Enio Lins
Bora incentivar, com uma grana mais generosa, além do audiovisual?
Ontem, aqui aplaudimos a liberação adicional de R$ 1,6 bilhão para o segmento audiovisual pelo governo federal. Hoje é hora de reivindicar recursos para as demais áreas da cultura, e cobrar um melhor equilíbrio na partilha setorial do montante investido anualmente em Cultura. Afinal, nem tudo é cinema no mundo arte.
PARA REFLETIR
Sem usar agora muitos números, percentuais ou demais artes métricas, vamos a umas reflexões. Inexiste dinheiro suficiente para atender todas as demandas consideradas justas, mesmo com a retomada do crescimento econômico no Brasil depois do período das trevas entre 2016 e 2022. Lula recebeu um país derrubado da sétima para a 11ª posição entre as maiores economias do mundo, e já subimos de volta para a 9ª, com avaliação do FMI para retomar a 8º lugar neste ano. Isso apesar do boicote de um Banco Central dependente e subserviente aos oligopólios banqueiros. Mas, como as necessidades são imensas, esses avanços não têm como responder a tudo que os segmentos necessitados fazem jus. Dividir melhor é a bandeira de hoje, e de amanhã e de depois.
PRIVILÉGIOS?
É pública e notória a grita, há muitas décadas, contra um suposto privilégio do audiovisual no acesso às verbas. Esse ruído antecede à criação da Ancine (Agência Nacional do Cinema) em 2001, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. A Ancine era a entidade estatal destinada a dar seguimento às funções de fomento da finada Embrafilme, fundada em 1969 pelo Regime Militar e extinta pelo presidente Fernando Collor, em 1990. Fosse sob ditadura ou sob o manto sagrado da Democracia, o pecado da bonomia estatal para com o cinema é voz corrente. Em benefício da arte cinematográfica se apresentam fatos como a alta oferta de emprego (mesmo temporários) e alta capacidade de geração de renda (muitos filmes conseguem bilheterias rechonchudas) – existem outros produtos culturais com vantagens lucrativas, mas a maioria precisa desesperadamente de uma cota maior de ração para seguir apenas existindo, como aqueles tidos como “saberes populares”.
TEMA CARO
É fácil encontrar dados na internet sobre os investimentos públicos feitos no audiovisual e seus retornos. Se for do tempo do período 1969/1992, basta buscar “Embrafilme” e a pesquisa pipoca pronta. Coisa boa. Mas e sobre as demais artes? Não é tão fácil e nalgumas áreas é impossível pescar algo de sustança. Coisa ruim. Precisamos de novas propostas para o partilhamento das verbas para uma maior diversidade no incentivo. Literatura, por exemplo: é urgente uma política inovadora de subvenção num momento cruel onde as livrarias somem das ruas de uma hora para outra, e o preço de produção da obra (impressa ou digital) fica cada dia mais proibitivo. Ah, “tem a Lei Rouanet” (criada por Collor, em 1991), poder-se-ia responder. Sim, existe e é ainda muito importante – se não fosse não despertaria o ódio rabugento dos ruminantes bolsonaristas –, mas se tornou limitada e o Sudeste sempre teve melhores condições fiscais para viabilizar as captações autorizadas, enquanto os projetos aprovados para endereços no Nordeste penam para encontrar, e dificilmente localizam, empresas aptas para a parceria nos marcos da lei. Imaginem se a maravilhosa Banda de Pífanos Esquenta-Muié, de Marechal Deodoro/AL, teria, tem ou terá chances no atual modelo da Rouanet.
É sobre isso que precisamos falar mais: mais proporcionalidade entre artes e segmentos nas verbas federais para a Cultura.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.