Interior

Justiça investiga pedidos de salário-maternidade

Juiz federal diz que metade da demanda na 10ª Vara de Arapiraca requer benefício para mulheres agricultoras

Por Davi Salsa / Tribuna Independente 18/04/2024 10h03
Justiça investiga  pedidos de salário-maternidade
Ações judiciais são encaminhadas à Justiça Federal de Arapiraca por supostas falsas agricultoras - Foto: Divulgação

A Justiça Federal em Alagoas, por meio da 10ª Vara de Arapiraca, a partir deste mês de abril, iniciou um levantamento acerca do elevado número de pedidos de salário-maternidade para mulheres agricultoras.

Os trabalhos comandados pelo juiz federal substituto Paulo Henrique da Silva Aguiar referem-se à implantação da política judiciária de combate à litigância predatória nas ações previdenciárias rurais.

Segundo apurou a Tribuna, três Varas Federais funcionam em Arapiraca. Somente na 10ª Vara Federal, metade dos processos é de solicitações e requerimentos de salário-maternidade para camponesas. Esse fato chamou a atenção do juiz federal substituto Paulo Henrique da Silva Aguiar.

De acordo com o magistrado, na subseção de Arapiraca, foi identificado um volume considerável de ações judiciais promovidas por pessoas que não são agricultoras, mas que tentam se passar como tais, com o objetivo de receber benefícios rurais, ou seja, falsos agricultores, denominados de fake farmers. A prática constitui litigância predatória, em manifesto abuso do direito de demandar.

Na definição do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), litigância predatória é a provocação do Poder Judiciário mediante o ajuizamento de demandas massificadas com elementos de abusividade e/ou fraude.

“Se uma pessoa não é realmente agricultora, não deve ingressar com ação judicial para tentar se passar por agricultora com o intuito de receber benefício rural”, destacou o magistrado.

O quadro mais crítico refere-se às ações de salário-maternidade rural. Também estão sendo feitos levantamentos em relação a outros benefícios previdenciários rurais.

No direito norte-americano, as ações predatórias caracterizam a chamada sham litigation, o que revela o uso ilícito do sistema de justiça. A prática é vedada nos EUA e, recentemente, juízes e tribunais de todo o país têm envidado esforços para coibir a litigância predatória no Brasil.

Para o juiz federal Paulo Henrique da Silva Aguiar, a experiência do direito norte-americano vem em boa hora. Explicou que a sham litigation_ _é o abuso do direito de demandar em juízo. A prática é proibida no Brasil, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça. A Min. Nancy Andrighi do STJ, no julgamento do REsp 1817845/MS, ao tratar da sham litigation, asseverou que, nesses casos, “o ardil, não raro, é camuflado e obscuro, de modo a embaralhar as vistas de quem precisa encontrá-lo […] O abuso se configura não pelo que se revela, mas pelo que se esconde”.

“Na identificação prática da litigância predatória (sham litigation), além dos testes PRE e US- POSCO da experiência norte-americana, foi idealizado por este julgador o teste do perfil rural mínimo”, pontou o magistrado. Na prática, o teste do perfil rural mínimo consiste em verificar se a pessoa que afirma ser agricultora possui as características corporais mínimas do exercício de trabalho rural, sendo essencial para demonstração do legítimo interesse de agir. Esse teste ocorrerá antes da citação ou antes da audiência, conforme o caso, com base no art. 481 do CPC/2015.

O acesso à justiça é um direito fundamental, o que não significa dizer que seja um direito absoluto ou que possa ser exercido de forma abusiva com ações predatórias.

Ato contínuo, o magistrado informou que serão feitas reuniões com o MPF, OAB, sindicatos rurais, INSS e Procuradoria Federal para tratar da prevenção, combate e dissuasão à litigância predatória.