Brasil
Mais de 70% das publicitárias do Nordeste já sofreram assédio no trabalho
Pesquisa de agência paraibana integra uma campanha contra o machismo.
Mais de 70% das publicitárias do Nordeste já sofreram algum assédio no trabalho. A constatação é da agência paraibana TagZag, que realizou uma pesquisa com cerca de 200 profissionais da área nos nove estados da região. O resultado completo do levantamento foi divulgado na campanha “Esse Case é Foda”.
Para uma designer da Paraíba, que preferiu não ser identificada, esse assédio é mais que uma estatística. A jovem relatou que, antes de pedir demissão da agência, era assediada pelo chefe, que sempre incluía algum trabalho "urgente" na pauta dela no fim do expediente, uma desculpa para ficarem a sós.
“Assim que todo mundo da sala ia embora, ele chegava para me dar as instruções e aproveitava a situação para me assediar. O assédio era velado, ele sentava muito perto da minha cadeira, pegava a mão que eu segurava o mouse para indicar a alteração que ele queria, entre outras situações que me constrangiam”, lembrou.
Os assediadores são principalmente os donos de agência, correspondendo a 54% do total dos casos. Mas também são diretores de criação (37,2%), colegas de trabalho (32,7%) e clientes (31,9%), conforme mostra a pesquisa da TagZag.
A profissional explicou que chegou a mudar o jeito de se vestir para não ter nem mesmo os antebraços expostos a toques inconvenientes do chefe. “Em um desses toques sem permissão, ele chegou a perguntar se eu me depilava, pois achou minha pele muito macia. É uma situação constrangedora que hoje eu vejo como assédio nítido, mas enquanto eu vivia a situação tentava justificar na minha cabeça que era só uma impressão, que eu estava errada”, comentou.
Outras publicitárias também têm que adaptar seu vestuário ao ir trabalho. De acordo com a pesquisa, 80,6% já deixaram de usar determinadas roupas para não chamar a atenção dos homens, enquanto que 39,4% já tiveram que utilizar determinadas roupas para agradar chefe ou cliente.
“Minha colega de trabalho é super inteligente e competente, chama a atenção pela beleza e carisma. Ela começou a ser levada para as reuniões com os clientes importantes mesmo sem entender nada dos projetos, desde que fosse bem maquiada e bem vestida para impressionar-los. Inteligência e sagacidade eram pouco explorados, deixavam claro que o principal atributo dela era ser bibelô de reunião”, relatou a designer.
Legenda da foto: Pesquisa foi feita em agências dos nove estados do Nordeste (Foto: TagZag/Divulgação)
Outros dados
De acordo com o levantamento, 15% das profissionais já foram assediadas em entrevista de emprego. Os depoimentos ainda revelaram que 85,8% das profissionais souberam de algum caso de assédio envolvendo uma colega de trabalho e 52,3% já presenciaram assédio contra colegas.
“Houve um tempo em que uma das agências onde trabalhei passou por mudanças no quadro de funcionários e o dono disse que contrataria apenas ‘gostosas’”, diz um dos depoimentos anônimos que constam na pesquisa.
Os dados também mostram que 81,3% das publicitárias se sentiram julgadas por sua aparência, 77,4% já tiveram que ignorar piada machista ou sexista por medo de represália e 48,4% evitaram denunciar assédio por medo de serem demitidas.
“Tive um chefe que dizia ‘brincando’ para uma colega que pusesse um decote para ir em reuniões com clientes”, diz uma publicitária anonimamente.
O machismo também prejudica o trabalho das publicitárias, conforme mostra a pesquisa. 37,4% das entrevistadas dizem que receberam tarefas muito inferiores à sua capacidade profissional e 69,7% já tiveram suas opiniões ou pontos de vista ignorados. Apenas por serem mulheres.
“Todo o nosso esforço de capacitação, competência e atualização para ser uma boa profissional é comumente reduzido à condição de bibelôs, ‘abre portas’, como tantas vezes ouvi, meros objetos decorativos”, relata uma profissional.
Legenda da foto: Campanha da TagZag contra o machismo nas agências de publicidade (Foto: TagZag/Divulgação)
A campanha
O objetivo da agência com a pesquisa é ampliar o debate sobre o machismo e papel da mulher na publicidade. “As agências são vistas como ambiente de vanguarda e mente aberta, mas nós ouvíamos relatos de uma realidade bem diferente. Quisemos medir isso e fazer o mercado se atentar sobre o assunto”, afirmou a diretora de operações da TagZag, Mariana Craveiro.
Para responder aos formulários, a pesquisa foi divulgada organicamente, de publicitária para publicitária, numa espécie de “boca a boca virtual”. Para manter o anonimato, os únicos dados pedidos às profissionais foram cargo e estado. A ação completa conta com filmes, postagens nas redes sociais e envio de cartazes para agências da região.
“É necessário criar gatilhos para evitar o assédio e, por tabela, reduzir o machismo nas agências. Não é fácil, sempre tem muita coisa envolvida. Mas ficar em silêncio só ajuda a manter o ambiente confortável para os assediadores, explicou a head of digital da agência, Carol Crozara.
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