Interior

Moradores de Marechal Deodoro reclamam de imóveis tombados

Eles criticam exigências quando necessitam fazer manutenção e querem mais apoio, mas segundo Iphan, critérios seguem lei federal

Por Tribuna Independente 01/09/2018 12h36
Moradores de Marechal Deodoro reclamam de imóveis tombados
Reprodução - Foto: Assessoria
Moradores da cidade de Marechal Deodoro questionam exigências para manutenção, conservação e reformas dos imóveis em que residem. A queixa é de que eles estariam com dificuldades para realizar modificações que consideram necessárias para a rotina, no entanto, segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), os critérios obedecem Decreto Federal instituído em 1937. O artista plástico Manuel Lima reclama do suporte ofertado. “O Iphan orienta, mas é uma exigência desnecessária, no meu ponto de vista. Eles cobram tanto, mas não dão o suporte que a gente espera. A gente fica em dúvida: a exigência é só as cores? Vejo em outras cidades históricas, eles usam cores fortes. Aí a gente quer reformar e muitas vezes não pode. Tombar não é demolir, a gente quer mudar as coisas e não pode. Para pintar, fazer uma coisa e outra o Iphan interfere. Quando você não pode restaurar, você passa para eles e eles fazem, mas eu acho que isso devia ser feito para todo mundo, se é recurso federal, todos deveriam ter acesso. Se todas as fachadas têm que se preservar, que aplique-se o dinheiro que têm. Porque eles exigem tanto, deveriam dar esse retorno”, diz. Ainda segundo Manuel as exigências os deixariam “sem opções”, em relação a algumas mudanças. “Nós temos carro e temos que colocar na rua e hoje em dia a violência não está para brincadeira. Ficam os moradores com os carros na porta, não tem nenhum espaço para colocar, nem podemos fazer garagem nem temos opções”, aponta. Outra que questiona as exigências é a comerciante Esmeralda Gomes. Ela diz que mora há 25 anos no mesmo imóvel e teme notificações ou até mesmo processo por conta de alguma alteração, por isso, afirma que desistiu de realizar um projeto na fachada da sua casa. “Para mim o Iphan e nada, me desculpe. A gente quer fazer, mudar qualquer coisa. Ou ‘paga’ processo ou fica como está. Uma vez entrei com um processo para mudar o portão, cortar um pedaço, ia ficar do mesmo jeito. Só ia mexer num pedacinho, colocando as portas que eles queriam, mas disseram que eu precisava entrar com um processo e que ia para Brasília para depois eles darem a resposta. Aí eu perguntei se eu fizesse por conta própria e ele disse que poderia dar processo então eu desisti e esperei pelo processo, isso já tem cinco anos. Uma vizinha teve um problema sério porque mudou as portas”, conta. Superintendente aponta necessidade de educação A cidade de Marechal Deodoro possui tombamento nas esferas municipal, estadual e federal. O conjunto arquitetônico e urbanístico foi tombado pelo Iphan, em 2009 envolvendo áreas nas regiões do Centro, Carmo e Taperaguá. De acordo com o chefe da divisão técnica do Iphan em Marechal Deodoro, Sandro Gama todas as exigências seguem o previsto no Decreto-Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937. “A conservação de todo o imóvel tombado ela é uma obrigação legal dos proprietários dos imóveis. A responsabilidade sobre a conservação é dos próprios proprietários. É como se a lei entendesse que a coletividade da nação que declarou que aquele bem é importante para a história da nação faz com que os cidadãos que nele vivem passem a ter a obrigação de conservar esses imóveis. Essa lógica está na lei. Cabe a nós fiscalizar para que os imóveis não entrem em decadência ou se arruínem. Todo o morador antes de fazer toda e qualquer reforma tem a obrigação de pedir autorização ao Iphan, que vai orientar qual a melhor forma de fazer a manutenção ou reforma. Por lei eles são obrigados a pedir autorização, mas o Iphan entende que antes mesmo de qualquer papel repressivo, existe o papel orientativo, de explicar como fazer melhor”, explica. As exigências não são específicas para a cidade de Marechal Deodoro, segundo Sandro Gama, todos os conjuntos tombados devem obedecer as especificações e estão sujeitas às recomendações. Sejam casas ou lojas, todos os imóveis têm que manter a arquitetura original do tombamento (Foto: Edilson Omena) “As modificações podem ocorrer, mas é analisado caso a caso. Por exemplo, qualquer morador pode pedir para alterar a entrada de uma porta interna, mas a depender do imóvel, em Marechal não é muito comum, mas em Penedo existem paredes internas com estruturar parietais de alto valor, então já não pode fazer essa modificação como o morador gostaria. É possível fazer alterações em todos os imóveis, mas desde que o Iphan autorize. A gente vai, conhece o imóvel, analisa e define se não pode, se não puder a gente orienta como pode”, esclarece. Em relação à queixa do Mercado de Artesanato, Gama explica que a solicitação foi autorizada. “Na questão do Mercado, o vidro já foi autorizado, o projeto já foi autorizado. Não sabemos o porquê da reclamação. Lembro que existe um projeto aprovado para lá nessas estruturas de gradis por onde entra água”, destaca. A superintendente de Cultura e Preservação do Patrimônio Histórico da Prefeitura de Marechal Deodoro, Fernanda Gueiros ressalta a necessidade de estratégias em educação patrimonial que incentivem a população a absorver a importância da preservação desses espaços. “A gente tenta entender o morador, porque mesmo que tenha um carro, não tem como fazer uma garagem. Infelizmente não pode. É o lado ruim, mas o lado bom é que o município é tombado, que tem uma importância nisso. Tem as vantagens e as desvantagens. Eles podem pintar, mas às vezes acontecem excessos, como pintar de verde-limão ou rosa choque, isso não pode, por exemplo. Estamos fazendo um projeto maior com recursos da Prefeitura e nesse projeto a gente vai incluir educação patrimonial para que a população entenda e valorize a importância que o conjunto arquitetônico em que ela vive tem. Realmente a educação patrimonial é muito importante, pois são poucos que se orgulham, que não se chateiam com isso”. Fernanda Gueiros explica que há uma rede de suporte para os proprietários que não têm condições de manter a estrutura em boas condições, desde que haja a comunicação do fato. Além disso, segundo ela um dispositivo municipal incentiva a manutenção dos imóveis. “A Prefeitura tem uma lei que isenta 100% do IPTU para o proprietário que mantêm a fachada, que preserva. Pintada, bem preservada. A gente dá isenção. Mas se a casa está detonada ou com rachaduras, o município não tem um fundo, um recurso direcionado para isso, para atender todo o centro histórico, pois são muitas casas. O que acontece são algumas ações do Iphan para casas em condições precárias cujas famílias não têm condições de fazer esse tipo de reforma, aí a gente entra com pedido no Iphan ou o próprio morador e o Iphan tenta conseguir o recurso. A Prefeitura paga o aluguel para a família e a reforma é realizada, mas isso não é uma coisa que acontece fácil, o incentivo do município é mesmo a isenção do IPTU, até porque por lei a obrigação é do morador”, destaca. Situação gera controvérsia entre população Dona Janete Peixoto, de 65 anos afirma ter tido alguns problemas envolvendo reformas.  “Já tive problema com a casa do meu filho. A gente não mexeu na fachada, fizemos uma casa no quintal, mas houve embargo pelo menos umas três vezes e tivemos a cobrança de uma multa altíssima, quase R$ 1.700. Conseguimos explicar a situação e eles liberaram”, diz. Ela reclama também da situação do local onde expõe suas produções. “Aqui no Mercado de Artesanato nós temos um prejuízo enorme por conta de chuva. Porque na parte de cima, nas grades, não pode colocar alumínio, acrílico, PVC, não pode colocar uma proteção e quando chove molha as mercadorias. Molha tudo e ficamos no prejuízo. Nas portas também não podemos colocar, o Iphan não consente e eu acho um absurdo. Precisamos olhar essas coisas. Fizemos um ofício, há uns cinco anos queremos isso e não conseguimos ainda”. SATISFEITA Já a dona Nazaré da Conceição, de 69 anos, mora há 17 anos na Rua Tavares Bastos e afirma que as orientações passadas são suficientes. Ela diz que a restrição fica apenas para as “coisas moderninhas”. “Eles [Iphan] vêm e orientam. Tenho que esperar eles dizerem, pelas cores das tintas. As paredes, portas, mas essa questão da fachada. Dentro de cada, dependendo do que for pode né? Nunca precisei mexer, até porque não pode. Essas coisas moderninhas não pode, hoje em dia alguns misturam né? Não há quem possa com o povo, mas eles mandam colocar essas mais simples, amarelinho, branquinho. Eles orientam, as pessoas sabem, se não procuram fazer é porque não querem, mas saber sabem”, pontua.