Política
“Projeto de tucano faz analogia à escravidão”
Fetag contesta proposta que tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília
Tramita na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei (PL) que, se aprovado, possibilitará aos trabalhadores rurais do país recebam comida como pagamento, ao invés de dinheiro. De número 6.442/2016 e de autoria do deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), a proposta é, na prática, um adendo ao PL 6.787/16, a reforma trabalhista recém-aprovada na Casa.
O PL do tucano mato-grossense possui 192 itens que ficaram de fora da reforma trabalhista e deve começar a ser apreciado pelos parlamentares nos próximos dias. Seu artigo 3º diz que “empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural ou agroindustrial, sob a dependência e subordinação deste e mediante salário ou remuneração de qualquer espécie”.
Para Cícero Domingos, diretor da Federação dos Trabalhadores da Agricultura (Fetag) em Alagoas, a medida é um retrocesso à legislação anterior à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), instituída em 1943 por Getúlio Vargas.
“É o mesmo que voltar à escravidão. Imagine os trabalhadores rurais sem tempo para descanso e trabalharem por comida ou moradia. Essa lei é fruto de pressão dos grandes empresários e usineiros que não querem pagar os direitos dos trabalhadores”, afirma Cícero.
Para ele, além de penalizar o trabalhador rural, o PL atinge também o movimento sindical da categoria.
“Isso é para acabar com o movimento sindical rural e com o trabalhador. As condições dos rurais são péssimas e esse PL vai retroceder tudo em mais de 70 anos. Agora junte isso à reforma previdenciária e a trabalhista, em que se quer arrochar ainda mais o trabalhador rural”, diz Cícero Domingos.
Segundo dirigente da Fetag, as federações de todos os estados estão se mobilizando contra o PL.
“Só aqui em Alagoas já realizamos cerca de 40 audiências públicas no interior, nas câmaras municipais, sobre essas mudanças na legislação trabalhista dos rurais para conscientizar a todos dos riscos que estamos correndo”, afirma.
Segundo Cícero Domingos, Alagoas possui cerca de 500 mil trabalhadores rurais e pequenos agricultores, entre posseiros e meeiros. No Brasil esse número de 4 milhões.
Análise Para advogado, lei está mal escrita e desprotege trabalhadorPara o advogado Luciano Lima, o PL 6.442/2016 tem trechos mal escritos e desnecessários porque já existe legislação que trata de determinados assuntos. Mesmo assim, ele considera que a lei deixa o trabalhador rural mais desprotegido.
“Essa redação do artigo terceiro é inconstitucional porque ninguém no Brasil pode trabalhar sem receber salário. Entretanto, em parágrafos mais abaixo há a questão do percentual que pode ser contado como moradia e alimentos nos salários que, aliás, já existe na legislação, mesmo que com percentuais diferentes”, comenta o advogado.
Para o especialista, outro ponto polêmico do PL do deputado federal Nilson Leitão é a possibilidade de trabalho ininterrupto por 18 dias sem o descanso remunerado e com jornada de 12 horas diárias.
“Esse ponto é bem complexo porque dá margem para muita discussão. O argumento usado é que muitas vezes a fazenda que o sujeito trabalha é longe de sua cidade de origem e aí seria melhor se ele trabalhasse direto ao invés de ir e voltar de lá. Quem decide o que faz com seu tempo livre é o próprio trabalhador e não o patrão”, argumenta.
Em sua análise, o princípio do PL é ruim porque parte de lógica equivocada.
“Além disso, o teor da lei é que o negociado tenha mais peso que o legislado, tira o direito do trabalhador à indenização por acidente de percurso e a hora in itinere”, diz Luciano Lima.
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