Cidades
Dois anos depois, nenhum dos 35 poços de sal foi totalmente tamponado
Braskem admite que atividades ainda estão em fase de conclusão; não foi informado prazo para término

Dois anos depois da decisão judicial que determinou medidas de fechamento de poços de sal-gema operados pela Braskem em Maceió, nenhum foi completamente tamponado. As informações são da própria empresa. Segundo a petroquímica, das 35 minas exploradas e que tiveram as atividades de extração paralisadas em maio de 2019, 5 estão em fase de conclusão de tamponamento e outras 2 em processo de preenchimento com areia. Não há informações de prazos reais para término dos trabalhos.
De acordo com informações da Braskem, dos 35 poços de sal, 17 serão tamponados, isto é, passarão por intervenções na superfície como selamento e pressurização. Ainda segundo a empresa, todas as minas estão sendo monitoradas.
“Dos 35 poços de sal, todos com atividades encerradas, 17 estão sendo tamponados (5 já em fase de conclusão); 4 serão preenchidos com areia (2 com processo já iniciado); e em 5 poços estão sendo realizados estudos para confirmação de preenchimento natural. Outros 9 estão em medidas de monitoramento. Todos os poços são permanentemente monitorados com instrumentos de alta tecnologia”, informou a Braskem.
Os bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange, Bom Parto e Farol têm sofrido as consequências do afundamento de solo causado pela mineração de sal-gema no subsolo da capital. Mais de 60 mil pessoas foram impactadas e os bairros parcial ou completamente esvaziados.
Em novembro de 2019, a Braskem apresentou os planos de fechamentos de todas as minas operadas pela empresa. Na época, o plano de trabalho da Braskem admitia desestabilização em 14 das 35 cavidades.
“O plano de fechamento das frentes de lavra em Maceió foi apresentado às autoridades públicas e aprovado pela Agência Nacional de Mineração. As ações de preenchimento com material sólido (areia) e de fechamento convencional (com tamponamento e consequente pressurização) foram definidas com base em recomendações de instituições independentes e especialistas de renome nacional e internacional e suas etapas vêm sendo compartilhadas, periodicamente, com a ANM. A prioridade da Braskem é a segurança dos moradores dos bairros atingidos pelo fenômeno geológico em Maceió, propondo e realizando ações com essa finalidade”, explicou a empresa em nota.
Quatro poços de sal-gema deverão ser preenchidos com areia para conter o processo de subsidência. O preenchimento foi uma das recomendações do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e do Instituto de Geomecânica de Leipzig.
A operação de preenchimento pode levar até dois anos para conclusão. Os vazios deverão ser preenchidos. Ao todo, a Braskem estima empregar R$ 1,2 bilhão para implementação das medidas previstas no plano de fechamento de mina originalmente proposto.
Causa de afundamento do solo foi apontada após mais de um ano de estudos
Após mais de um ano de estudos envolvendo cerca de 50 técnicos, o Serviço Geológico do Brasil apontou em maio de 2019 que a mineração operada pela Braskem foi a causa do afundamento de solo que atinge atualmente os bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange, Bom Parto e Farol. O relatório técnico classificou o processo como halocinese, isto é, uma alteração nas camadas de sal que ficam em profundidades entre 900m e 1.200m.
“O CPRM com base em todos os estudos chegou a conclusão que está havendo desestabilização das cavidades de sal-gema provocando halocinese (movimentação do sal) e criando uma situação dinâmica com reativação de estruturas geológicas antigas, subsidência (afundamento) do terreno e deformações rúpteis na superfície (trincas no solo e nas edificações) em parte dos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro”, informou o coordenador dos estudos e geólogo Thalles Sampaio à época.
Segundo o CPRM, o processo continua em atividade e não há indicativo de quanto tempo pode durar e se haverá estabilização. “Os dados interpretados em março de 2019 mostram que houve subsidência contínua e em aceleração; é possível observar deformação radial se espalhando do centro da área, onde atinge 40 centímetros de subsidência (afundamento) a partir das cavidades de extração de sal-gema localizadas à margem da Lagoa Mundaú”, apontou o relatório.
Em outras palavras, a extração de sal nas camadas profundas alterou o subsolo, reativando falhas geológicas e como resultado, os bairros estão em processo de subsidência ou afundamento.
“A equipe técnica analisou também dados de sonares que foram integrados com informações geológicas e de extração de sal em ambiente 3D. O resultado mostra que há indícios de que a atividade de extração de sal-gema alterou o estado de tensão in situ (natural ou normal) de todas as unidades geológicas, gerando colapso de algumas cavidades e aumentando a instabilidade das unidades”, conforme consta no relatório.
Os estudos do órgão federal apontaram que os poços explorados sofreram deformação, alteração de posicionamento e alguns poços se fundiram, foi o caso das minas M07, M18 e M19 que se fundiram, segundo o relatório. As minas M20 e M21 também viraram uma só.
Durante todo o período em que as rachaduras nos imóveis e vias começaram a se intensificar, os moradores relataram a percepção de pequenos tremores. Em fevereiro de 2019, uma estação sismográfica foi implantada em seis pontos do Pinheiro e os resultados obtidos comprovaram uma atividade sísmica “de baixa profundidade” e não compatível com placas tectônicas, isto é, não são terremotos comuns. A explicação para essa atividade e para o sismo registrado em março de 2018 é uma sequência de desabamento dos “tetos” das minas de sal.
Em edição publicada no mês passado, a Tribuna adiantou que o processo de subsidência pode se estender pelas próximas décadas. É o que afirma o ex-professor, pesquisador e especialista em geologia Abel Galindo que realiza análises nas regiões afetadas há cerca de dez anos - muito antes do tremor em 2018. Segundo ele, o fenômeno deve continuar avançando lentamente, principalmente na região do Mutange.
O problema que se arrasta há pouco mais de três anos, deve continuar evoluindo lentamente segundo Abel.
“O tempo para estabilização é mínimo de dez anos é o que muitos pesquisadores têm dito. Tem alguns até que chegam a falar em 20, 30 anos para estabilizar completamente. O risco de ruptura segundo o relatório italiano é de que ano que vem deve ocorrer alguma ruptura na região do Mutange, entre o IMA e o Bom Conselho, alguma ruptura de superfície entre maio e dezembro em dois ou três pontos. Já outros relatórios dizem que a probabilidade de ruptura da superfície é muito remota, ou pelo menos não antes de sete anos, caso aconteça”, pontua.
A evolução do afundamento deve alcançar nos próximos anos até 2 metros em alguns trechos, segundo Abel Galindo, além disso o estudioso não descarta a possibilidade de aberturas de solo em regiões já desocupadas como é o caso do Mutange.
Pesquisa vai traçar perfil das empresas que saíram da região
Um estudo deve mapear a situação de mais de 6 mil negócios que funcionavam nos bairros com afundamento de solo em Maceió. O levantamento pretende traçar um perfil da situação e saber de que forma a realocação afetou os empreendimentos.
O presidente da Associação dos Empreendedores do Pinheiro, Alexandre Sampaio, detalha que desde o início do problema, nenhum órgão ou entidade realizou mapeamento aprofundado sobre o real impacto do fenômeno no funcionamento das empresas.
“Nós vamos fazer uma pesquisa para entender como estão, para onde foram, se fecharam, se permaneceram abertas essas empresas para que a gente saiba como foi o processo de migração das 4.500 empresas formais e outras 1.500 informais que existiam nas regiões afetadas. Se estão satisfeitas, se foram indenizadas, se permanecem abertas, se mudaram de ramo, para entender e ter um diagnóstico sobre isso. Porque apenas 40% foi indenizada até agora. Também a gente pretende construir com o comitê de dano extrapatrimonial para que a gente realize um censo, uma pesquisa censitária para a gente saber o tamanho do problema e junto com os órgãos desenvolver políticas adequadas”, afirma o empresário.
Alexandre Sampaio avalia que só um estudo será possível identificar e traçar políticas públicas que atendam as empresas que deixaram a região.
“Sabemos que há um padrão para que as informações não cheguem, porque se as informações e os dados não foram coletados isso significa que não vai se saber onde está o problema e isto resulta em menos indenizações”, opina.
AUDIÊNCIA PÚBLICA
Na sexta-feira (1) uma audiência pública na Câmara Municipal de Maceió discutiu a situação das empresas que saíram dos bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange, Bom Parto e Farol.
Segundo Alexandre, esta é a primeira vez que a situação é discutida de forma específica e com a participação dos empreendedores. “É a primeira vez desde 2018 que alguém chama os empreendedores para negociar e dar os encaminhamentos. É uma audiência histórica porque todas as outras audiências nada foi encaminhado na prática, além da gente começar a ser ouvido, ouvir o drama e as proposições além de ter um lugar de fala, os resultados foram promissores. Esperamos agora que realmente seja concretizado aquilo que foi discutido.”
Dentre as demandas apresentadas na audiência, as principais envolvem discussões sobre concessão de isenções fiscais para as empresas afetadas. De acordo com o vereador Chico Filho (MDB), os trabalhos vão permitir uma presença maior do poder público na tomada de decisões do problema.
“Vamos criar uma comissão para acompanhar os trabalhos junto à Prefeitura de Maceió principalmente no que diz respeito à lei que trata das isenções no pagamento de impostos para aqueles comerciantes. Vamos trabalhar junto a Semec [Secretaria Municipal de Economia] para atualizar essa situação. Também vamos encaminhar documento à Braskem para que a empresa nos informe quais critérios técnicos e objetivos de forma clara para o cálculo das indenizações dos empresários, de toda a atividade comercial que está relacionada que deve ser levado em consideração na hora da proposta. Também vamos encaminhar ao presidente do poder legislativo municipal para que encaminhe ao poder judiciário solicitando esclarecimentos para que seja discutida a forma como estão sendo conduzido os acordos. Foram esses os principais encaminhamentos, além de iluminação pública e outras demandas”, destaca Chico Filho.
Para o empresário Alexandre Sampaio, a iniciativa é bem-vinda. “Avalio que, se não houver algo que nós não estejamos observando, foi extremamente positivo para que a gente construa soluções conjuntas junto ao governo, Prefeitura, Braskem, ministérios, porque não há justiça sem ouvir as vítimas e é preciso resolver esse problema”, finaliza.
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