Enio Lins
Crônica dalgumas perdas irrecuperáveis no patrimônio de Maceió
Ruíram as ruínas do que fora o Hotel Atlântico, num desabamento natural e previsível. O desabamento fez aflorar memórias e, de quebra, equívocos sobre o instrumento do Tombamento, que é o reconhecimento oficial, no formato de lei (municipal, estadual ou federal) da obrigação de um bem material ser preservado, mas não altera a propriedade da coisa tombada – ou seja, quem é dono segue responsável pela manutenção do patrimônio.
TOMBOU O TOMBADO?
Fala-se que o finado hotel estaria sob proteção de tombamento – mas por qual motivo? Só se fosse pela localização, posto aquele imóvel não dispor de nenhuma característica que justificasse tal medida protetiva, ao contrário do casarão dos Lavenére, que bravamente resiste com suas linhas históricas íntegras na margem oposta do riacho Salgadinho. Por falar nisso, quais seriam as áreas, quais os limites do protegido por tombamentos municipal ou estadual? Sabe-se que Maceió não possui perímetros protegidos pelo IPHAN.
TOMBAR POR ÁREA?
Tombar por área contínua é medida arriscada, e muitas vezes, injusta, pois o traçado tende a incluir imóveis cuja preservação individual não se justifica, destoando e comprometendo o conjunto. Jaraguá, enquanto bairro histórico, está cravejado de imóveis sem nenhuma característica a ser mantida. Eram assim os escombros do que foi o Hotel Atlântico, e seus proprietários não poderiam ficar constrangidos, pela mera localização, a uma conservação impossível, muito menos obrigados a investir numa restauração impagável.
AVANÇOS E RETROCESSOS
Jaraguá, como conjunto urbano, nunca foi enquadrado nos critérios do IPHAN. Mas, naquele bairro, bens isolados merecem o reconhecimento nacional (inclusive o que abriga essa própria instituição federal). Por sua vez, o tombamento estadual e/ou municipal, por área, do velho bairro, teve grande importância para frear a descaracterização total que estava em curso nos anos 70. Esse mérito tem nome e sobrenome: Zélia Maia Nobre, fundadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFAL. Meio século depois, precisa ser dado o passo seguinte, que é a identificação dos imóveis descaracterizados, excluindo-os da onerosa lista de coisas a preservar.
PERDAS E DANOS
Tristemente, inúmeras edificações representativas na capital alagoana têm sumido do mapa, como – recentemente – desapareceu o casarão vizinho ao Museu Théo Brandão (antiga boate Whiskyzito). Mas, apesar dos pesares, obras expressivas em Maceió resistem com sua arquitetura original, fazendo jus a ações públicas para suas restaurações. Essa lista precisa ir além dos bens da “colonais”, e alcançar exemplares da Arquitetura Moderna e Protomoderna – como o Edifício Brêda e o Edifício Luz –, além da Contemporânea, como o Hotel Jatiúca e o Corredor Vera Arruda.
APLAUSOS!
Nesse cenário de tristeza, é uma alegria constatar a recuperação da Praça dos Martírios e do sobrado que passa a abrigar a vice-governadoria, feitas pelo governo do Estado, assim como a antiga Intendência Municipal, pela prefeitura de Maceió, e a antiga Faculdade de Direito, pela OAB. Deve-se destacar que, nos bairros vitimados pelo desastre da Braskem, imóveis de grande valor arquitetônico e histórico foram mantidos exemplarmente ao longo de décadas, por seus proprietários, como a magnífica mansão Lilota (preservada pela família Mendonça), o Chalé dos Leite, o casarão do Major Bonifácio, o Bom Conselho... Exemplos que não podem ser esquecidos.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.