Enio Lins
Ser ou não CEI: eis a questão
Há quem enxergue as CPIs e suas congêneres estaduais e municipais como panaceia. Tolice, pois não existe remédio definitivo para todos os males, muito menos uma comissão de inquérito tem o condão de se sobrepor aos poderes constituídos.
Mas importante, e muito, é a Comissão Especial de Inquérito que tenta se instalar na Câmara de Maceió para o Caso Braskem. Sem dúvida, o poder legislativo municipal tem, nesta CEI, a maior oportunidade, desde 1991, de cumprir seu papel frente a um crime ambiental de grande envergadura.
Em 28 de maio de 1991 a Câmara Municipal de Maceió finalizava os trabalhos da Comissão Especial de Inquérito “ACIDENTE NO POLO CLOROQUÍMICO DO ESTADO DE ALAGOAS”. Note-se que tal ocorrência aconteceu em área do município de Marechal Deodoro, mas o poder legislativo maceioense assumiu a missão de investigar o caso pelo fato daquela contaminação ameaçar alcançar a Lagoa Mundaú e o lençol freático da capital.
Duraram cerca de três meses os trabalhos da CEI do acidente no Polo Cloroquímico; o relatório final constatou os perigos do caso e encaminhou aos poderes competentes uma lista de cinco procedimentos a serem tomados. Ah, sim: uma comissão de inquérito não manda prender ninguém – em essência, não pune, nem condena, sugere medidas.
No caso da CEI de 1991, suas indicações caíram no esquecimento. Mas a Câmara Municipal de Maceió, naqueles idos, cumpriu sua missão. Investigou, pesquisou fundo – junto a técnicos competentes – o acidente, suas causas e consequências.
Completando 33 anos em maio, a CEI do vazamento da ALCLOR foi proposta e presidida pelo vereador Marcus Vasconcelos, e teve como relator o vereador Roberto Suruagy (Suruca). O relatório, suscinto e direto, deve ter cópia guardada na Câmara de Maceió.
“Efetivamente o desastre ecológico se verificou. É estranhável e profundamente lamentável o fato de que o acidente ocorreu há, aproximadamente, 01 (hum) ano e sua comunicação ao Governo do Estado e ao Sindicato dos Trabalhadores (...) – SINDIQUÍMICA, somente se verificou nos últimos 90 (noventa) dias, por iniciativa da SALGEMA INDÚSTRIAS QUÍMICAS, acionista majoritária da ALCLOR. A população, por sua vez, só tomou conhecimento do fato graças ao SINDIQUÍMICA”, relatou a CEI.
“(...) a SALGEMA chegou a contratar empresas especializadas para oferecer laudos técnicos a respeito, os quais embora com conclusões obscuras e dúbias, chegaram a constatar a presença de clorofórmio, dicloropropano e dicloretano, além de outras substâncias químicas, em poços artesianos da ALCLOR e CPC, só bem depois comunicando o fato ao Governo”.
Como o citado acidente ameaçava de contaminação os municípios de Maceió, Marechal Deodoro, Coqueiro Seco, Santa Luzia do Norte e Pilar, as indicações da CEI de 1991 foram endereçadas – além dessas prefeituras – principalmente ao Governo Estadual.
Como primeira providência, foi solicitada a realização de “uma ampla auditagem ambiental e interdisciplinar, com participação de profissionais de notória especialização nas áreas de hidrologia, química, biologia, medicina do trabalho, dentre outras, para diagnosticar o nível e extensão do desastre ecológico ocorrido”. Nesse item está contida, repito, há 33 anos, uma constatação perigosa que segue em cartaz: apenas a empresa causadora do problema sabe a extensão do mal provocado por ela mesma.
Segunda indicação: “Sugerir ao Chefe do Executivo Estadual a definição de uma política prioritária para o Meio-Ambiente e, dentre outras sugestões, dotar adequadamente o Instituto do Meio-Ambiente dos equipamentos e demais recursos necessários a seu eficiente funcionamento”. Hoje, a questão central segue a mesma: falta de capacidade técnica dos órgãos ambientais de, por iniciativa própria, monitorarem os trabalhos de empresas de grande complexidade como a Braskem.
Nos dias em curso, o gravíssimo problema do afundamento das minas só entrou em pauta quando o desastre se tornou visível a olho nu. Desde 1984, quando foi denunciado o risco de desabamento das minas, até surgirem as inegáveis rachaduras no bairro do Pinheiro, a empresa (Salgema/Braskem) negou sistematicamente essa possibilidade, esgrimindo laudos técnicos que garantiam a estabilidade das cavernas, e os órgãos públicos não tinham, nem têm, como verificar tais parâmetros de alta sofisticação.
Hoje a Braskem segue no comando da situação, colhendo os dados, informando o que considera apropriado, e repassando os pepinos para o Governo do Estado e a Prefeitura de Maceió. Tornou-se proprietária privada de bairros inteiros e teria se eximido de responsabilidades futuras para o que venha a acontecer em solo maceioense pela soma de R$ 1,7 bilhão. Puxa vida: é ou não motivo suficiente para a Câmara Municipal da capital voltar a jogar seu papel de protagonista como há 33 anos?
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.