Cidades
A dor da saudade dos entes queridos nas festas de fim de ano
Famílias falam sobre tentativa de se adaptar à ausência
É comum aproveitar o fim de ano para reunir a família, parentes distantes e amigos. As comemorações costumam reforçar o espírito de harmonia e solidariedade. Mas, para muitos, esse período é de dor e saudade por entes queridos que já faleceram.
A Tribuna Independente ouviu histórias de famílias que mudaram sua forma de festejar o Natal e o Ano Novo depois da partida de alguém próximo.
A autônoma Márcia Cristiane, de 36 anos, diz que a partir da morte do pai, Carlos Alberto dos Santos, as confraternizações de fim de ano perderam o sentido, já que o pai era o responsável pela organização e animação das festas.
“Como meu Pai era o filho mais velho da família, ele sempre encabeçava tudo. As festas, as visitas a médicos. Tudo... Tudo... As festas de fim de ano (Natal) sempre tinham as ceias na casa da minha avó Adalgiza. E as viradas de ano também eram lá. Como meu aniversário é dia 1º de janeiro, meu pai sempre fazia questão de comemorar na virada de ano. Depois que ele faleceu, as ceias continuam, mas sempre nos momentos de oração ele é citado. As comemorações do meu aniversário na virada de ano só fizeram uma vez, porque eu não quis mais. Não é mais como antes”, diz.
Ela relembra a forma trágica como perdeu o pai, em 2009, vítima de um acidente de carro.
“Meu pai faleceu em fevereiro de 2009. Ele tinha 53 anos. Um rapaz embriagado bateu no carro dele e ele capotou. Ficou três dias debaixo de um rio. O caso só foi descoberto com uma denuncia anônima”, conta.
Márcia, a mãe Marly Heliene, e as três irmãs, Monique Cristiene, de 35 anos, Marilia Clara, de 34 anos, e Mônica de Fátima, de 24 anos, acreditam que a dor da ausência do patriarca tem influenciado nos relacionamentos e até na saúde da família.
“Sabe por quê? Minha irmã depois disso teve um câncer, a outra teve um relacionamento conturbadíssimo e minha mãe o ano passado ficou muito doente. E todas acreditam que, se ele estivesse, seria bem diferente. Independente de religião posso dizer, que se as pessoas anjos existem, como eu sei que existem, meu pai era uma delas. Deixava muitas vezes o lado dele para servir os outros. Faz 9 anos que ele se foi, mas é uma saudade que não tem tempo e nem tamanho”, conta emocionada.
Para a auxiliar de biblioteca Maristela Nascimento, de 41 anos, o fim de ano tem um sabor amargo. Ela perdeu o pai faltando pouco mais de um mês para o Natal.
“Todo santo dia, eu me lembro do meu pai. Mas quando chega essa data, é devastador. O que pra muitos representa festa em família, pra mim é uma data importante sim, porém muito triste. Quem me vê com o sorriso no rosto, não imagina a tristeza que toma conta de mim no período”, revela.
Maristela fala que a proximidade do aniversário do pai, 21 de janeiro, com a data da morte, 10 de novembro, faz com que seu período natalino seja doloroso. Ela e os cinco irmãos, não se reúnem na data.
“Perdi meu pai no dia 10 de novembro de 2016. Encontramos ele morto dentro de casa, eu e dois irmãos. E para mim o Natal perdeu o sentido, pois perdi meus alicerces. Já tinha perdido minha mãe em 2004. Eu tenho cinco irmãos, mas nós não nos reunimos”, enfatiza.
Apaixonada pelas festas de fim de ano, a relações públicas Dartiane Vasconcelos, de 31 anos, precisou se acostumar a lidar com a dor da perda da mãe em novembro de 2014.
“Esse período reforça muito a dor. Porque acho que é a data de estar mais junto. O Dia das Mães também é complicado. Mas essa data para mim é a pior, principalmente para mim porque eu gosto muito de Natal. Eu gosto muito de ceia, de todo mundo reunido e não ter ela para fazer isso, para mim é terrível. É muito difícil para mim e eu sinto muito mesmo a falta dela”, explica.
Dartiane conta ainda que a morte da mãe Maria Quitéria Lopes ocorreu quatro anos depois da morte do pai Luzinaldo Antônio da Silva, em setembro de 2010. As perdas têm sido o elo entre ela e os irmãos.
“Tudo era minha mãe, era ela que organizava, que recebia. A gente ajudava, é claro, mas sem ela não é a mesma coisa. Depois que meu pai morreu, querendo ou não, tinha minha mãe ali. Mas sem ela é muito difícil. As festas aconteciam na casa dela, todas as festas, dia dos pais, das mães, Natal, mesmo depois da morte do meu pai, mas depois da morte dela a gente se reúne, mas não é o mesmo. A gente se reunia mais quando ela estava viva. Já têm três anos que ela morreu e a gente conseguiu se reunir. Fez questão de passar todo mundo junto, independente do local, mas esse ano a gente não vai se reunir e isso está sendo o mais difícil para mim”, diz a relações públicas.
Mas segundo Dartiane, apesar do esforço para manter a família unida, os natais são diferentes, com um misto de dor da saudade e boas recordações.
“A gente sempre lembra dela com muita alegria. Porque minha mãe sempre foi uma pessoa muito brincalhona e a gente tenta lembrar dela por isso, com muita alegria. Sempre que a gente está reunido está lembrando dela, pensando o que ela faria se estivesse aqui. Cada novidade a gente lembra que se ela estivesse teria uma opinião a respeito”, enfatiza.
“É preciso criar forças para preencher lacuna”A psicóloga Aparecida Oliveira destaca que perder entes queridos é uma situação delicada principalmente em relação a pessoas com papeis de liderança dentro das famílias.
“Na realidade lidar com perdas não é fácil. Nenhum ser humano está preparado para lidar com perdas. Mas sabemos que no decorrer de nossas vidas todos nós vamos precisa lidar com perdas. No caso de famílias, quando alguém perde um ente querido, como, por exemplo, um patriarca ou matriarca, deixa uma lacuna muito grande. Mas as pessoas precisam criar forças para entender que essa lacuna precisa ser preenchida de alguma forma”, reforça.
Aparecida aconselha as famílias a utilizar o momento festivo para reflexão e aproximação familiar para que juntos superem a dor da perda.
“Realmente em alguns casos, esse é um momento de reflexão, onde a família se une, vão ter grandes recordações, principalmente quando é o primeiro ou são os primeiros natais sem o ente querido. Realmente não é fácil lidar com essa ausência, mas na medida em que for passando o tempo, vai ser difícil, vai ter sofrimento, mas também pode unir mais a família, aproximar mais numa tentativa de preencher esse vazio. É tudo uma questão de tempo e as pessoas vão se acostumando, vão vindo novas histórias e o importante é seguir em frente e saber que a vida continua”, pontua a psicóloga.
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