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DPU defende mulheres vítimas de violência doméstica acusadas de subtração internacional de crianças

As alegações da Defensoria revelam a necessidade de uma interpretação mais adequada da Convenção de Haia, no interesse das vítimas

Por DPU 14/11/2024 14h00
DPU defende mulheres vítimas de violência doméstica acusadas de subtração internacional de crianças
Convenção de Haia considera que a subtração internacional de crianças acontece quando um dos genitores tira o menor do seu país de residência habitual sem autorização do outro genitor - Foto: Freepik

A Defensoria Pública da União (DPU) defendeu, nesta quarta-feira (13), no Congresso Nacional, mulheres vítimas de violência doméstica acusadas de subtração internacional. Em duas audiências públicas, realizadas no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, a defensora pública federal Daniela Brauner falou sobre a aplicação da Convenção de Haia sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças em casos em que mães brasileiras retornam ao país com seus filhos após sofrerem violência doméstica.

No Senado, Brauner destacou que é urgente considerar que essas mulheres são vítimas, e não sequestradoras. Isso porque, a Convenção de Haia considera que a subtração internacional de crianças acontece quando um dos genitores tira o menor do seu país de residência habitual sem autorização do outro genitor ou de pessoa que seja codetentora do direito de guarda.

No entanto a Convenção, firmada em 1980, não leva em conta casos em que as mães retornam ao seu país de origem por sofrerem violência doméstica dos genitores de seus filhos. Para a defensora, é necessária a criação de medidas de salvaguarda para que os termos do dispositivo afastem a possibilidade de separação permanente da criança com a mãe, comumente a principal cuidadora da criança.

“Não há como decidir a respeito do melhor interesse da criança sem considerar os laços envolvidos na relação mãe e filho ou filha. Qualquer decisão que possa implicar o afastamento definitivo ou duradouro do convívio entre mãe e filho ou filha acaba por infringir o princípio da prioridade e melhor interesse da criança”, disse, complementando. “Assim, nem sempre o retorno imediato representa o sucesso na aplicação da Convenção de Haia, pois pode desconsiderar aspectos relevantes do desenvolvimento da criança”.

Mães de Haia


Na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, da Câmara dos Deputados, a defensora pública federal Daniela Brauner voltou a defender uma interpretação mais adequada à realidade brasileira nos casos em que filhos são retirados de suas mães, mesmo após a comprovação de que ela saiu do país do genitor após sofrer violência doméstica. “Precisamos levar essa interpretação, que é uma interpretação brasileira, para os fóruns internacionais de discussão da Convenção de Haia. Especialmente o entendimento de que aplicar a convenção também é aplicar no artigo nº 13 o não retorno das crianças em algumas situações”, explicou.

A audiência contou, também, com o relato emocionado e desesperado de uma mãe que perdeu a guarda de duas filhas pequenas após fugir do país do genitor das crianças. Raquel Cantarelle é mãe de duas meninas, de 4 e 6 anos. Mesmo após comprovar que sofria violência no país do então marido, as crianças foram enviadas pelo estado brasileiro aos cuidados do pai, na Irlanda.

A DPU atua no caso perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos por violações do Estado Brasileiro contra a mulher e suas filhas. Segundo Cantarelle, as crianças foram levadas por policiais brasileiros, armados, numa cena de muitos gritos e choros das crianças.

“Não podemos ignorar que, no caso de mães e crianças em perigo, o retorno ao país de origem pode significar a perpetuação de abusos e violação de direitos humanos. O meu apelo é para que olhem para o meu caso e para tantos outros com atenção e empatia. Eu peço que reconsiderem a forma como aplicamos essa convenção em nosso país, garantindo que exceções, como a prevista no Artigo nº 13, sejam analisadas com a devida seriedade e que cada decisão judicial seja uma decisão humana que proteja quem mais precisa, que são as crianças”, pediu Cantarelle.

Luta da DPU


Em nota técnica, emitida por meio do Grupo de Trabalho Mulheres da DPU, a instituição recomenda que, no caso de uma acusação de sequestro internacional de crianças, as seguintes medidas de salvaguarda sejam consideradas:

- Ocorrência de violência doméstica a saber: violência física, violência psicológica, violência sexual, violência patrimonial e violência moral,

- Examinar se, no país de residência habitual, é crime a subtração internacional de crianças;

- Observar se há regras que assegurem o status migratório seguro para a genitora para regressar ao país de origem;

- Analisar se há garantia de efetivo acesso à Justiça para a genitora, considerando especialmente os custos envolvidos no processo judicial de guarda e acesso à assistência judiciária gratuita, consultando qual seria a autoridade judicial competente;

- Determinar o retorno acompanhado da mãe/genitor que for o principal cuidador da criança, evitando rompimento bruscos;

- Se não for possível determinar o retorno com a mãe, assegurar por parte do outro genitor que há anuência em garantir o convívio com a mãe, estabelecendo cronograma de visitação até a decisão da autoridade judicial local.