Enio Lins
Além da extrema-direita brasileira: sempre é tempo de quebrar o silêncio

QUATRO DE ABRIL. Na toada de avaliar os anos 60, pela necessidade cidadã de descer a madeira com mais força no golpe de 64 (por conta do ressurgimento do ímpeto golpista, atualmente em julgamento no STF), topei com dois acontecidos nos Estados Unidos, neste dia e mês, em 1967 e 1968, que valem a pena relembrar em suas lições, indeléveis, ensinando a quem queira aprender. Falo sobre Martin Luther King Jr.
VISITAR OS ACONTECIMENTOS no exterior nos ajuda a compreender a conjuntura mundial numa época dada e suas repercussões em cada país. Nos dias em curso, não se pode entender adequadamente a tendência criminosa do bolsonarismo sem prestar a devida atenção às atitudes de Trump e sua trupe. As tentativas de golpe, por exemplo, lá e cá, foram organizadas com motivações e datas semelhantes, ambas visando subverter derrotas eleitorais – nos Estados Unidos, a invasão do Capitólio foi em janeiro de 2021, dia 6; no Brasil, o golpe implodiu-se em janeiro de 2023, no dia 8. Lá, a conivência do poder judiciário garantiu a Donald & gang impunidade suficiente para a reconquista da Casa Branca e retomada do processo de bagunça geral e global; aqui, a firmeza do Supremo Tribunal Federal tem chamado o feito à ordem e enquadrado os criminosos em seu devido lugar. Ponto para o Brasil: uma lição foi aprendida.
EM 4/4/1967, Martin Luther King Jr. pronunciou nos salões da Igreja Riverside, em Nova Iorque, o discurso “Beyond Vietnam: A Time to Break Silence”, título que o tradutor Google converte para “Além do Vietname: Um Tempo para Quebrar o Silêncio”, achando que escrevemos no português de Portugal, mas ficou legal. Com aquela fala, o grande líder negro americano acrescentou mais um item explosivo à sua explosiva pauta de luta pelos direitos civis, expondo-se mais ao ódio da extrema-direita estadunidense. Na fala, trechos fortes: “Estávamos pegando os jovens negros que tinham sido aleijados por nossa sociedade e enviando-os a oito mil milhas de distância para garantir liberdades no Sudeste Asiático que eles não tinham encontrado no sudoeste da Geórgia e no East Harlem. E assim fomos repetidamente confrontados com a cruel ironia de assistir meninos negros e brancos nas telas de TV enquanto matam e morrem juntos por uma nação que não foi capaz de colocá-los juntos nas mesmas escolas”.
EM 4/4/1968, Martin Luther King Jr. foi assassinado. Exatamente um ano depois do pronunciamento na Igreja Riverside, ele recebeu um tiro na nuca, disparado à longa distância, quando relaxava na varanda do hotel onde estava hospedado, na cidade de Memphis, no Tennessee. Um dia antes havia discursado na Igreja de Deus com Cristo: “E então cheguei a Memphis. E alguns começaram a falar sobre as ameaças, ou falar sobre as ameaças externas. O que aconteceria comigo diante do perigo de alguns brancos doentes mentalmente? Bem, eu não sei o que acontecerá. Nós tivemos alguns dias difíceis pela frente. Mas não me importo com isso agora. Porque eu estive no topo da montanha. E eu não dou a mínima. Como qualquer um, eu gostaria de viver uma vida longa. A longevidade tem seu lugar. Mas eu não estou preocupado com isto agora”.
VIVA MARTIN LUTHER KING JR! Mas a hora é agora para nos importar com a realidade de nosso país e nosso povo. Tivemos, temos e teremos dias difíceis pela frente. Agora é o momento de reafirmar e consolidar a Democracia brasileira, cujos riscos retrocederam para os perigos golpistas dos idos de 64. Daí, todo apoio ao Supremo Tribunal Federal no julgamento dos líderes golpistas de 8 de janeiro de 2023. As forças democráticas não podem deixar-se isolar. Disso depende a longevidade do Estado Democrático de Direito em nosso país – pois seguem postados, à nossa nuca, atiradores nada esportivos.

Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.