Cidades

‘Extinção do DPVAT vai gerar impactos fiscais e econômicos’’

De acordo com o especialista em mobilidade urbana Renan Silva, medida é contraditória e vai sobrecarregar o SUS

Por Lucas França com Tribuna Independente 13/11/2019 08h56
‘Extinção do DPVAT vai gerar impactos fiscais e econômicos’’
Reprodução - Foto: Assessoria
O presidente da República, Jair Bolsonaro anunciou na segunda-feira (11) a extinção do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT). Segundo o governo, a medida foi recomendada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para evitar fraudes. A reportagem da Tribuna Independente conversou com especialista em trânsito e motoristas para saber o que acham da medida, e a maioria dos entrevistados discorda da decisão. Para o arquiteto e urbanista especialista em mobilidade urbana e trânsito Renan Silva, o modelo de mobilidade focado nos automóveis gera muitos impactos socioeconômicos e o seguro é uma forma de compensar minimamente as externalidades negativas. “Elas precisam ser assumidas pelo o ente que o gera. Então, 45% da arrecadação vão para o SUS [Sistema Único de Saúde], esse valor anunciado justamente vai para o sistema, e sai do financiamento dos proprietários de veículos como forma de compensar essas negativas. Se o seguro deixar de existir esses recursos destinados ao SUS vão sair de onde?’’, questiona. [caption id="attachment_339391" align="alignleft" width="243"] Renan Silva[/caption] Silva diz que quando analisado o contexto que o país vive, de recessão econômica, ajuste fiscal, reforma da Previdência e demais ações que buscam economizar dinheiro para oxigenar a economia, é contraditório ter a extinção de um seguro que gera muito dinheiro para o SUS custear acidentados. “Todo esse volume de recursos vai vir de onde? Quem vai financiar se não for o dono do Veículo? O maior impacto vai ser fiscal e econômico por falta de arrecadação, já que vamos ter um subsídio aos donos de veículos. Vale ressaltar que o valor que vai deixar de ser arrecadado vai ser uma sobrecarga ainda maior para o SUS - o que mais absolve os acidentados no trânsito”. CONDUTORES “Já recebi e, mesmo assim, ainda passei aperto. Acho que fortalecer a fiscalização para evitar os acidentes faria a diferença. E não extinguir o seguro”, disse o condutor Sandro Monteiro. “Só quem sabe é quem já precisou. Muito fácil julgar quem nunca precisou. Ou quem tinha recursos para não ir atrás do DPVAT. Isso não é esmola do governo, é algo que já é pago por nós. É uma obrigação e não uma ajuda. Sendo pouco ou muito você pode precisar um dia e agora não terá mais esse retorno de investimento”, ressalta Samara Abreu Mendes. “Eu sofri um acidente, cheguei a fraturar o fêmur e com menos de três meses consegui sacar 4.700 do DPVAT. Estava com os documentos em mãos e não foi um bicho de sete cabeças. Nem de advogado precisa para dá entrada no seguro’’, pontua Anilson Santos. Já o condutor Ronaldo Homero acha a extinção uma forma de minimizar as fraudes. “O desvio desse seguro é absurdo. Toda dificuldade criada é para quê quem tem direito desista. Vários políticos ligados a seguradoras e esse é o grande problema. O governo depois de derrubar esse meio de vida de muitos políticos, com certeza ele irá fazer algo para compensar e com fiscalização e longe das mãos dos bandidos’’. A medida provisória nº 904 foi publicada ontem (12) no Diário Oficial da União. Entre as justificativas do governo, a extinção seria para evitar fraudes. Segundo o governo, em 2018 à arrecadação bruta com o seguro DPVAT alcançou R$ 4,7 bilhões. Em 2016, o tribunal verificou que o cálculo do prêmio do DPVAT incorporou, entre 2008 e 2012, despesas irregulares de aproximadamente R$ 440 milhões, o que tornou o prêmio mais caro para os proprietários de veículos. Acidentes ocorridos até 31 de dezembro continuarão cobertos   A mudança começa a valer a partir do primeiro dia de 2020. No entanto, conforme a medida provisória, os acidentes ocorridos até 31 de dezembro deste ano continuarão cobertos pelo DPVAT. A Seguradora Líder, gestora do seguro obrigatório, permanecerá responsável pelos procedimentos de cobertura dos sinistros ocorridos até 31 de dezembro de 2025. Após essa data, a responsabilidade passará a ser da União. De acordo com o governo, a extinção do DPVAT não vai desamparar os cidadãos em caso de acidentes, já que o SUS presta atendimento gratuito e universal na rede pública. A reportagem tentou contato com a seguradora Líder sobre o assunto mais até o fechamento da edição não obteve retorno. O SEGURO Conhecido como “seguro obrigatório”, o Seguro DPVAT cobre casos de morte, invalidez permanente ou despesas com assistências médica e suplementares por lesões de menor gravidade causadas por acidentes de trânsito em todo o território nacional. Instituído por lei em 1974, o pagamento era anual e obrigatório para todos os proprietários de veículos e era feito junto com o IPVA. O seguro era um requisito para o motorista conseguir renovar o licenciamento do veículo. Tem direito ao DPVAT familiares ou herdeiros legais, no caso de morte com o valor da indenização de R$ 13.500 por acidentado, invalidez permanente (somente o próprio acidentado pode receber), o valor neste caso é de R$ 13.500 e despesas médico-hospitalares - somente o próprio acidentado recebe até R$ 2.700. Com a proposta de centralização de gestão envolvendo o atendimento ao usuário, além de representações nas esferas administrativa e jurídica, em 2007 foi criada a Seguradora Líder, que administra o DPVAT. Assim como as demais seguradoras particulares, a Líder é fiscalizada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Economia. DPEM A medida provisória também extingue o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Embarcações ou por sua Carga (DPEM), que dá cobertura a vítimas de acidentes com embarcações. Segundo o ministério, esse seguro está inoperante desde 2016.