Enio Lins
Investindo na despolitização e minando a democracia
Hoje está marcado mais um debate na guerra pela prefeitura de São Paulo. Como tudo que acontece na maior cidade do Brasil é da conta do resto do país, as atenções estarão voltadas para o pega-pega das 11:15 desta sexta-feira. É provável você ler estas maltraçadas linhas depois da madeira rolar. Lendo antes, faça sua aposta!
RINHADEIRO
Rinhadeiros são locais onde ocorrem as rinhas, sinônimo de “lutas”. Ambientes de violência programada para o deleite de uma assistência e lugar próprio para o exercício do vício das apostas. Nesse tipo de arena (fora-da-lei desde 1934) colocam-se galos, passarinhos e cães para se esbagaçarem, sangrarem até a morte. São esses espaços uma versão reduzida, em escala desumana, dos horrores e prazeres mórbidos das arenas romanas onde homens e animais mutilavam-se e matavam-se para o deleite de multidões, em espetáculos de entretenimento que eram metade da fórmula “pão e circo”. Receita infalível, desde antes dos Césares, para manter uma população distanciada da politização e submissa ao sistema. Os debates eleitorais, bato novamente na mesma tecla, viraram meras rinhas, circos onde o bizarro é o foco das atenções, e não o debate político.
DESPOLITIZAÇÃO
Vive São Paulo um embate político fundamental para o Brasil. Ali, na mais importante metrópole da América Latina (desculpem-me a Cidade do México e Buenos Ayres, mas podem pedir direto de resposta), mantêm-se polarizada a dicotomia entre a democracia e o gangsterismo. Com a particularidade de que – considerando apenas as três candidaturas com chances reais de vitória – o bolsonarismo, a antidemocracia, conta com 44% das intenções de voto, e a democracia real pontua meros 23%. A desproporção é tal que os golpistas se deram ao luxo de dividirem-se em duas postulações: uma sem maquiagem, apresentada pelo PRTB, estupidamente marginal, contando com 20% de manifestações de voto; outra, maquiada pelo MDB, com a vantagem de postular à reeleição, com 24%. A candidatura do PSOL, das três com viabilidade efetiva, conta com 23%. Matematicamente, sobram 33% dos votos paulistanos para oscilar e mudar essa tendência. São dados da pesquisa Quaest mais recente. Este é o nó górdio na pauliceia desvairada, onde o bolsonarismo (sinônimo exato de golpismo e gangsterismo político) procura manter seu poder. Isto não será debatido hoje, como não foi a tônica nos debates anteriores.
PROPOSTAS
Do ponto de vista civilizatório, os temas mais relevantes são: no geral, e central, o alinhamento ou não às causas democráticas e sociais; e, no específico, uma urbe humanizada, em processo de regeneração ecológica, ampliação de espaços interativos, respeito a pedestre e ciclistas, inserção social urbana, combate à violência, transporte público de qualidade, educação, arte e cultura para todo mundo. Esquerda e direita têm posicionamentos antagônicos sobre esses itens (e outros), e aqui ouso focar pela visão canhota, cabendo à turma destra fazer sua defesa. Temas como esses – que interessam a todo Brasil – serão o centro no debate de hoje? Ah, sim: os dois candidatos que se agrediram antes, do PRTB e do PSDB, o cadeirado e o cadeirador, estarão pertinho, um ao alcance do outro, separados apenas pelo candidato do PSOL (!). Onde se viu isso? Além disso, foram aumentados os tempos para réplica e tréplica, em incentivo ao bate-boca. De repente, o improvável acontece e ninguém pisa na goela de ninguém, amém – mas a rinha está montada. É o investimento reforçado na despolitização, em benefício do jogo da direita. Façam suas apostas até às 11:15 de hoje. Amanhã será outro dia.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.