Cidades

Em Maceió, 14% dos adolescentes sofreram abuso sexual

Trata-se de um público entre 13 e 15 anos; meninas são 18% que sofrem com essa situação abusiva

Por Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 15/07/2022 06h54 - Atualizado em 15/07/2022 14h17
Em Maceió, 14% dos adolescentes sofreram abuso sexual
Casos de abusos contra crianças e adolescentes “explodiram” com a pandemia de Covid-19 - Foto: Ilustração

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados esta semana na pesquisa Pense 2019 apontam que um em cada sete adolescentes maceioenses, ou 14% da faixa etária entre 13 a 15 anos sofreram algum tipo de abuso sexual. Quando se considera o público feminino, esse percentual salta para 18%.

As estatísticas comprovam o que outros levantamentos nacionais e locais vêm apontando: o crescimento da violência contra crianças e adolescentes em todo o país. De acordo com a Gerência de Doenças e Agravos não Transmissíveis (GEDANT) da Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau) são mais de 2,7 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes entre 2017 e 2021 em Alagoas. Destes, 46% envolvem a faixa etária de 10 a 14 anos.

Outro levantamento, desta vez o Anuário da Segurança Pública 2022 aponta que os casos de abusos contra crianças e adolescentes “explodiram” com a pandemia de Covid-19.
Conforme dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de janeiro a junho foram registradas 4.486 denúncias de violações de direitos humanos contra crianças e adolescentes ligados a situações de violência sexual em todo o país.

O conselheiro tutelar da 4° região de Maceió Rafael Martiniano afirma que recebe diariamente denúncias de maus tratos e abusos contra crianças e adolescentes. A média semanal fica entre 7 e 10 casos, mais de um por dia. Ele explica que geralmente os casos de maus tratos se associam a outros tipos de violência.

“Recebemos diariamente as denúncias, a maior parte envolvendo situações combinadas de negligência e abusos. Encontramos uma situação de negligência. Criança vive na rua altas horas da noite, padrasto usuário de drogas. E a outra de uma mãe agressiva que vive espancando os três filhos, ou seja, num só dia quatro crianças “, detalha.

O conselheiro afirma que a maior dificuldade é dar sequência nas denúncias. Uma vez que mesmo com a comprovação é muito difícil retirar as crianças ou adolescentes do ambiente de violência.

“Só em casos extremos é que conseguimos retirar. Normalmente o Conselho registra o fato e encaminha para as providências. Mas precisamos de uma melhor resposta da rede, polícia, CRAS, saúde, para amparar esses casos. É preciso uma resposta mais rápida da rede de proteção. Campanhas mais sólidas, informativas e educativas”, reforça.

Pandemia agravou cenário de violência

Membro da Comissão dos Direitos das Crianças e Adolescentes, a advogada Nizandra Luna afirma que a situação é alarmante. Ela explica que a pandemia escancarou casos de violência e que falta resolução por parte da justiça.

“Aumentou principalmente os casos de violência sexual nos dois últimos anos por cota da pandemia. Em virtude deste cenário, crianças e adolescentes acabaram por ficar sem os serviços prestados pela rede. Como exemplo, a escola, que é uma porta de entrada para casos de denúncias, realizadas pelas próprias vítimas. Também um fator alarmante, são os casos de violência em fase de processo que ficam sem resolução, por conta da morosidade do judiciário, mesmo esse tipo de processo tendo prioridade sobre todos os outros, levando o autor criminoso a reincidir e/ou permanecer impune”, ressalta.

SUBNOTIFICAÇÃO

Apesar dos índices alarmantes, o órgão ministerial reforça que a subnotificação pode esconder o agravamento da situação. De acordo com informações do Ministério da Saúde, entre 2011 e 2017, 70% das 527 mil pessoas estupradas no Brasil anualmente, em média, eram crianças e adolescentes. Além disso, 51% das que foram abusadas têm entre um e cinco anos.

Como explica o coordenador do Núcleo de Defesa da Infância e Juventude do Ministério Público Estadual (MPE-AL) o promotor Cláudio Malta, as estatísticas não correspondem ao que é vivenciado na realidade “Ainda precisamos alertar para o fato de que a subnotificação esconde os dados reais, uma vez que muitas vítimas, exatamente por serem crianças, não conseguem entender a gravidade do que está ocorrendo. É por isso que ações preventivas e combativas têm, necessariamente, que andar de mãos dadas. O silêncio, se não rompido, acaba se tornando cúmplice do crime”, reforça o promotor.

É possível identificar os sinais de abuso

Solange Guastaferro detalha que é possível identificar os sinais de abuso. Ela explica que toda criança que sofre uma situação assim passa por transformações no comportamento.
“A criança que é abusada, ela sempre vai mudar o comportamento, porque assim uma criança até cinco anos, seis anos ela entende que os adultos eles tem o poder sobre elas.

Então às vezes o adulto toca numa criança, abusa de uma criança, mas ela não sabe que aquilo é um abuso. O que vai acontecer é que ela vai mudar o comportamento dela. Assim vai demonstrar alguma coisa no comportamento. Às vezes a criança pode ficar mais retraída. Ela sabe que aquilo porque até pode machucar. Então assim, às vezes sofrem ameaças pra não falar. Que se falar alguma coisa vai acontecer e ela acaba ficando mais triste, não querendo brincar, não querendo estar com os adultos, fica com medo dos adultos. Então já são sinais que alguma coisa está errada”, expõe.

Prevenção contra atos começa pelo diálogo

A psicóloga infantil Solange Guastaferro destaca que a prevenção contra o abuso começa pelo diálogo dos pais e responsáveis com as crianças.

“Primeiro, essa questão sobre proteger as crianças e adolescentes desse tipo de abuso envolve sempre explicar desde cedo. Dar nome às partes genitais. Porque numa situação de abuso, a criança falando o nome correto é mais fácil para entender uma situação de abuso. Muitas vezes os pais ensinam a florzinha, o pipi, esse tipo de coisa que numa situação dessas se a criança fala que alguém tocou, que mexeu pode gerar dúvidas sobre o que ela estaria falando. Muitos pais também têm dificuldade às vezes de falar que ninguém pode mexer, que ninguém pode tocar e tudo isso se constitui como prevenção”, ressalta.

A psicológa salienta que é importante que os pais e responsáveis também estejam atentos aos conteúdos consumidos pelas crianças e adolescentes na internet seja em redes sociais, seja em jogos.

“Hoje em dia com as redes sociais, computador, celulares. Tem que estar sempre atento. Criança muito pequena não pode ficar sem supervisão, Porque eles digitam no celular e pode aparecer tudo. Então é muito perigoso essas questões com os eletrônicos, celular, tablet. Então não pode uma criança ficar sem supervisão. É preciso olhar o que essa criança está vendo no tablet, o que que essa criança tá pesquisando, né? Existem maneiras de proibir, por exemplo, o que eles usam no YouTube. Então precisa tomar muito cuidado e os adolescentes precisam também ser orientados, pegar o celular, monitorar, orientar. É melhor que eles saibam as coisas pelos pais”, enfatiza.