Enio Lins
O crime do craque Robinho
Eça de Queiroz, num de seus magistrais livros, “O crime do padre Amaro”, publicado em 1875, visitando o poder do confessionário, aborda o pecado machista encapsulado e turbinado pela força da batina, versus a vulnerabilidade social da mulher.
Longe de se dissipar, esse poder destruidor do machismo se apresenta tão nocivo e covarde como nos séculos passados. Ao contrário do jogo de sedução retratado por Eça, a violência pura, o estupro, parece atrair mais aos cafajestes contemporâneos.
Os diálogos do tal Robinho poderiam ser impressos em cartões vermelhos, pois todas as falas dele são faltas graves, confissões de um mesmo crime: estupro. Estupro de vulnerável, violentação coletiva, covardia ainda maior e mais repugnante.
Não há arrependimento, sequer consciência pesada, apenas a reafirmação do prazer opressor, da naturalização da violência e a disposição – pusilânime – de fugir das responsabilidades, aventando o desejo da agressão física à vítima violentada.
Como de resto acontece com todos os covardes, o cara que é (ou foi) um craque está pisando na bola e fazendo uma sucessão de gols contra. Certamente aposta num apito mudo da arbitragem. Mas sua argumentação diz muito do lodo ideológico em que joga.
Emblemática é a comparação que o jogador, ex-capitão do Santos, faz entre si próprio e outro ex-capitão (dos demônios), o Jair. Se acha, juntamente com o mito, vítima de uma imprensa perseguidora. Pobres garotos, tão inocentes...
É o mesmo arcabouço ideológico que permeia, embasa, atos e fatos de gente como o falso messias e o craque estuprador, e nesse item – para esses canalhas – a máxima é: se a mulher merecer, é para ser estuprada. Simples assim.
Esse pensar – criminoso – é o mesmo que justifica tentativas de golpe e privilégios de todos os tipos, até os mais absurdos. É o direito de levar na marra. Afinal eles se acham ungidos e que o poder lhes permite tudo, e quem se opor a isso é “comunista”.
Esse praticar do poder machista, avassalador, é o que gera e faz multiplicar os feminicídios aqui e alhures, dentre outros horrores. Enquanto o craque segue impune dentro das quatro linhas, a falta por ele cometida continuará banalizada, permitida “na moral”.
Hoje na história
22 de junho de 1633 – Galileu Galilei, cientista e astrônomo, é condenado pela Santa Inquisição a renegar sua tese de que a terra não é o centro do universo, e sim um planeta que gira em torno do sol tal qual os demais.
Sua sentença foi lavrada em três condenações, resumidamente: 1) “abjurar, cura e detestar” suas opiniões como ofensivas à “Sagrada Escritura”; 2) sentenciado à prisão comum, em seguida pena convertida em prisão domiciliar para o resto de sua vida; 3) sua obra considerada blasfema, “Diálogo” foi banida e proibidas de publicação todas as obras de sua autoria.
Dizem as lendas que, ouvindo calmamente a lista de penalidades, cumpriu a primeira delas, renegando suas teorias científicas – mas, assim que fez a profissão de fé em voz alta, teria murmurado “e, ainda assim [a terra] se move”.
Em sua prisão domiciliar, Galileu continuou a pesquisar e escrever clandestinamente até 8 de janeiro de 1642, quando morreu, aos 77 anos. Na ocasião, admiradores tentaram enterrá-lo de forma digna, apropriada à sua importância histórica, em um mausoléu em tributo por sua obra científica, mas o papa Urbano VII desautorizou a iniciativa pelo fato de Galileu ser um condenado pelo Santo Ofício.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.