Enio Lins

Em defesa radical dos direitos das mulheres

Enio Lins 19 de junho de 2024

Cíntia Ribeiro, jornalista e feminista-raiz, gentilmente acudiu com informações e fotos sobre o ato contra o infame PL Estuprador realizado ontem, em Maceió. A manifestação faz parte do circuito de lutas contra essa indignidade cujo processo de votação foi apressado numa sacanagem adicional, mas que causou efeito contrário ao desejado. No relato resumido, ela destacou a importância da fala de uma pastora evangélica.

CONTRA OS ESTEREÓTIPOS

Pelo fato do deputado propositor do PL Estuprador ser pastor evangélico e a dita bancada evangélica-bolsonarista apoiar esse projeto de lei é fácil se cair no erro de supor que toda pessoa evangélica comunga de tal ideia. Conclusão que leva ao falso entendimento dessa aberração como “questão religiosa”, o que só ajuda a extrema-direita, cujo principal desejo é uma “guerra religiosa” capaz de turvar o bom-senso geral. Mas, parlamentares como o Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) e o Padre João (PT-MG) pronunciaram-se, firmemente, desde o início, contra essa ignomínia.

PASTORA CONTRA OS LOBOS

Odja Barros, a pastora que discursou no ato de ontem, é teóloga e integrante da Igreja Batista do Pinheiro, possui histórico de posicionamentos corajosos ao lado de minorias e grupos de vulneráveis. Destaque nacional no @uolnoticias, em reportagem do bravo Carlos Madeiro, sua declaração de que “o Projeto de Lei 1904/2024 usa indevidamente o nome de Deus por homens para manter as mulheres sob domínio” foi reproduzida Brasil afora. Ameaçada várias vezes pelos lobos de plantão, por outros atos de coragem como abençoar casamentos entre pessoas do mesmo gênero, ela merece todo destaque na imprensa e mais esse modesto registro.

USANDO A RELIGIÃO

É verdade que a questão do aborto, ao longo de séculos, foi usada no formato de condenação religiosa para restringir a liberdade feminina e cassar o direito da mulher sobre seu próprio corpo, na visão de que o fruto de seu ventre era, em primeiro lugar, propriedade do homem, afinal o marido era o proprietário da esposa (ou das esposas) e a filharada era patrimônio privado masculino. Frustrar uma gravidez era privar o dono de mais um bem. Na modernidade, a Igreja Católica foi a principal difusora do anátema contra o aborto, e isso só iria mudar no final do século XX, quando grupos evangélicos americanos assumiram a vanguarda do atraso nas campanhas contra a interrupção da gravidez.

A MÍDIA E AS MASSAS

Essa histeria antiaborto é coisa recente, conforme a BBC destrincha na reportagem “Como filme dos anos 1970 fez evangélicos se posicionarem contra o aborto”, publicada em 2022: “o aborto — hoje central na pauta das guerras culturais americanas — por muitos anos foi um assunto completamente ignorado por evangélicos. Isso só mudou nos anos 1970, depois do lançamento de um documentário feito por um carismático líder evangélico americano [Francis Schaeffer], cuja pregação introduziu o tema na pauta política”. A força da mídia contemporânea transformou esse tema, antes secundário, em produto de consumo de massas, e extremamente rentável para as forças conservadoras, gerando dinheiro e poder. Não é fato isolado o PL Estuprador, portanto.

Parabéns por ontem, e que venham novos protestos amanhã e sempre. A luta será longa e precisa expressar a grandeza e amplitude da defesa dos direitos das mulheres, incluindo gente de todas as opções de pensamento e de crenças, e não apenas militantes de carteirinha (sempre indispensáveis).