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Engenheiras representam apenas 12% em Alagoas

Elas somam 1.244 profissionais de um total de 9.988 registrados no Crea e relatam a quebra de tabus na carreira

Por Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 29/06/2018 10h31
Engenheiras representam apenas 12% em Alagoas
Reprodução - Foto: Assessoria
Engenheiras ainda são a minoria em Alagoas. Segundo levantamento solicitado pela Tribuna Independente ao Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea-AL) elas somam 1.244 profissionais, ou 12% do total de 9.988 registrados na entidade. A disparidade é uma constante se consideramos dados regionais e nacionais. Segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) existem 223.960 profissionais do sexo feminino com registro ativo, isto representa 15,61% do total. A média nacional também é considerada pequena, 14,1%. Entre mais de 1,3 milhão de engenheiros no país, apenas 196 mil profissionais são mulheres. Este levantamento leva em consideração profissionais das Engenharias Civil, Ambiental, de Produção, Elétrica e Agrimensura. Mas os números podem ser mais desanimadores se forem contabilizados os 34 ramos de engenharia. De acordo com Renilda de Oliveira, coordenadora do curso de Engenharia Civil de uma faculdade particular de Maceió, apesar de reduzida algumas áreas estão sendo melhor ocupadas pelas mulheres que outras. “Por exemplo, entre engenharia de produção e engenharia de computação a presença feminina, enquanto uma tem bastante, a outra tem participação quase zero”, destaca. Renilda tem mais de 20 anos de formação. Ela lembra que a presença feminina já foi bem mais restrita e considera o panorama atual um “avanço”. “Se você comparar isso há 30 anos avançou bastante. Porque  por exemplo, quando eu entrei na Ufal, numa turma de 30 alunos, tinha 5 mulheres. Hoje, a gente tem aqui na FAT turmas nas quais esse número dobrou ou triplicou a presença feminina, tanto na área de projetos como na gestão de obras. Isso tem avançado, a presença da mulher tem crescido”, pontua. Coordenadora do curso de Engenharia Civil há cerca de quatro anos, para ela a diferença quantitativa pode ser atribuída a fatores culturais. “É cultural essa ideia da mulher mais ligada a áreas de humanas e saúde. Se você comparar os cursos de humanas e saúde ao curso de exatas é completamente invertido, as mulheres predominam nas humanas e saúde, enquanto os homens nos cursos de exatas. É cultural. Também há dificuldade mesmo da inserção no mercado. Porque na Engenharia Civil, por exemplo, para uma obra a maioria é composta de homens. A força de trabalho na Engenharia Civil ainda é predominante masculina, mas eu vejo que há um avanço desde mulheres trabalhando como pedreiras, pintoras. É preciso trabalhar mais isso, para que tenhamos mais avanço”, diz. Engenheira de produção afirma que mudança é lenta Outra que faz parte desta “minoria” é Renata Correia. Ela é engenheira de produção há 12 anos e coordenadora de curso há cerca de dois anos. Renata é enfática ao afirmar que apesar da presença reduzida, o respeito entre os profissionais é constante. “Quando eu entrei no curso de Engenharia de Produção em 1998, claro que naquela época já havia um número expressivo, mas a predominância era de homens. Eram 20 mulheres para 45 homens, mas isso não impediu que a gente fosse respeitada. Nunca houve essa diferenciação de que é porque é mulher. A gente sempre foi tratada de maneira igualitária mesmo sendo minoria. A capacidade técnica é igual seja homem seja mulher”. Na avaliação de Renata, a participação maior em cursos de engenharia ajudará nos próximo anos a engrossar as estatísticas positivas para elas. “A mudança é muito recente, é muito nova. É uma mudança que vem sendo trabalhada aos poucos, a diferença entre os profissionais ainda existe, mas nos cursos isso já tem mudado. O que mostra que daqui a alguns anos teremos um maior número de mulheres. Esse números vão se modificando, é lento e recente. Além de vir aos poucos no cenário da Engenharia” Mesmo assim, espaço ocupado não significa satisfação, segundo Renta. A diferença salarial ainda é uma dificuldade maior que a própria presença feminina. “A maneira como se dá o preconceito, a mulher tem quebrado esses paradigmas e conseguido quebras essa barreiras, mas a gente sabe que é um processo muito difícil. Acontece de muitos homens ainda não aceitarem ser comandados por mulheres, mas a competência técnica é o que está em jogo. Embora, as diferenças salariais ainda estejam presentes, quem era para ganhar R$ 1.000,00 acaba ganhando R$ 700,00, principalmente em cargos subordinados”, detalha. Estudantes começam a ocupar espaços Se no âmbito profissional as mulheres são minoria, entre estudantes a situação tem mudado de figura. Segundo a engenheira Renata Correia, a participação de mulheres nos cursos de engenharia tem crescido. No caso do curso que coordena, elas já são maioria. “A visão do preconceito é pequena comparada a anos anteriores. Tenho uma turma de Engenharia da Produção que são apenas quatro homens. A grande maioria é mulher. Elas dominam mesmo e eu acho muito bacana isso, porque elas chegam de farda, com bota, fardamento de indústria. Elas estão na construção civil, nas indústrias de base... elas estão ocupando o espaço. Muitas em cargo de gestão. Acredito que cada vez mais tem diminuído o preconceito. Antes Engenharia, Direito e Medicina eram cursos impostos pelos pais e totalmente masculinos, mas hoje você consegue ver, falo com propriedade porque tenho vivência”, relata. Recém-formada, a jornalista e agora engenheira Natasha Gonçalves tem uma visão positiva em relação a participação feminina na área. “Negócio de que engenharia é só coisa de homem?! Nos dias de hoje? Mentira. O que mais tem são mulheres estudantes de engenharia. Já como profissional o homem ainda sai na frente... Mas tem crescido a quantidade de mulheres engenheiras. Veja, eu perdi a conta aqui de quantas mulheres estudantes eu conheci na faculdade. Eu também participo de um grupo de engenharia do Brasil e o que mais tem é mulher. A quantidade de mulheres na engenharia ainda não ultrapassa a quantidade de homens, mas tem crescido a cada dia, pode ter certeza”, comenta. Mas segundo Natasha, o preconceito ainda é um fator preponderante na questão. “Existe muito preconceito ainda, infelizmente. Que lugar de mulher, seria na arquitetura, direito, em qual quer curso, menos de engenharia...”, afirma. Para a estudante do 9º período de Engenharia Civil, Marisa Ceânia Nobre,  apesar de muitas atividades exigirem mais força, isto não passa nem perto de ser dificuldade para elas. “A presença da mulher na engenharia vem aumentando com o passar dos anos. Na faculdade, a porcentagem de mulheres na sala às vezes é maior em relação a dos homens. Ainda não presenciei discriminação pelo fato de ser do sexo feminino, mesmo em aulas práticas no laboratório, em que alguns testes exigem certa força. A divisão dos grupos sempre foi diversificada”, diz A estudante acredita que apesar disso, no meio profissional  pode sim haver mais dificuldades. “No mercado de trabalho não tenho como opinar, uma vez que ainda estou na graduação, no entanto, em algumas áreas se encontra um certo receio com o sexo feminino. Porém, às vezes esse receio/julgamento/discriminação é percebido com as próprias mulheres, quando relacionam uma promoção de uma funcionária, com outros quesitos além da competência profissional dela”, afirma. Tradicionalismo: “as próprias famílias não incentivavam as mulheres” Membro do Crea, Ana Constantina Sarmento de Azevedo é Engenheira Eletricista e de Segurança do Trabalho. Formada há pouco mais de 20 anos, ela afirma que os 12% de representatividade feminina no Conselho em Alagoas é algo a se comemorar. “Se considerarmos que quando eu cursava engenharia, tínhamos uma média de cinco alunas por turma com 60 alunos, muitas vezes não chegava nem a isso, vemos que esse número atual é muito positivo. Esta é uma questão cultural. Se a gente tiver esse mesmo olhar com a participação da mulher em outras áreas, como a política a presença feminina ainda é muito reduzida”, aponta. Segundo Ana, a desproporcionalidade é uma consequência do modelo de sociedade que tínhamos décadas atrás. “As próprias famílias não incentivavam que as mulheres fizessem estes cursos. Algumas que faziam, realmente optavam por enfrentar esse mundo masculino. Esse número ainda se reflete nisso, porque é um passado recente, é uma história que não está muito longe. E pasmem, essa questão cultural parece ser intrínseca do Norte e Nordeste, mas em outras regiões isso é muito comum também, é um fato histórico do país”, avalia. Ana é otimista em relação ao crescimento da participação das mulheres no segmento. Para ela, a tendência é de “crescimento natural.” “Vai ter uma mobilidade natural porque nos últimos cinco anos, as mulheres estão sendo mais participativas, principalmente nas áreas tecnológicas. Mais de 50% das salas hoje são representadas por mulheres. Entendemos que esse número vai passar a crescer de uma forma sólida, natural e a participação delas em outros processos que envolvem a carreira vai acontecer de forma natural”. Ela reforça que o tradicionalismo ainda é muito presente na profissão. Inclusive a participação feminina na entidade representativa no âmbito federal. “Desde 1966 nunca houve uma mulher na presidência ou na vice-presidência da casa federal [Conselho Federal], eu estive por um mandato em 2013/2015 e em 2015, 82 anos depois da existência legal, porque a profissão de engenharia já existe regulamentada desde de 1933. Se a gente for procurar o fato histórico, esse tempo ainda é maior. Mas em 82 anos a casa nunca havia tido uma mulher no posto de direção. E eu fui a primeira mulher, alagoana, a assumir a vice-presidência e muitas vezes assumi o posto da presidência. Eu espero que não passem mais 82 anos para outra mulher participar politicamente do sistema Confea/Crea”, destaca. Para a conselheira, mesmo com todos os avanços é preciso que as mulheres se façam cada vez mais presentes, principalmente na discussão de direitos de classes. “Eu entendo que as políticas de classes só vão ocorrer quando houver representantes de classe na discussão. Se não houver mulher na discussão, nada do que for feito, mesmo na melhor das intenções pelos homens, não vão atender na íntegra, vão ser capazes de atingir o anseio que a classe enquanto gênero feminino pensa, espera e quer que seja. A participação da mulher é pequena, fica à reboque, algumas se sobressaem, mas o caminho não fica aberto porque parece que quando a  gente passa a porta se fecha”, ressalta.