Cidades

Alagoas registra 2.553 usuários de crack em oito anos

Dados são da Seprev, mas só foram contabilizados casos da Rede Acolhe

Por Lucas França com Tribuna Independente 08/11/2017 08h32
Alagoas registra 2.553 usuários de crack em oito anos
Reprodução - Foto: Assessoria

Um levantamento feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ligada ao Ministério da Saúde em parceria com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, revela que cerca de 370 mil brasileiros de todas as idades usaram regularmente crack e similares (pasta base, merla e óxi) nas capitais ao longo de pelo menos seis meses em 2012. Esse é um dos levantamentos mais recentes sobre o uso da droga.

Em Alagoas, a Secretaria de Estado de Prevenção à Violência (Seprev) informou que dos aproximadamente 25 mil dependentes químicos acolhidos pela Rede Acolhe, de 2009 a setembro de 2017, 2.553 eram dependentes do crack.

A Seprev ressalta que o crack pode ser associado a outros tipos de drogas e, na maioria das vezes, não é a única droga utilizada pelo dependente químico. O órgão explica ainda que aproximadamente 2% destes acolhidos iniciaram nas drogas por meio do crack e que o número pode ser maior, uma vez que muitos casos não chegam ou não são encaminhados pela rede.

De acordo com o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), apenas o Brasil representa 20% do consumo mundial de crack e é o maior mercado da droga no mundo. No país, aproximadamente dois milhões de pessoas já usaram a droga. Por “uso regular”, foi considerado um consumo de pelo menos 25 dias nos seis meses anteriores ao estudo, segundo definição da Organização Panamericana de Saúde (Opas).

Esse número de 370 mil pessoas corresponde a 0,8% da população das capitais do país e a 35% dos consumidores de drogas ilícitas nessas cidades. Além disso, 14% do total são crianças e adolescentes, o que equivale a mais de 50 mil usuários. O resultado, portanto, é uma estimativa do que ocorre nas 26 capitais e no Distrito Federal. Em outra pesquisa da Fiocruz, por exemplo, feita de forma direta com sete mil entrevistados em 112 municípios (incluindo capitais e regiões metropolitanas) entre o fim de 2011 e junho de 2013, o total não passou de 48 mil usuários de crack e similares.

Em Alagoas, os trabalhos com os dependentes químicos são feitos por meio da Superintendência de Políticas Sobre Drogas, que possui o projeto Rede Acolhe, que oferta programas de prevenção, recuperação e reinserção social para dependentes de álcool e demais drogas.

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) informou que contratualiza os serviços das clínicas Árvore da Vida, Divina Misericórdia, Luz da Paz, Esperança de Viver e Green Mulher para atender dependentes químicos.

NORDESTE

Entre as regiões do Brasil, o Nordeste lidera o uso regular de crack e similares, com 40% do total, seguido do Sudeste, do Centro-Oeste, do Sul e do Norte. Além disso, cerca de 80% dos usuários dessas substâncias fazem isso em lugares públicos e de grande circulação, como as ruas.

Campanha leva informações sobre droga às mulheres

Em Alagoas, a Campanha ‘’Crack nem pensar” é permanente e voltada para o público feminino. O idealizador da campanha, Alex Costa, é proprietário da clínica Green Mulher, localizada em Satuba, região Metropolitana de Maceió, que acolhe jovens mulheres dependentes de crack e outras drogas.

De acordo com Alex, atualmente têm 18 mulheres internadas na clínica. Ele conta que o seguimento da unidade é involuntário e as moças chegam ao local por ordem judicial. Desde fundação em 2009, já passaram pela clínica 395 mulheres. “O tratamento na clínica dura cerca de quatro a seis meses, isso depende de pessoa para pessoa. O tratamento é feito por uma equipe multidisciplinar e reuniões semanais com as jovens. O acompanhamento é contínuo”, ressalta Costa.

Ele explicou sobre como surgiu a ideia da clínica e, posteriormente, da campanha voltada para o público feminino.

“Fui interno em uma clínica de acolhimento em Marechal Deodoro e vi que muita família não tinha como custear o tratamento para o parente dependente que queria ser tratado e mesmo os que iam de forma involuntária. Então, quando saí de lá resolvi arrumar apoios e ajudar essas pessoas”, contou Alex.

Patrícia Correia é um ex-dependente e há seis anos é uma das coordenadoras da campanha. Segundo ela, o objetivo é a prevenção. “A campanha é permanente. Trabalhamos a conscientização com equipes nas ruas e também domiciliar com a família do dependente”, comentou.

Rosa Luana concluiu o tratamento em abril deste ano e iniciou na campanha como voluntária. “Estive interna na casa e vi a importância do projeto na recuperação de outras pessoas. O uso de droga é uma doença e tem cura. Basta ter força de vontade e ajuda de familiares e outras pessoas, seja governo ou sociedade civil” comentou.

Alex, Rosa e Patrícia informaram que estão em busca de apoios e patrocínios, sejam do Estado, municípios, empresas e outros órgãos, para continuar levando a campanha em frente. “Precisamos de roupas, calçados, alimentos, entre outros, para levar aos locais de acolhimentos. Na maioria das vezes, os dependentes chegam sem nada. Outro foco da campanha é palestras em escolas, empresas e outros locais. Vamos a qualquer região do nosso estado, basta nos chamar  através do telefone (82) 98706-9366”, explicaram.

SURGIMENTO

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou em 26 de junho de 2011, Dia Internacional de Combate às Drogas, a campanha nacional de prevenção e combate ao uso do crack. Na época, as equipes dos jogos da Série A do Campeonato Brasileiro transmitidos pela TV aberta entraram em campo com uma faixa alusiva à campanha. As emissoras de televisão aberta exibiram o vídeo que alerta as famílias sobre os perigos do consumo do crack, especialmente pelos jovens. A campanha tem o apoio do Instituto Crack, nem Pensar e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

O CNJ também distribuiu aos tribunais brasileiros 10 mil exemplares de cartilha produzida por especialistas para a campanha. A ideia é disseminar as informações por meio das Coordenadorias da Infância e Juventude dos tribunais.

“Apoio da família é primordial para o tratamento”

A tendência do usuário do crack é se afastar de amigos e familiares que não fazem uso e se aproximar de quem usa o crack, segundo os especialistas. Além disso, quando o consumo chega a um padrão extremamente compulsivo, o indivíduo passa a ter problemas econômicos graves e passa a roubar seus familiares, o que traz ainda mais conflitos com a família.

O usuário, inclusive, deixa de apresentar sentimentos como o carinho e demais demonstrações de afeto. Mas os psicólogos orientam que a família tem que se impor e estar presente durante o tratamento.

A psicóloga clínica Aparecida Oliveira explica que a dependência não tem cura, mas tem tratamento. Ele deve ser feito por uma equipe interdisciplinar. Ela relata que no primeiro momento, o afeto familiar é primordial para que o indivíduo consiga chegar ao fim do tratamento. “Os familiares e amigos têm que entender esse momento e não se afastar. Às vezes essas pessoas buscam as drogas por conta de alguma dor emocional. A garra e o apoio da família são essenciais”, explica a especialista.

Clarice Acosta Duarte, também psicóloga, explica que geralmente o usuário passa a usar substâncias a partir de alguma situação difícil ou até por curiosidade. “É preciso acompanhamento psicológico tanto para o dependente quanto para a família. O dependente entrou na droga como um refúgio por muitas questões que ele não conseguiu lidar. No caso do crack, que é tão devastador, contribui para esse afastamento. E a família precisa de um suporte psicológico para lidar com essa situação difícil e, às vezes até, de uma ajuda psiquiátrica, porque não é fácil”, ressaltou.

A psicóloga Lívia Vieira, do Hapvida Saúde, disse que o tratamento deve ser feito em grupo. “Interessante trabalho em grupo com indivíduos com os mesmos conflitos. Seria um conjunto de intervenções. Inicialmente com a família, após individual e quando o indivíduo estiver preparado inseri-lo na terapia em grupo. Terapia de escuta de desabafo e orientação. É necessário também procurar centros de apoio especializados, assistência social e outros grupos”, ressaltou a psicóloga.