Enio Lins

Migrantes: um drama humano que já foi sinônimo de sucesso

Enio Lins 25 de outubro de 2024

Tema recorrente de Trump em suas campanhas eleitorais, a migração é uma tragédia contemporânea cuja dramaticidade não se pode ignorar. Donald, em sua peroração eleitoral (pela terceira vez) busca votos do vasto segmento anti-imigração com um discurso de ódio, racista, tipo Ku Klux Klan. E, ninguém se iluda, encontra eco em imigrantes que se consideram, ou querem se sentir, seguros nos Estados Unidos – através da adesão e colaboração com o inimigo autodenominado “nativo”.

SOLUÇÃO E PROBLEMA

Migrar é uma característica de quase todas as espécies, inclusive a humana. É consenso, há muito tempo, sobre as incríveis andanças dos Homo Sapiens, aparecidos na África, há 300 mil anos, e que de lá emigraram para ganhar o mundo. E os humanos modernos não se aquietam parados no mesmo campo por muito tempo, e botam pra andar. Nem sempre pacificamente. É andando e matando, como não cantam as canções. A migração foi uma solução desde tempos imemoriais, com a descoberta e exploração de novos territórios, garantindo a sobrevivência, espalhando e perpetuando a nossa espécie, mas... Esse benefício migratório carregou consigo vários malefícios. Os aclamados livros “Armas, Germes e Aço”, de Jared Diamond; e “Sapiens”, de Yuval Harari, apresentam fatos amplamente comprovados, evidências e suspeitas da ação destruidora dos humanos em suas peregrinações, seja contra seus semelhantes, seja contra praticamente todos os demais seres vivos. Nunca foi simples nem angelical a migração humana. E hoje segue sendo, cada dia mais, mais problema que solução – e caldo de cultura para todo tipo de desumanidade.

QUADRO AMERICANO

É a migração contemporânea um desafio que tem provocado respostas racistas e autoritárias, diferenciando migrantes entre “do bem” e “do mal”. Há muito tempo, os suprematistas americanos usam o filtro WASP (sigla em inglês para branco, anglo-saxão e protestante) para distinguir quem é bem-vindo ou não. Mas a porteira originalmente aberta para os povos brancos de origem germânica/britânica e evangélicos sempre deixou algumas brechas para judeus de origem europeia e para muçulmanos com dinheiro no bolso. Assim, a régua do racismo norte-americano distingue Donald Trump (filho de uma migrante escocesa) de Kamala Harris (filha de uma migrante indiana e, ainda por cima, de pai negro e jamaicano). Para o suprematismo, ele é do bem, ela é do mal. Ele capricha em maldades para confirmar e ampliar sua força branca, e ela tem de se virar em mil para compensar a “mancha” racial. Mas, em termos geográficos americanos, ambos são filho e filha de ventres estrangeiros.

DRAMA CRESCENTE

É problema, sim, a onda migratória para os Estados Unidos. É um dilema alimentado pela própria propaganda estadunidense (histórica e enganosa) como a “terra da liberdade e da oportunidade” e pelas consequências de sua política imperialista, expressas aqui nos compromissos – involuntários – com as populações desalojadas por suas permanentes guerras impostas ao resto do planeta. Essa multidão de refugiados, em verdade, é o maior, mais urgente, e mais dramático problema para o qual os Estados Unidos não têm propostas adequadas. E não está sendo abordado eleitoralmente. Por exemplo: onde abrigar os milhões de palestinos expulsos de suas terras pelo apoio irrestrito dos norte-americanos aos israelenses? Tanto Donald Trump quanto Kamala Harris passam ao largo dessa dívida real, tragicamente americana, contraída frente a todas as populações desalojadas por culpa das iniciativas geopolíticas da Casa Branca.