Petrucia Camelo

PATERNIDADE

Petrucia Camelo 12 de agosto de 2024

A árvore, auxiliada pelo vento, pelos pássaros e demais animais silvestres, como se tivesse certeza da preservação de sua espécie, leva longe as suas sementes, que, encontrando terra fértil logo germinam e incontáveis novas árvores repetem o singular ciclo de vida contida em cada semente. No entanto, no reino animal, coube a reprodução: a concepção no enlace de gêneros diferentes, e o ser a sua sobrevivência, de imediato carece de cuidados e de proteção.

A lei da sobrevivência é clara, própria e precisa a natureza de cada espécie; porém, a humana é a mais complexa; não vinga ao ser exposta ao rebuliço do acaso, do abandono, à deriva do vento, das águas, ao Deus dará; para sobreviver, o ser humano carece de cuidados e de proteção especial, e dentre outros fatores determinantes para a sua sobrevivência tem que contar com as condições propícias para suprir as suas necessidades básicas.

Logo ao nascer tem-se que enfrentar às dificuldades, dentre outras, as doenças hereditárias ou adquiridas, tratando-se de um ser extremamente sensível a tudo o que lhe é circundante, o meio cultural, enfim o ambiente familiar onde vive influencia sobremaneira, de forma direta, no equilíbrio do seu desenvolvimento.

Os papéis que os indivíduos exercem no núcleo familiar, se forem desenvolvidos com a consciência de suas responsabilidades, servirão de base para o crescimento sadio e equilibrado do novo ser; caso contrário, ele levará para toda a vida o desequilíbrio das implicações próprias a cada caso. Nunca se habituará a elas; sempre lhe serão causas de sofrimento.

Particularizando os sentimentos que movem o núcleo familiar, vê-se a paternidade, aferida ao gênero masculino, embora hoje, na sociedade moderna, esteja também conferida ao papel da mãe, que pela ausência da figura paterna exerce os dois papéis, gerando uma situação incompreensível, inaceitável, difícil mesmo, com repercussão muitas vezes desastrosa na formação dos filhos pela falta do referencial “Pai”.

No sentido do agir, da companhia, da orientação, da segurança, da manutenção econômica e do bom relacionamento familiar, somente é pertinente à figura paterna e nessa falta, somada às demais perdas existentes desde a ruptura do cordão umbilical, seguida do desmame, do desligamento do ambiente familiar para ir à escola, e assim por diante, “...ele vage seu pesado desamparo...“ (Dolto, Françoise, Solidão, 1998).

O ser humano em formação por muito tempo tem a sua vida sob os cuidados dos pais, e a imagem paterna o auxiliará a buscar lá fora, no futuro, o seu próprio poder de realização; a ausência desse aprendizado dificultará a ele encontrar o seu verdadeiro caminho, além de perda de tempo a procurar meios que preencham semelhante vazio, pois há essa lacuna no registro da memória herdada que o auxiliaria em tão difícil tarefa. Sentir-se-á só e desamparado e muitas vezes será presa fácil em mãos desalmadas.

A vida corre livremente, mas não é como um cavalo selado ao passar por perto; para domá-lo e segurar-se em sua crina para montá-lo, tem-se que ter coragem, preparo, persistência, pois há sempre um poço de águas profundas e tenebrosas, um deserto de areias movediças e outras escaldantes que obrigam a refazer os caminhos em volta.

Para se almejar alcançar a plenitude da vida precisa-se nas demais vezes deixar-se arrastar, como faz o brilhante em meio ao cascalho, que se serve das intempéries para apresentar o seu brilho, e a sua qualidade nas mãos do ourives. É o ser humano dotado de um corpo composto de emoções, vontade, disciplina, inteligência. Não deve omitir-se de salvaguardar aquele que é originário de sua genética, de seu próprio sangue, de ministrar as sutilezas de seu ofício a sua cria, de estar pronto e próximo a auxiliá-lo na difícil tarefa de se desenvolver a contento dos padrões éticos e morais. De ajudá-lo a ser feliz.