Saúde

Opção por vegetarianismo cresce em Alagoas

Em todo o país, mais de 30 milhões de pessoas se declaram vegetarianas ou veganas, mas no estado não há números oficiais

Por Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 16/06/2018 09h22
Opção por vegetarianismo cresce em Alagoas
Reprodução - Foto: Assessoria

Seja por ideologia, estética, modismo ou por motivos de saúde, excluir alimentos ou produtos de origem animal está em alta entre os alagoanos. Segundo nutricionistas a opção traz benefício, mas precisa ser equilibrada. Uma pesquisa do Ibope Inteligência aponta que 14% dos brasileiros ou mais de 30 milhões se declaram vegetarianos.

Em Alagoas não há números oficiais, mas a nutricionista Mônica Costa afirma que há uma tendência de crescimento. “Nos últimos anos tem crescido sim essa opção de alimentação, acredito que as pessoas estão mais preocupadas com a saúde, estética, questões religiosas”, pontua a profissional.

Mas segundo ela é preciso equilíbrio e acompanhamento médico. “Eu oriento a ter cuidado, porque quando não há orientação profissional aí termina ficando com carência de vitaminas como ferro e vitamina B12. Eu peço para que semestralmente estejam medindo suas taxas bioquímicas para que a gente possa controlar. Porque geralmente as pessoas que vão por estética ou por moda terminam desequilibrando a alimentação e compensando em carboidratos em excesso e isso não vai ser bom. Uma dieta orientada para ser bem equilibrada, um prato bem colorido, bem saudável fornecendo tanto os micro quanto os macro nutrientes”, diz Mônica.

O também nutricionista Renato Duarte explica que a demanda de pacientes que chegam ao consultório com questionamentos sobre o assunto tem sido constante.

“Na quantidade de pacientes que eu atendo, eu observo que sim, está crescendo bastante esse público. Esses dados estão mudando bastante. Eu percebo que não foram pessoas que começaram desde o berço, ou por crenças religiosas, mas foram pessoas que aderiram ao longo do tempo a essa opção de vida. Em Alagoas isso está se desenvolvendo bastante, estão sendo abertos muitos espaços voltados para este público, restaurantes, fast-foods, é bom estar de olho nesse público, isso é bom”, diz o nutricionista.

O que chama a atenção é que na última pesquisa sobre o tema realizada em 2012, o número foi 75% menor. Segundo a Sociedade Vegetariana Brasileira isto demonstra maior reflexão acerca da consciência alimentar do brasileiro.

“O salto surpreendente no número de pessoas que exclui alimentos de origem animal de seu cardápio reflete tendências mundiais consolidadas de busca por uma alimentação mais saudável, sustentável e ética. Por um lado, o reconhecimento dos benefícios de uma alimentação vegetariana para a saúde é cada vez maior, com grandes organizações - como a Organização Mundial de Saúde - se pronunciando sobre os riscos do consumo elevado de carnes. Por outro lado, o crescimento no número de pessoas que opta por excluir as carnes e derivados do cardápio, ou reduzir seu consumo, é impulsionado pela preocupação crescente da população com os impactos de seus hábitos de consumo. De fato, uma pesquisa do Datafolha de 2017 já havia mostrado que 63% dos brasileiros quer reduzir o consumo de carne”, diz a entidade.

Um censo nacional informal foi criado para obter estatísticas sobre o tema, o Mapa Veg. O endereço eletrônico possibilita o cadastro de adeptos do vegetarianismo e veganismo. Como explica Renato:

“O Mapa Veg é uma plataforma onde os veganos e vegetarianos vão fazendo o cadastro no Brasil. Pelo que eu observei, Alagoas ocupa o 18º lugar entre os estados na quantidade de vegetarianos. É um dado muito pequeno, provavelmente porque muitos não se inscreverem para melhorar essa contagem. São 132 pessoas, mas não quer dizer que são apenas esses. São bem mais, porque a cada dia as pessoas acabam descobrindo intolerâncias, passando a ter vida mais saudável, evitando carnes e embutidos. Veem que a proteína pode ser substituída por outra fonte. Elas acabam buscando outras fontes de proteínas que não seja necessariamente a carne”, ressalta o nutricionista.

Nutricionista cria espaço para desmistificar tabus  

A nutricionista Jaqueline Galvão, de 31 anos, é vegetariana estrita, segue a linha de não consumir alimentos de origem animal há seis anos. Para ela, a opção produziu efeitos positivos em sua vida.

“Foram inúmeros, desde qualidade de vida até consciência alimentar. A alimentação vegetariana é riquíssima. Eu não sinto falta nenhuma de carne. Minha alimentação é 100% bem distribuída em macro e micronutrientes”, diz.

[caption id="attachment_109444" align="aligncenter" width="550"] Jaqueline investe numa proposta de gastronomia saudável (Foto: Sandro Lima)[/caption]

O empenho com a causa gerou a ideia de criar um espaço de gastronomia destinado às comidas vegetarianas com horta orgânica própria.

“Nossa proposta é mostrar que é possível explorar tal vertente da gastronomia de forma saudável e saborosa. Já que comer é um ato tão simples e coletivo, não entendemos porque ao longo dos anos complicamos tanto. Pra isso construímos nossa própria horta orgânica, e preparamos tudo com alimentos frescos e da estação. Simples, saudável e saborosa. A gente quer provar que não existe mistério nenhum pelo fato de não existir carne no buffet.

O restaurante foi inaugurado em agosto do ano passado e já existe projeto de ampliação pela procura tanto de clientes vegetarianos e veganos, como por pessoas que buscam alimentos mais saudáveis.

Do ponto de vista nutricional, Jaqueline explica que o preparo dos alimentos é pensando para extrair o máximo poder nutricional. Embora ela acredite que ainda existem muitos tabus sobre a alimentação vegetariana.

“Sim, tabus que estamos quebrando aos poucos. Já existem muitos estudos embasados cientificamente que dietas vegetarianas estritas são nutricionalmente viáveis. Também já temos estudos que nos comprovam o poder cancerígeno de carnes e alimentos processados. Inclusive em relatórios da ONU”, reforça.

“Fiquei mais leve, mais feliz”, diz advogada  

“Depois que parei de consumir animais percebi que fiquei mais leve, mais feliz e ainda mais saudável já que não estava me alimentando de dor e sofrimento. E já faz dois anos que estou nesse constante processo de evolução e descobertas do veganismo”, garante a advogada Jéssica Gusmão, de 27 anos.

[caption id="attachment_109445" align="aligncenter" width="550"] Jéssica optou pelo veganismo após assistir a um documentário; ela compartilha suas experiências e refeições (Foto: Arquivo pessoal)[/caption]

O veganismo propõe uma reflexão sobre a forma como os animais incluídos na dieta e na produção de artigos de vestuário, higiene e beleza.

Segundo a pesquisa da Sociedade Vegetariana Brasileira, 55% dos brasileiros consumiriam mais produtos veganos [sem utilização animal] caso fossem informados sobre o assunto.

Para Jéssica, que adotou o veganismo “em definitivo” há cerca de dois anos, a opção vinha sendo refletida anos antes, com a descoberta de uma intolerância alimentar que restringiu sua dieta.

“No final de 2012 eu descobri a intolerância à lactose. Então, passei cerca de um mês sem consumir lácteos. Depois, voltei a consumir normalmente, mas usando a enzima lactase. Já em 2015 fiquei sabendo de um piquenique vegano aqui em Maceió e então fui lá conferir. No piquenique, descobri vários alimentos a base de vegetais e que era possível viver sem se alimentar de animais. Também descobri que o veganismo vai muito além da alimentação. É uma filosofia de vida. Refleti bastante sobre isso, mas não coloquei nada em prática”, conta.

[caption id="attachment_109446" align="aligncenter" width="550"] Uma das refeições postadas por Jéssica Gusmão nas redes sociais, como forma de incentivo para outras pessoas (Foto: Arquivo pessoal)[/caption]

Daí surgiu uma inquietação, segundo a advogada, em relação ao consumo de alimentos de origem animal, principalmente por questões ideológicas.

“Após um ano daquele piquenique, mais ou menos em maio de 2016, resolvi assistir a um documentário chamado “A carne é fraca” (está disponível no YouTube). Tinha acabado de almoçar e fui ver o documentário. A partir dali tomei consciência da quantidade de animais que são mortos para satisfazerem os desejos do ser humano tanto na alimentação quanto no uso de produtos que tenham exploração animal: vestuário, produtos de limpeza, higiene pessoal, acessórios, calçados e afins. Naquele dia decidi que a partir do jantar não iria mais consumir animais, porque não queria mais fazer parte disso tudo”, detalha.

Mesmo em uma família onde o consumo de carnes continua, Jéssica diz que a convivência tem sido harmoniosa. Em sua casa, o preparo dos alimentos respeita as convicções dela. “Geralmente eu preparo as minhas refeições. Descobri que amo cozinhar. Minha família entende minha filosofia de vida. Então nunca tive problemas com relação a isso. Quando eles preparam algo pra mim, sempre têm o cuidado de fazer separado dos outros alimentos e sempre me avisam quando determinado alimento tem algo de origem animal”, explica.

Além de se apaixonar pelo veganismo e pela culinária, Jéssica gosta de compartilhar suas experiências e refeições nas redes sociais. Diariamente ela posta fotos dos pratos que prepara e das refeições veganas que faz em outros ambientes.

“Posto sim no meu perfil pessoal do Instagram. Como forma de incentivo e de ideologia para que mais pessoas vejam que é possível não se alimentar de animais. Alguns amigos já diminuíram o consumo de animais pelo menos em algumas refeições e também vejo que se preocupam mais com a forma que estão se alimentando. Isso me deixa ainda mais feliz” diz advogada.

Apesar de toda a dedicação, ela ainda esbarra em dificuldades como festa, eventos e viagens que não possuem cardápio “adaptado”. “Eu me viro. Geralmente eu como antes de sair de casa e sempre levo comigo alguma fruta ou mix de oleaginosas. Aqui em Maceió está crescendo as opções veganas, porque o pessoal está começando a ver esse nicho de mercado.”

Biomédico diz que opção foi tomada para melhorar a saúde  

O biomédico Flávio Marinho, de 31 anos, chegou a pesar 102 quilos e optou por mudar a alimentação para melhorar a saúde. Ele afirma que está “se veganizando”. Isto é, está num processo de adaptação gradual.

“Ano passado, tive pressão alta, exames com resultados incontáveis para os aparelhos dos laboratórios, e peso já com 3 casas numéricas. Fui em uma médica hematologista e ela me disse que não recomendaria nenhum remédio porque ela sabia que eu encontraria uma saída desse problema. Aí um dia eu estava vendo vídeos na Netflix quando descobri alguns documentários sobre nutrição e que atacavam diretamente os derivados animais. Naquele dia decidi mudar pela saúde. Em quatro meses perdi 20kg. Atualmente meu peso fica entre 78 e 82 quilos”, diz.

Mas Flávio afirma que enfrentou dificuldades até conseguir encontrar o equilíbrio e balancear as refeições.

[caption id="attachment_109447" align="aligncenter" width="550"] Após quatro meses de opção por mudar alimentação, o biomédico Flávio Marinho emagreceu 20 quilos (Foto: Arquivo pessoal)[/caption]

“No começo foi um pouco difícil porque não sabia como substituir direito. Mas aí a gente, com auxílio das redes sociais, vai descobrindo os grupos e vai se encontrando. Eu comecei a ter disposição para correr na orla. Sentia mais frio porque perdi muita gordura. Mas no começo não sabia me alimentar direito. Ainda não tinha a ideia da alimentação balanceada. Tive até palpitação no coração, provavelmente pela grande ingestão de carboidrato. Depois de um tempo, conhecendo mais veganos, fui percebendo que a questão deles era simplesmente a abolição animal. Não tinha relação com dieta alguma. Ao final eles querem tirar os animais do sistema opressor”, relembra.

Flávio acrescenta que a opção o ajudou a “incluir valores éticos”, o que ele considera a parte mais fácil da mudança radical. “Sou biomédico e me interesso pelas plantas medicinais. Devido a essa proximidade com o assunto meio ambiente, plantas, os animais foram só mais uma coisa a incluir. Incluir valores na minha pessoa, internalizar isso, essa parte foi mais fácil. Apesar de ter optado por questões de saúde, hoje eu me percebo como vegetariano por ética”.