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Promotor fala em júri sobre pais acusados de matar menina: 'Crueldade que nunca imaginei'

Pais acusados de matar a menina de 5 anos são julgados nesta segunda-feira, em Itapetininga (SP)

Por G1 03/06/2019 17h35
Promotor fala em júri sobre pais acusados de matar menina: 'Crueldade que nunca imaginei'
Reprodução - Foto: Assessoria
O promotor do caso da menina Emanuelly, de 5 anos, morta pelos pais em março do ano passado, fez um discurso emocionado durante o júri popular do casal, que é realizado desde a manhã, no fórum de Itapetininga (SP). "Não foi fácil trabalhar no processo. Jamais imaginei que iria trabalhar num caso do tribunal do júri que deixa até o pelo da espinha arrepiado. A cada contato com o processo o coração doía", afirmou Leandro Conte. O julgamento, que estava previsto para 9h30, começou com quase uma hora de atraso (10h25). A duração é incerta, segundo o juiz Alfredo Gehring, que preside o júri do casal Débora Rolim da Silva, de 24 anos, e Phelippe Douglas Alves, 25 anos. Das 30 testemunhas que seriam ouvidas, foram ouvidas apenas sete, quatro mulheres e três homens. O casal está preso no presídio de Tremembé desde março do ano passado e responde por homicídio, tortura, cárcere privado da menina, além de fraude processual. Emanuelly morreu no dia 3 de março de 2018 em um hospital em Sorocaba (SP), com sinais de espancamento. Os pais alegaram que a criança havia caído da cama. Os médicos, no entanto, disseram que as lesões não correspondiam à versão de Débora e Phelippe. Segundo o promotor, a equipe médica do hospital ficou emocionada quando chegou o caso da menina de 5 anos. "Nunca imaginei uma crueldade dessas. Até o fim dos meus dias vou lembrar disso e vou ver que homem é o animal mais cruel de todos." O laudo lido pela promotoria aos jurados revela que a menina tinha múltiplos hematomas com datas variadas, alguns de até 20 dias atrás, nos olhos, costas, peito, braços e pernas, além de lesões recentes de queimaduras de 2º grau. O quadro aponta para tortura. Emanuelly teve morte violenta, por traumatismo cranioencefálico e politraumatismo. "Ela ficou confinada apanhando por 20 dias. Os pais foram frios e perversos na frente de delegado", disse o promotor, em relação à justificativa que o casal deu de que batia na menina para educá-la. O promotor exibiu vídeos apreendidos no celular da mãe, que mostram a menina respondendo à mãe que se machucava sozinha. A mãe pergunta várias vezes, aos gritos, como ela se machucou, fazendo a menina chorar e tremer inteira. Débora admitiu no interrogatório que fazia os vídeos para usar como prova se alguém do Conselho Tutelar fosse na casa da família questionar sobre as lesões na menina. Mas a polícia apreendeu outro vídeo em que a mãe pergunta o que está acontecendo, e Emanuelly responde: "não, não vou mentir porque todo mundo bate em mim”. Defesa Depois do intervalo, foi a vez dos jurados ouvirem a defesa do casal. O defensor Pedro Vasconcelos disse que Emanuelly falou sobre o episódio de depressão pós-parto que Débora teve - ela abandonou Emanuelly logo após dar à luz, e, por isso, perdeu a guarda da menina. "Emanuelly sofria de carência afetiva por conta da depressão pós-parto que a mãe teve. Depois disso Débora buscou na Justiça para retomar a guarda. Mas quando aquela criança voltou pra família, ela nunca tinha convivido com a família. Foi como uma adoção. O próprio psicólogo disse que as crianças também agrediam a Emanuelly." "Neste contexto Emanuelly se machucou. Ana Laura (a irmã mais velha, fruto do primeiro casamento de Débora) como criança não tinha capacidade de avaliar o que estava acontecendo. [...] No desejo de se impor com os irmãos ela se machucava, pequenos machucados cutucando pálpebras e pescoço. Isso chamou atenção dos professores. Os machucados começaram a despertar a desconfiança para com a família." O advogado colocou em dúvida a agressão que os pais praticaram contra a menina. "Não são monstros, são dois seres humanos que erraram. Não estou minimizando a situação, mas quando vemos esta situação, demoramos pra assimilar. Será que realmente houve esta situação? Será que a forma explicitada foi a verdade?" O defensor confirmou que Phelippe batia na menina, mas com a "intenção de corrigir". "Ele confessou que bateu na menina, mas como forma de corrigir para que ela parasse de machucar. [...] ele a machucou com a intenção de fazer com que ela não se machucasse mais. Foi um excesso de zelo perante pais que não sabiam o que fazer. Um dia isso fez com que Phelippe errasse e a agredisse de forma mais violenta." O que cada testemunha disse - Josiane Fernanda de Oliveira - assistente social do Hospital Regional Contou que teve contato com a menina no hospital. Disse que realizou atendimento com a Débora (mãe da menina), que disse que Emanuelly se auto mutilava e se agredia e era bastante difícil de lidar. "Muitas vezes a Débora se contradizia nas falas e ficou evidente que ela estava escondendo algo." Josiane acionou o Conselho Tutelar e a polícia. Em conversa como pai, ele disse que a menina era "terrível", que se jogava da cadeira, e que tinha vídeos dela se machucando sozinha. Revelou que os pais estavam frios, não expressavam reação, e que o caso abalou toda a equipe, devido à gravidade. - Ana Paula Ibrain, investigadora da DDM: Estava de plantão quando foi acionada sobre as lesões da menina. Tirou fotos dos hematomas, constatou a agressão. Quando conversou com a mãe, ouviu a mesma versão: que a menina se automutilava. Diante de outras informações divergentes, deu voz de prisão ao casal. A investigadora contou que os acusados chegaram a rir no hospital, tamanha a frieza. - Eduardo de Souza Fernandes, delegado Ouviu testemunhas e concluiu que não só o pai, mas a mãe também agredia a menina. Disse que ouviu a irmã mais velha, mas constatou que a menina foi orientada a mentir sobre os pais, porque também era vítima de violência psicológica. - Patricia Aparecida Costa, escrivã de polícia Relata o que a irmã mais velha contou em depoimento, e que também percebeu que a menina escondia o que de fato acontecia na casa. "Era visível que ela queria proteger, mas ao mesmo tempo se defender dos pais." - Aniele Martins de Meira, babá de Emanuelly Ficou na casa por menos de 1 ano. Disse que Emanuelly, a irmã mais velha e o irmão mais novo eram crianças tranquilas. Contou que um dia chegou para trabalhar e viu que a menina estava de olho roxo. Quando denunciou o caso no Conselho Tutelar, foi mandada embora. Depois da denúncia perdeu o contato com a família e só soube novamente do caso quando a morte da menina foi noticiada. - Sillas Marcelo de Almeida Coelho, ex-marido da Débora Sillas é pai da irmã mais velha de Emanuelly, Ana Laura. Contou que só tinha contato com a ex-mulher para saber da filha, que via uma vêz por mês. Soube que Débora teve depressão pós-parto depois que Emanuelly nasceu. - Fernando Ribeiro, psicólogo Atendeu Emanuelly em alguns momentos. O primeiro foi em 2014. No fim de 2017 fez outras sessões com a menina e sugeriu que a mãe procurasse psicoterapia. Conta que não identificou qualquer tipo de violência, mas os irmãos sempre apareciam com machucados.