Cidades
Moradores do Bom Parto sofrem efeitos da mineração
Eles criticam laudos da Defesa Civil de Maceió; mesmo atingidos, imóveis não foram interditados

As vistorias realizadas pela Defesa Civil de Maceió nos imóveis da Avenida General Hermes, no bairro do Bom Parto, desde 2021 até agora, não surtiram efeito. As equipes técnicas constataram rachaduras e fissuras provocadas nas casas — algumas com cômodos isolados devido ao risco de desabamento de paredes ou afundamento do piso —, mas os imóveis não foram interditados, tampouco seus moradores foram ressarcidos pelos prejuízos sofridos.
“Quem não pôde arcar com os custos da reforma teve que abandonar o imóvel, com medo de que a casa caísse. Foi o caso da dona Socorro”, comentou um morador da Avenida General Hermes, que pediu anonimato por receio de retaliação.
Segundo ele, todos os imóveis da rua apresentaram problemas em razão da mineração predatória da Braskem. No entanto, a casa da dona Socorro, no número 1367 da Avenida General Hermes, foi a mais danificada. A residência permanece fechada e está localizada em frente ao trecho de asfalto que cedeu, devido ao vazamento de uma lama barrenta proveniente do subsolo. A Prefeitura de Maceió, em parceria com a Braskem, realizou o reparo na tubulação de água, que teria causado o rompimento do asfalto, mas o local permanece interditado, ocupando um lado da pista, no sentido Centro.
A reportagem da Tribuna Independente entrou em contato com a dona Socorro. Ela confirmou que o laudo da Defesa Civil Municipal determinou o isolamento de dois cômodos de sua casa — o banheiro e a cozinha —, mas não interditou o imóvel. Além disso, orientou que ela fizesse os reparos necessários, sem, no entanto, associar as rachaduras nas paredes e fissuras no piso à subsidência do solo provocada pela Braskem. O mesmo ocorreu com outros moradores do trecho em frente à sede da Secretaria Municipal de Educação (Semed), cujo prédio, vistoriado pela Defensoria Pública do Estado, também apresenta rachaduras e fissuras.
“A bola da vez é o Bom Parto, mas sem o apoio da Defensoria dificilmente teremos direito à inclusão no Plano de Compensação Financeira da Braskem”, declarou o morador, que forneceu à nossa equipe uma cópia em PDF do laudo da Defesa Civil de Maceió referente à vistoria realizada na casa da dona Socorro.
A advogada da moradora, Michele Gusmão, confirmou a autenticidade do laudo, cuja vistoria foi feita em 2021. Ela afirmou que outros imóveis da região foram vistoriados na mesma época, mas até hoje nenhuma solução foi apresentada.
Denúncia
“Temos aqui uma ‘pérola’ da Defesa Civil: um laudo dos escafandristas do órgão a serviço da Braskem, que manda a dona da casa isolar o banheiro e a cozinha por conta de rachaduras e fissuras, mas não interdita o imóvel — para não criar um precedente, um efeito dominó”, afirmou o morador, que se considera “vítima da Braskem”.
Segundo ele, a área de realocação no Bom Parto, ao longo da Rua General Hermes, se estendeu da Igreja Católica, de um lado, até a Igreja Batista, do outro. Toda a região próxima à antiga Escola Brandão Lima foi afetada pelo afundamento do solo. No entanto, apenas parte dos imóveis foi incluída no mapa da área de risco — a maioria ficou de fora e, portanto, sem direito a nada.
À esquerda do antigo Colégio Brandão Lima, os moradores ainda vivem esse drama. Sofrem os efeitos da mineração, mas por estarem nas bordas da área de risco, ficaram de fora do processo de realocação com indenização paga pela Braskem. À direita do colégio, a Igreja Batista — já com tapume colocado pela Braskem — foi um dos imóveis indenizados, enquanto a maioria ficou à margem: sem realocação, sem compensação financeira e obrigada a arcar com os prejuízos, como ocorreu com a dona Socorro. Após a Igreja Batista, restam entre 10 a 15 imóveis, até a esquina, que também não foram incluídos no mapa e, por consequência, ficaram fora do Programa de Compensação Financeira (PCF) da Braskem.

Ação está sendo feita para pedir à Justiça uma reparação justa para atingidos
Essa política de “dois pesos, duas medidas” adotada pela Braskem vem sendo enfrentada pela Defesa Civil do Estado, que realizou uma audiência pública no bairro, ouviu os moradores e, com base nessas informações, prepara uma ação civil pública para buscar, na Justiça, uma reparação justa aos moradores cujos imóveis ficam nas bordas da área de risco.
Ao ter acesso ao laudo da Defesa Civil Municipal sobre a casa da dona Socorro, o defensor público Ricardo Melro resumiu o caso com uma única palavra: “absurdo”.
Ciente de que ações individuais são dispendiosas e demoradas, ele está preparando uma ação coletiva, a fim de que a Justiça reconheça o direito dos moradores que ficaram de fora do primeiro acordo assinado com a Braskem, com aval dos órgãos ministeriais de Alagoas.
A advogada da dona Socorro, Michele Gusmão, declarou concordar com essa possibilidade e defende a iniciativa da Defensoria como uma alternativa de reparação. Ela pleiteia a inclusão desses imóveis no novo mapa de risco, para que as famílias tenham direito à compensação pelos prejuízos, à inclusão no Programa de Compensação Financeira (PCF) da Braskem e à indenização por danos morais.
Outro Lado
“A Defesa Civil de Maceió informa que a residência está dentro do Mapa de Linhas de Ações Prioritárias (versão 5), na Área 01, de monitoramento. O local já é acompanhado pelo órgão, e há uma ocorrência mais recente no imóvel, onde foi constatada sua desocupação. A Defesa Civil Municipal continua monitorando toda a região constante no mapa, assim como as áreas adjacentes.”
Vistoria
Dona Socorro teve sua casa vistoriada pela Defesa Civil, que recomendou o isolamento de dois cômodos, mas não interditou o imóvel. Veja a descrição do cenário, nas palavras da própria Defesa Civil:
Vítima da mineração predatória da Braskem, a moradora do número 1367 da Avenida General Hermes recebeu a visita da Defesa Civil Municipal em setembro de 2021. Os técnicos tiveram acesso ao imóvel, observaram rachaduras nas paredes e fissuras no piso, e constataram que a estrutura da casa estava comprometida. Ainda assim, a residência não foi interditada — possivelmente para que ela não tivesse direito à indenização ou ao aluguel social — embora o caso tenha sido “encaminhado” à Secretaria Municipal de Assistência Social.

Recomendação é não usar banheiro nem cozinha
Veja as providências recomendadas pela Defesa Civil: “Não é recomendada a permanência dos moradores no banheiro e na cozinha até que reparo seja realizado”.
“A Defesa Civil não interditou o imóvel para não incluiu no PCF, mas recomendou aos moradores a não usarem o banheiro nem a cozinha. Como seria isso possível morando no local!? Achei que já tinha visto tudo!”, comentou um vizinho da dona Socorro.
“No entanto, à época toda orientação era no sentido de não fazer reparos, justamente para poder observar a evolução das patologias”, acrescentou.
“A Defesa Civil sugeriu o contrário e ainda recomendou que a família não utilizasse o banheiro nem a cozinha. Isso é surreal”, completou. “Enquanto isso, impede o acesso a Igreja Bateria do Pinheiro, que nem rachaduras apresenta”.
Para os militantes do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), “esta recomendação é um verdadeiro escárnio com as famílias moradoras do Bom Parto”. “Essa família deixou o imóvel sem direito a nada, embora a culpa seja da Braskem. Por conta disso, seus vizinhos continuam morando no local, correndo risco de vida, porque não têm para onde ir”, comentou o morador do bairro.
“Se ficar o bicho como, se correr o bicho pega”, comentou, lembrando que até o asfalto, bem na porta da casa de dona Socorro, já rachou e veio à tona. “Nem assim, a Defesa Civil interditou o imóvel, embora desde 2022, essa família abriu um Processo (Nº 100.1637.2022) na Prefeitura pedindo providências. “Mas até hoje não houve resposta”, concluiu.
A intenção do morador, ao criticar o laudo da Defesa Civil sobre a casa da dona Socorro, é mostrar que “a recomendação do órgão, possivelmente antecipa o texto do próximo relatório do Grupo de Trabalho, pedindo a ampliação do mapa, que eles estão dizendo que sairá nos próximos dias”.
“Os imóveis que restaram nesse trecho da rua estarão no próximo mapa. Na verdade, deveriam ter entrado desde a primeira versão”, completou.
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