Ciência e Tecnologia

Modelo das cidades inteligentes pode otimizar a região metropolitana de Maceió

Sistemas permitem coletar parâmetros como a qualidade do ar; emissão de poluentes, fluxo dos veículos no trânsito e consumo de água

Por Tribuna Independente 30/07/2022 10h22
Modelo das cidades inteligentes pode otimizar a região metropolitana de Maceió
Pablo Viana, ex-secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo de Alagoas - Foto: Reprodução

Doutor em Ciência da Computação, Pablo Viana, que foi Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo de Alagoas -, conhece tudo sobre o modelo das Cidades Inteligentes ou as Smart Cities. Nessa entrevista ao jornal Tribuna Independente, Pablo dá seu spoiler do que vai expor no 2º Ciclo de Debates da Jorgraf/ GQTech, falando também sobre os possíveis efeitos caso a RMM assimile e adote as tecnologias necessárias para as mudanças. Pablo tem formação no exterior pela Universidade da Califórnia e pós-doutorado na Linköpings Universitet, na Suécia, e é professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), com atuação acadêmica em sistemas de informação, gestão da inovação e empreendedorismo.

O QUE SÃO AS SMART CITIES?

“Podemos definir as cidades inteligentes como sendo comunidades que fazem uso de tecnologias conectadas entre si, que permitam coletar e analisar dados, com o objetivo de proporcionar melhores serviços para os cidadãos. São sistemas que permitem coletar parâmetros como a qualidade do ar, a emissão de poluentes, o fluxo dos veículos no trânsito, o consumo de água, demanda de atendimento hospitalar, entre muitos outros, para serem analisados e orientar a tomada de decisões individuais ou coletivas. Com isso, podemos planejar o crescimento de cidades e a integração de municípios de uma região de uma maneira mais sustentável, visando à eficiência na aplicação dos recursos”.

ENTRAVES PARA IMPLANTAÇÃO

“Muitas vezes, a carência básica de infraestrutura é uma consequência direta da ausência de informações que pudessem ter melhor orientadas à gestão na aplicação de recursos. São fatos visíveis, quando, por exemplo, uma população percebe que uma nova via asfaltada não possui uma demanda que justificasse aquele investimento. Ou sob uma chuva intensa, descobre-se que a dimensão das galerias pluviais não foram suficientes para drenar o volume de água. De uma forma geral, o tipo de parâmetro a ser monitorado não necessariamente precisa de um sensor específico para coletar dados. Na maioria das vezes, esses dados já foram coletados de outras formas, em pesquisas, ou atividades anteriormente relacionadas, mas nem sempre estão disponíveis, para que pudesse enriquecer a qualidade da informação para a tomada de decisão. Por outro lado, com o uso cada vez maior dos aparelhos smartphones, que incorporam vários sensores (câmeras, microfone, temperatura, acelerômetro, etc), a coleta de dados se torna automática e, ao mesmo tempo, disponível por meio dos aplicativos conectados à “nuvem”. Aproveitar esta crescente disponibilidade de dados e do uso de tecnologia é um caminho necessário para racionalizar o funcionamento das cidades e melhorar a convivência social”.

SALTOS TECNOLÓGICOS

Algumas inovações, denominadas “disruptivas” parecem promover saltos notáveis na forma como a sociedade lida com a tecnologia. Nos últimos anos, ouvimos muito falar sobre inteligência artificial e mais alguns termos específicos como Big Data e Machine Learning. Estamos vivenciando mais um salto tecnológico? “Sim, é correto perceber esses saltos, pois as tecnologias que viabilizam as inovações disruptivas são capazes de mudar a forma como agimos ou executamos algumas tarefas. No momento, a disponibilidade de quantidades imensas de dados, automaticamente capturados pelos aplicativos dos smartphones, por eletrodomésticos conectados à internet, ou qualquer outro equipamento interconectado em rede, desloca a nossa preocupação da coleta de dados e passa agora a recair no processamento dessas informações, que é o tema principal do conhecimento em Big Data. Para lidar com esse desafio computacional, novas tecnologias relacionadas à Inteligência Artificial emergem como uma abordagem inovadora na concepção de algoritmos. Técnicas de Aprendizado de Máquina (Machine Learning), aplicadas aos conjuntos de dados, permitem inferir respostas para problemas de grande complexidade computacional, com respostas que podem aprimorar em muitos níveis a qualidade e eficiência de decisões”.

SEGURANÇA E PRIVACIDADE

“A transparência e livre acesso a dados trazem benefícios e liberdades que podem nos levar a um amplo horizonte de possibilidades, como, por exemplo, rastrear o recolhimento de impostos de cada cidadão e o trajeto até a aplicação final de recursos públicos. Ou a possibilidade de encontrar o comprador para um produto ou serviço que você está tentando vender, com base nas pesquisas que alguém realizou recentemente. Mas a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LBPD), de 2018, inspirada pela sua equivalente europeia, protege os dados pessoais e de busca, preservando os direitos fundamentais da liberdade, privacidade e do desenvolvimento pessoal. Então, basicamente, o setor público pode-se valer do tratamento de dados dos cidadãos de forma coletiva, estatística, na elaboração e execução de políticas, mas deve incorporar a proteção de informações de ordem pessoal, de forma a preservar os direitos individuais. Esse tipo de limitação é necessária para evitar a exposição de pessoas com base em suas particularidades”.

PERSPECTIVAS NA RMM

“Os dados continuam sob a guarda das instituições responsáveis pela sua coleta. As instituições dos municípios que compõem a RMM podem compartilhar suas bases de dados adotando as melhores práticas em Dados Abertos, permitindo, com isso, que desenvolvedores e integradores possam criar soluções para problemas na forma de produtos e/ou serviços inovadores para a própria comunidade. Existem vários casos de sucesso de aplicativos que foram criados com base nos dados abertos da Secretaria da Fazenda Estadual (Sefaz-AL), que permitem fazer busca por produtos em estabelecimentos de venda, programas de fidelidade, comparativo de preços, etc. A qualidade da informação desses aplicativos auxilia os cidadãos a economizarem tempo e dinheiro quando estão tentando adquirir mercadoria. Mas o alcance de benefícios pode ir muito além, quando pensamos em toda uma região integrada. Meios de transportes mais eficientes, semáforos e estacionamentos escalonados, elementos de monitoramento e segurança, e muitos outros serviços, dos vários órgãos envolvidos”.

ADAPTAÇÕES AO MODELO

“O tema das cidades inteligentes ganhou uma ampla conotação, para se referir tanto a empreendimentos imobiliários, como condomínios que oferecem serviços modernos aos moradores, como Wi-Fi em áreas comuns, urbanização sustentável, através de materiais e processos construtivos diferenciados, horários de ônibus, até o conceito de metrópoles urbanas, com planos de desenvolvimento integrados, pensados no bem-estar. Apesar dessa diversidade de ideias e soluções envolvendo o tema, a questão central sempre será o desenvolvimento de cidades mais sustentáveis, pensadas no equilíbrio e racionalização de recursos e, por tanto, mais humanas. No Brasil, a cidade de Curitiba está sempre nos rankings das cidades mais inteligentes do mundo, dentre muitos atributos, graças ao seu planejamento urbano que valoriza espaços verdes, apesar de representar uma área industrial que também é berço de mais de 3.500 empresas. Lisboa também é frequentemente citada. A capital portuguesa incorpora diversos recursos centrados no bem-estar humano, priorizando a qualidade de vida dos seus cidadãos. Adequar exemplos no mundo a realidade local é uma questão de planejamento, de convergência de necessidades e problemas em soluções comuns”.

A RMM e a economia dos alimentos

Antônio Santiago, ex-secretário de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Aquicultura do Governo de Alagoas


A produção, processamento, distribuição e consumo de produtos alimentícios na RMM também serão debatidos no evento. Importante nos concentrarmos nas questões da economia dos alimentos e as atividades voltadas à alimentação nos setores de produção, indústria, comércio e serviços, assim como a quantidade de frutas, legumes e verduras, a comercialização de alimentos e os estabelecimentos privados e públicos, como supermercados, feiras livres, escolas, restaurante popular, centrais de abastecimento e mercados públicos.
Quem nos explica todo o processo é o mestre e doutor Antônio Santiago, ex-secretário de Estado da Agricultura, Pecuária, Pesca e Aquicultura do Governo de Alagoas. Graduado em Agronomia pela Universidade de Brasília, mestre em Agronomia pela Universidade Federal de Lavras e doutor em Agronomia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Atualmente, Santiago trabalha na Embrapa Tabuleiros Costeiros - Unidade de Execução de Pesquisa de Rio Largo.

ATIVIDADES AGRÍCOLAS DA RMM

“Temos a cana-de-açúcar, coco, pastagem, eucalipto, fruticultura e as produzidas por pequenos produtores incluindo os agricultores familiares. Uma das oportunidades é o BRS Sena, primeiro tomate rasteiro híbrido desenvolvido no Brasil, que tem mostrado potencial para produção no Nordeste brasileiro. Experimentos conduzidos pela Embrapa em Alagoas, desde 2020, vêm apresentando resultados promissores para posicionamento do produto em diferentes nichos de mercado. Com exceção da fruticultura, são atividades que geram pouco emprego. Quando sabemos que aproximadamente 30% da população do estado vivem na região e que existem altas taxas de desempregados, necessita-se de emprego e renda”.

IMPLANTAÇÃO DE HORTAS URBANAS

“Uma das opções para geração de renda e emprego na RMM pode
ser a implantação de hortas urbanas ou periurbanas. Tanto o cultivo de algumas hortaliças em casa como comunitárias (em espaços públicos ou privados) representa uma política para redução da pobreza, melhoria da segurança alimentar e inclusão social. Sabemos que somos uma população urbana, mas que grande parte de nossa população veio da zona rural, ou seja, tem vivência no campo”.

COMERCIALIZAÇÃO DOS EXCEDENTES

“Sem dúvida, mas é essencial os produtores terem assessoria de técnicos. A questão da comercialização dos excedentes não é fácil, pelo contrário. Conhecemos vários exemplos de frustração no momento da comercialização, contudo, existem mecanismos que possam reduzir esses riscos. Por exemplo, criação de feiras livres, venda para restaurantes populares, venda para escolas públicas e pontos de comercialização na Ceasa”

REGIÕES TURÍSTICAS

A questão de vários municípios terem o turismo como fonte de renda pode contribuir? “Sem dúvida. Hoje o turista não vem somente pelas praias, ele também quer conhecer a gastronomia e seu artesanato. Outro ponto positivo é oferecer aos turistas produtos cultivados pelos agricultores locais. Isso será importante para os hotéis e pousadas das cidades turísticas da RMM. Além de Maceió, temos Marechal Deodoro, Pilar, Barra de Santo Antônio, Barra de São Miguel, Paripueira”.