Petrucia Camelo

INVERNO: FLOR SEM NOME

Petrucia Camelo 01 de agosto de 2024

No inverno, o céu se apresenta como se tivesse sido lavado, e o sol parece não sustentar os raios, esmorecendo a luz que faz a peculiaridade da criação divina. No entanto, esse comportamento astral oportuniza a eclosão de espécies vegetais de natureza simples, como a flor diminuta e sazonal, que surge no inverno como se fosse rainha a desfilar sobre tapetes aos borbotões, aureolando o caminho e longe de ser insignificante, com a aparente simplicidade fisionômica que lhe é peculiar, marca o caminho, chamando a atenção dos transeuntes.

A flor sempre é o que o sol lhe impõe, como um dos componentes que faz a diversificação de sua coloração; mas a flor que brota no inverno, pequenina e rasteira, de natureza comum e comportamento simples, é exemplar, com a sua presença desprovida de “glamour”, não chama a atenção, como sempre acontece com as demais espécies florais, talvez porque ela porta discrição, e não elegância.

Talvez, a simplicidade dessa flor sem nome seja a condição exigida para que essa espécie possa florescer e sobreviver, dando realce ao lado áspero da vida a surgir e ressurgir sobre paus e pedras, até beirando córregos pútridos de aparência grotesca e desprezível, adornando-os, talvez deva-se dizer que é uma flor do submundo em meio a escombros.

Essa pequenina flor, trazida pelas mãos da chuva de inverno e do vento, demonstra resistência, em meio ao mato comum e à terra molhada; sobrevive às intempéries e, na passagem, cinza de inverno, gratifica o olhar, mesmo que seja por segundos. A cada estação das chuvas, essa flor sem nenhuma notoriedade eclode a mesma de sempre, como se a terra não permitisse que todas as formas de vida guardadas no segredo de suas entranhas sofressem mutações.

A persistência dessa pequenina flor silvestre em brotar da terra e permanecer viva a cada inverno, às vezes beirando o estreito caminho do mato comum, em meio às cores da paisagem, ou mesmo ecloda salpicada rasteiramente atapetando o matagal, ou ainda, em meio ao capim alto que a protege dos raios mornos de sol, ou ainda mais, a surgir uma por vez, solitária em terrenos baldios, confirma a falta do medo de não vingar. Sua presença frágil testemunha a criatividade e a providência de Deus.

No entanto, dada à fragilidade e à simplicidade de sua natureza, a flor sem nome não desperta interesses em sua colheita, nem para ornamentar um chapéu, nem para apresentar um jarro em flor, e, muito menos, para ornamentação de grandes salões de festas; observa-se, ainda, que não é cultivável, e não se sabe de pesquisas sobre o seu modo vivente.

Talvez na teoria encontre a prática dos segredos de sua utilidade. Enquanto o mundo gira em busca de novas descobertas, em sua sapiência, a flor sem nome brota trazida pelas mãos frias do inverno e vive a vida no seu mundo particular na relva molhada, cumprindo a parte que lhe cabe.

Onde se esconderá essa flor pequenina, após o inverno? Quando o sol abrasa a terra, tornando-a seca e árida, dando vez a outras espécies florais de maior beleza, por certo suas raízes se recolherão às entranhas da terra, em respeito às dificuldades do ambiente, aguardando um novo período invernoso, onde pode encontrar os recursos necessários à subsistência do seu fazer presente.