos e brinquedinhos para serem usados a dois. Isso contribui para que todas se conheçam mais”, informou. [caption id="attachment_171035" align="aligncenter" width="700"] Sexshop deixa de ser local para buscar produtos para satisfazer o parceiro e vira possibilidade de autoconhecimento (Foto: Edilson Omena)[/caption] Williane diz que recebe clientes de todas as faixas etárias e revela quebra de tabus. “Hoje em dia, mãe e filha vêm fazer compras juntas. Não existe mais aquela vergonha de trocar informações, elas escolhem os produtos e acessórios juntas e tiram todas as dúvidas sem nenhum receio”. Mudança de padrões de tamanho tem atraído novos públicos também. “Antigamente as ‘gordinhas’ se sentiam menosprezadas, mas hoje temos fantasias e lingeries que abrangem todos os biótipos”, diz a funcionária. OUTRO MERCADO Assessoria sexual ajuda mulheres a se libertarem de tabus para melhorar relação a dois. A educadora sexual Laylla Brandão tem orientado clientes em situações como essa. Nas assessorias, a especialista indica também acessórios para melhorar o relacionamento. Uma das mulheres (que não quis ser identificada) atendidas por ela se diz muito feliz desde que começou a se conhecer melhor. Ela faz uso de acessórios há 4 anos e não se vê mais sem eles. “No começo do namoro meu marido me deu um acessório de presente. E eu adorei. Dali por diante comecei a fazer coleção. Guardo todos em uma caixa que chamamos carinhosamente ‘Caixa de Pandora’. Nela tem lubrificantes, algemas, vibradores variados, etc. Nesse meio tempo conheci a Laylla e ela sempre me ajudou a renovar o estoque, além de me ajudar a quebrar tabus. A assessoria dela para mim foi muito importante, pois me ajudou a ter acesso aos brinquedos e acessórios, já que eu não tenho coragem de entrar nas lojas. Os papos legais a respeito da sexualidade me ajudaram a ver tudo isso com normalidade”, afirma a cliente. Ela diz ainda que o relacionamento melhorou e que o marido apoia muito qualquer mudança que venha para somar. “Hoje utilizamos acessórios para satisfazer nosso prazer de forma conjunta. Nunca rola nada que um não queira ou se eu não estiver no clima. Não nos cobramos. Já faz parte do nosso estilo de vida. Minhas amigas me chamam de moderna. Confesso que não sei se sou moderna ou elas que são muito reprimidas.”   Movimentos feministas Feministas lutam contra sociedade e mundo capitalista que ainda associa corpo de mulher como objeto de apelo O empoderamento sexual é um avanço dentro da análise de uma sociedade machista. Emanuelle é feminista e faz parte do Marcha Mundial das Mulheres. Para ela a sociedade patriarcal atual ainda está muito forte, principalmente no aspecto sexual. É um direito que nós mulheres temos de nos conhecermos, e da busca permanente pela nossa satisfação e por nosso prazer. Infelizmente ainda não é algo que tenhamos naturalmente porque ainda existem tabus, e porque nós mesmas temos censuras que culturalmente foram colocadas, mas defendo e luto por isso todos os dias”, explica Emanuelle que também faz uma análise sobre a realidade atual. “O direito ao corpo e a nossa sexualidade ainda é visto como uma coisa que é servida para satisfazer o prazer do homem. Movimentos feministas e especialistas veem quebrando tabus dando direitos às mulheres, mas na prática nossa cultura ainda é de servir os desejos e necessidades do homem, tanto no mercado voltado pra pornografia como no mundo capitalista que ainda se a apropria do nosso corpo como objeto utilizado para o mercado, e a necessidade da mulher fica esquecida. A sociedade se sente evoluída, mas as mulheres que se sentem livres sexualmente ainda são muito julgadas na sociedade como promíscuas. Estamos em 2018, mas ainda existe esse julgamento social. Ainda há muito o que avançar”, pontua Emanuelle.