Economia
Governo impõe freio aos gastos para tentar atingir meta fiscal; serviços são afetados
Emissão de passaportes e ação da PRF já foram afetados
Para tentar atingir a meta fiscal deste ano, de um déficit primário (sem contar despesas com juros) de até R$ 139 bilhões, a equipe econômica do governo federal impôs um forte bloqueio de gastos orçamentários.
A limitação de despesas já está afetando alguns serviços para a população, como a emissão de passaportes e as ações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) nas estradas.
O limite para gastos primários totais fixado para o governo para 2017, até o momento, é de R$ 1,286 trilhão, contra R$ 1,242 trilhão no ano passado - o que representa uma alta nominal de 3,57%. A variação é a menor da série histórica que tem início em 1997, ou seja, em cerca de 20 anos.
Os números foram consolidados pela Instituição Fiscal Independente, órgão ligado ao Senado Federal, a pedido do G1, com base em informações oficiais da Secretaria do Tesouro Nacional.
A série histórica mostra que o crescimento médio anual dos gastos primários totais do governo, entre 1998 e 2016, foi bem maior: de 12,55% em termos nominais.
Entre 2012 e 2015, por exemplo, as despesas totais cresceram, respectivamente, 11,06%, 13,23%, 13,05% e 11,39%.
Em 2016, ano que teve dois presidentes (Dilma Rousseff até maio e Michel Temer depois disso), as despesas cresceram menos: 7,22% contra o ano anterior.
Gastos do governo caem 38,5% até maioLevantamento da Instituição Fiscal Independente mostra que, nos cinco primeiros meses deste ano, quase todas as áreas do governo federal foram afetadas pela limitação de despesas, que foram 38,5% menores do que no mesmo período de 2016.
Outros poderes, como o Legislativo (-20,2%), o Judiciário (-22,3%) e o Ministério Público (-25,9%) também foram acometidos. A redução de despesas é fruto do bloqueio de R$ 38,96 bilhões em gastos ainda existente nas contas públicas neste ano.
O Ministério das Cidades, por exemplo, teve uma redução de 55,2% em suas despesas, ao mesmo tempo em que o Ministério de Minas e Energia registrou uma queda de 87,5% em seus gastos, na parcial até maio.
O Ministério dos Esportes teve um recuo de 74,8%. Os ministérios da Saúde (queda de 36,9%) e da Educação (recuo de 17,7%) também tiveram redução de gastos, considerando o mesmo período.
Mesmo com o bloqueio de gastos, nem todos os órgãos federais tiveram redução de verba. Na contramão da limitação de despesas, está a Presidência da República, cujas despesas, até maio deste ano, foram elevadas em 2,7%.
O Ministério das Relações Exteriores, por sua vez, registrou um aumento de 25,7% em seus gastos nos cinco primeiros meses deste ano.
Contenção afeta políticas públicasA forte contenção de gastos que está sendo feita em 2017 tem afetado algumas políticas públicas.
Recentemente, ganharam espaço na imprensa as reclamações da Polícia Federal, que, sem limite orçamentário suficiente, interrompeu a emissão de passaportes (que serão retomados após aprovação de novos recursos pelo Congresso) e também as ações da Polícia Rodoviária Federal - que serão reduzidas por conta da falta de verba.
Para o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, Felipe Salto, o fato de o orçamento não ser impositivo não é "democrático"'.
"Esse é o problema de ter um orçamento que não é mandatório, impositivo. Em período de não escassez, de fartura, quem chora mais, pode mais. Isso é ruim. Por isso que a gente precisava de uma reforma orçamentária", afirmou
Ele lembrou que a reforma da lei de finanças está caminhando no Congresso Nacional. "Está na câmara, já foi aprovada pelo senado. É algo estrutural, que poderia ajudar nesse sentido", avaliou o diretor-executivo da IFI.
Ajustes no orçamentoEsse limite de gastos de R$ 1,286 trilhão para 2017 poderá ser revisto pela equipe econômica até o dia 22 de julho, data limite para divulgação do relatório de receitas e despesas do terceiro bimestre deste ano.
A área econômica ainda está fechando os números. Contribui para a liberação de novos gastos a aprovação, pelo Congresso, de medida que autoriza o governo a usar R$ 8,6 bilhões em precatórios (decisões judiciais não pagas) para formar o superávit primário das contas públicas.
Mas a dúvida é se, mesmo com essa autorização, será possível atingir a meta fiscal, tendo em vista um cenário de baixo nível de atividade - que compromete o crescimento da arrecadação. Por isso, altas de tributos também não estão totalmente descartadas.
As restrições orçamentárias não impediram, porém, o presidente Michel Temer de sancionar a lei que reajusta o salário de oito categorias do serviço público. Ao todo, 68.149 pessoas serão beneficiadas pelo aumento, entre servidores da ativa, aposentados e pensionistas. O texto original previa um impacto em 2017 de R$ 3,7 bilhões e de R$ 10,91 bilhões até 2019.
Analistas veem meta fiscal de 2017 descumpridaMesmo com um forte bloqueio de gastos, a Instituição Fiscal Independente e os economistas do mercado preveem descumprimento da meta fiscal deste ano - de um déficit primário de até R$ 139 bilhões.
Isso porque a arrecadação está demorando para se recuperar, em um cenário ainda marcado pelo fraco nível de atividade.
Para a IFI, a previsão é de um rombo de R$ 144,1 bilhões nas contas do governo nesse ano. Esse valor não considera, porém, os R$ 8,6 bilhões em receitas de precatórios.
Porém, de acordo com Felipe Salto, há uma "incerteza" importante de que essa receita de venda de ativos (Caixa Seguridade, IRB e BR Distribuidora) se materializará em 2017.
A mesma visão tem Fabio Klein, economista da Consultoria Tendências. Para ele, mesmo considernado receitas extraordinárias de R$ 47,5 bilhões neste ano (como Refis, repatriação, concessões e vendas de ativos), o déficit primário deverá somar R$ 148 bilhões em 2017 - estourando a meta fiscal.
"Daí que nasce um cenário de novos aumentos de carga tributária, como a CIDE e o PIS e Cofins sobre combustíveis. Não estava na nossa conta. De repente [com aumento de tributos], aí você consegue compensar esse risco [de não cumprir a meta fiscal de 2017]", declarou Klein.
No fim do mês passado, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, reafirmou que a meta fiscal deste ano, de um rombo de até R$ 139 bilhões, será cumprida pelo governo. "Não vamos deixar de cumprir objetivos por uma resistência teórica ao aumento de impostos", declarou ele na ocasião.
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