Cidades

Vítimas da Braskem entregam carta-denúncia à cúpula do G20 em Maceió

Manifestantes estiveram na porta do Hotel Ritz mas ficaram de fora do evento, com faixas e panfletos, protestando contra a mineradora responsável pelo afundamento do solo em Maceió

Por Ricardo Rodrigues - colaborador 13/09/2024 19h21 - Atualizado em 14/09/2024 01h51
Vítimas da Braskem entregam carta-denúncia à cúpula do G20 em Maceió
Carta foi entregue à cúpula do G20 - Foto: Edilson Omena

Integrantes do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem estiveram nesta sexta-feira (13) no Hotel Ritz, na Praia da Jatiúca, onde está sendo realizado o evento do G20, que reúne os países mais ricos do mundo. Com faixas e panfletos, eles se posicionaram na frente do local do evento e entregaram uma Carta Aberta às autoridades da cúpula do G20, denunciando a mineração predatória da Braskem em Maceió.

Pouco antes da chegada dos manifestantes, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, abriu a reunião ministerial do Grupo de Trabalho em Economia Digital do G20, que está sendo realizada na cidade, desde a última segunda-feira (9). Em seu discurso, o ministro destacou que economia digital é o novo eixo dinâmico da economia global, crescendo a um ritmo mais acelerado do que a economia como um todo.

Os manifestantes não tiveram contato com o ministro, mas deixaram uma cópia da Carta Aberta para a assessoria dele. De acordo com Maurício Sarmento, integrantes do MUVB, a segurança do evento se mostrou bastante rígida e não deixou que um grupo de manifestantes entrassem para entregar o documento às autoridades. Por isso, eles tiveram que entregar a Carta-Aberta à assessoria do evento.

(Foto: Edilson Omena)

“Estivemos na porta do Hotel onde se concentra a reunião do G20, mas de forma pacífica e apresentamos a nossa carta aos membros do G20”, afirmou Sarmento. Mesmo assim, um segurança ainda tentou intimidar as lideranças do movimento. “Um policial federal agiu com arrogância, tentando intimidar a gente, querendo que a gente se retirasse da recepção do evento, quando ninguém estava ali fazendo nada de errado”, acrescentou.

De acordo com Maurício Sarmento, o Movimento espera que as reivindicações das vítimas da mineração sejam atendidas pelos organismos internacionais. “Nossa expectativa é de que o G20, com sua influência e capacidade de liderança global, se posicione em defesa das vítimas de crimes ambientais e contra a impunidade corporativa”, destacou Sarmento.

Segundo ele, o prefeito JHC, que é candidato à reeleição em Maceió pelo PP, esteve na reunião do G20, onde participou da solenidade de encerramento dos trabalhos, ao lado de outras autoridades. “Ele passou por aqui, mas a gente não teve contato com ele, se a gente tivesse, ele ia recebe uma cópia da nossa carta”, concluiu Sarmento.

Em seu discurso, durante o evento, João Henrique Caldas, destacou a importância do uso da tecnologia como ferramenta de empoderamento do cidadão. “Por isso, os governos local e internacional precisam combater a desinformação. Informações erradas são facilmente disseminadas”, ressaltou.

Até o final do dia, as autoridades vão debater a versão final da declaração do grupo sobre economia digital, que será enviada para a Cúpula de Líderes do G20 que será realizada no Rio de Janeiro em novembro.

"CARTA ABERTA DO MUVB

Carta Aberta às Excelentíssimas Autoridades da Cúpula do G20

Nós, as vítimas do crime socioambiental causado pela Braskem na cidade de Maceió, Alagoas, nos dirigimos a esta distinta cúpula internacional com um apelo urgente de justiça e reconhecimento.

Nos últimos anos, temos sofrido as consequências devastadoras de uma tragédia que destruiu nossos lares, nossas comunidades e nosso meio ambiente. Milhares de famílias foram deslocadas, suas vidas completamente desestruturadas, e o impacto social e ambiental continua a assolar nossa cidade, atingindo aproximadamente 15 mil imóveis e 60 mil pessoas. O crime cometido pela Braskem, decorrente da extração descontrolada de sal-gema, resultou no afundamento de bairros inteiros, deixando um rastro de destruição e desespero.

Os bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange, Bom Parto e parte do Farol praticamente desapareceram, enquanto as comunidades dos Flexais, Quebradas, Marquês de Abrantes, Bom Parto e a Rua Santa Luiza na Vila Saem lutam para serem realocadas, pois suas localidades perderam de modo irreversível suas condições de habitabilidade digna, e a infratora ambiental nega-se a retirar as pessoas dessas localidades, com indenizações justas.

Reconhecemos que esta cúpula se reúne com o objetivo de discutir temas de importância global, como o desenvolvimento econômico sustentável, a proteção ambiental e a justiça social. No entanto, é fundamental lembrar que essas questões não são meramente abstratas ou teóricas, mas têm consequências reais na vida das pessoas, como nós, que fomos diretamente afetados por práticas empresariais irresponsáveis.

Solicitamos que este honrado fórum internacional considere em suas discussões a necessidade de medidas mais rigorosas para responsabilizar empresas transnacionais pelos crimes ambientais que cometem, independentemente das fronteiras. A impunidade com que empresas como a Braskem agem coloca em risco não apenas o meio ambiente, mas também a dignidade humana.

O valor das indenizações atualmente concedidas, embora um avanço, está longe de ser suficiente para reparar as perdas incalculáveis que sofremos. A Corte Interamericana de Direitos Humanos estabelece parâmetros de compensação que ultrapassam, em muito, os valores atualmente praticados, e acreditamos que este deve ser o padrão mínimo a ser seguido. Para que haja verdadeira justiça, é necessário que as reparações sejam proporcionais aos danos sofridos, e que as vítimas sejam ouvidas e colocadas no centro de qualquer processo de reparação, garantindo a participação direta dos atingidos em todos os espaços de discussão sobre os seus problemas.

Pedimos que as autoridades presentes nesta cúpula tomem ações concretas e imediatas para que as vítimas de crimes ambientais não sejam esquecidas. Que a justiça seja feita e que nossas vozes sejam ouvidas na arena internacional. Nosso sofrimento não pode ser ignorado, e acreditamos que, juntos, podemos construir um futuro mais justo e sustentável para todos.

Com todo o respeito, e na esperança de que nossas súplicas sejam atendidas, nos despedimos com a expectativa de que o G20, com sua influência e capacidade de liderança global, se posicione em defesa das vítimas de crimes ambientais e contra a impunidade corporativa.

Atenciosamente,

Maceió, 10 de setembro de 2024.

MUVB – Associação do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem."