Enio Lins
Uma intelectual que foi pura fortaleza, com certeza
Maria da Conceição de Almeida Tavares nasceu em Anadia – não na Zona da Mata alagoana, e sim no centro-noroeste de Portugal, entre Aveiro e Coimbra. Graduou-se em Matemática pela Universidade de Lisboa em 1953, aos 23 anos. Revoltada com o regime fascista de Salazar, mudou-se para o Brasil, aonde chegou no meio do Carnaval de 1954 e aqui tornou-se a porta-bandeira da Economia com inclusão social. 70 anos depois de sua chegada, nas vésperas das festas juninas, aqui morreu. Cá fez história.
INJUSTIÇA À VISTA!
Relata o interpretesdobrasil.com.br, com palavras dela própria: “Quando saí de Portugal, os problemas lá eram democracia, humanismo, terror. Já no Brasil, eram injustiça social, o atraso e a presença do imperialismo”. Informa o site: “Vivendo a euforia dos anos dourados do Governo Juscelino Kubitschek, decidiu nacionalizar-se brasileira. Mudou de profissão, pois se matriculou no curso de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde se graduou com suma cum lauda (Prêmio Visconde de Cairu) em 1960”.
PRESENÇA FEMININA
Em 26 de abril, publicou o Blog da Boitempo: “Tavares destacou-se não apenas pela formação de gerações de economistas, mas também pela representatividade, por escancarar os ambientes herméticos às mulheres, e, sobretudo, pela defesa intransigente do nacional-desenvolvimentismo; do crescimento econômico com distribuição de renda; de uma política externa independente; da erradicação das desigualdades sociais; de uma sociedade brasileira mais justa e igualitária. Em momento nenhum deixou-se levar pela onda tecnicista e privatista, sempre pontuando o compromisso do economista com a justiça social, com o povo e com a nação”.
UMA PIONEIRA
Destaca também a matéria na Boitempo o pioneirismo de Conceição: foi a primeira professora da Faculdade de Economia, a primeira pesquisadora latino-americana na Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL); fundou e conduziu os principais programas de pós-graduação em Economia no Brasil, na Unicamp e na UFRJ; elaborou programas de política econômica de âmbito nacional, foi referência nos debates nacionais; e foi uma das primeiras intelectuais no Brasil a protagonizar a construção do espaço das mulheres na política após a redemocratização.
FIRMEZA SEM SECTARISMO
Considerada uma das mentes acadêmicas mais brilhantes e alinhada à esquerda desde sempre, Maria da Conceição Tavares, sem recuar de seu discurso contundente e profundo, nunca se deixou levar pela estreiteza. Ao criar a pós-graduação em Economia no Brasil, o fez juntamente com Mário Henrique Simonsen, Delfim Netto e João Paulo dos Reis Velloso – ídolos da direita no tempo em que a direita pensava. Orgulhava-se de atuar nas salas de aula, a ponto de, ao ser presa em 1975, no Aeroporto do Galeão (Rio de Janeiro), levantar a voz para bradar aos agentes da ditatura: “Eu sou uma professora!”, frase que repetiria, firme, nos interrogatórios a que foi submetida.
AMPLA E COMBATIVA
Nunca temeu polêmicas: “Eu saí do PMDB e entrei para o PT em 1994. A morte do Ulysses [Guimarães] foi fatídica para o PMDB, que virou uma choldra. No PT, ao qual ainda estou filiada [e deputada federal na legislatura 1995/1999], tenho concordâncias e discordâncias, o que é normal, principalmente em algumas inflexões históricas, como a Carta aos brasileiros, de 2002, com a qual nunca estive de acordo. De qualquer forma, foram feitos avanços sociais indiscutíveis”.
Maria da Conceição Tavares é agora história. Viva Maria da Conceição Tavares!!
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.