Enio Lins
O valor das candidaturas sem chance
Candidaturas sem chance nas urnas são, sim, valiosas para o processo democrático. Existe um valor “utilitário” reconhecido há tempos, é verdade, pela necessidade de nomes “poca-urnas” que, somando um voto aqui, outro ali, garantem ultrapassagem da linha de corte do coeficiente eleitoral e ajudam na conquista de mais uma cadeira. São as “escadas”.
Mas o mais importante nas candidaturas sem massa de votos suficiente para suas respectivas eleições está no jogo majoritário para postos executivos. Aí a presença de “pocas-urnas” pode fazer uma diferença fundamental, pois o horário eleitoral é um palco privilegiado, único, para exposição de ideias e ideais.
A desobrigação de ganhar possibilita a uma grande oportunidade a quem queira usar, para o bem ou para o mal, o espaço midiático para a divulgação de propostas, para a projeção eleitoral do próprio nome, e para fustigar ideário adversário. A população é premiada com um debate mais diversificado, de melhor nível, com algo além do tradicional genocídio marqueteiro entre as lideranças com chances reais de ganhar o pleito.
“Meu nome é Eneas!!!” foi um bordão que se espalhou pelo Brasil a partir da disputa presidencial de 1989, quando Enéas Carneiro da Cunha (1938/2007), médico e intelectual conservador, usou brilhantemente seus míseros 15 segundos de vitrine para expor ideias e, por conta de 1/4 de minuto findou no 12º lugar entre 21. Em 1994 repetiu a dose e faturou o 3º lugar, abaixo apenas de FHC e Lula! Em 2002, candidato a deputado atraiu 1,7 milhões de votos e ocupou mais cinco cadeiras na Câmara Federal. Foi um tempo no qual a direita tinha ideias e não era sinônimo apenas de banditismo e covardia, como nos dias em curso.
Em 2018, Boulos fez o melhor discurso daquela temporada, mantendo como referência a solidariedade ao ex-presidente Lula, então preso e tratado como um problema até por parte da esquerda. Em seu pouco espaço no horário eleitoral foi firme e pedagógico, traçando temas sociais com clareza. Mesmo, na prática, estimulando à migração de seus votos para candidatura mais viável, de Haddad, ficou no 10º lugar entre 13. Saiu da campanha firmado como liderança nacional e em 2022 dispara para deputado federal pelo PSOL em São Paulo.
Nas Alagoas, em 2014, Júlio César soube ser sereno e seguro. Passo seguinte, consolidou-se em Palmeira dos Índios e, em seguida, foi eleito prefeito em 2016 e reeleito em 2020. E apois: nesta batalha pelo voto alheio em 2022, além de Paulo Dantas, Fernando Collor e Rodrigo Cunha, quem mais se apresenta para apimentar e diversificar o debate?
NOTAS
# Corrigindo: a Missa do Cangaço, a ser rezada hoje, em Angicos/SE, está em sua 25ª (vigésima quinta) edição, por erro de digitação saiu publicado ontem 125.
# Vera Ferreira, neta de Maria Bonita e Lampião organiza essa missa desde 1997, marcando a data da morte de seus avós.
# O anúncio do nome de Ronaldo Lessa como vice de Paulo Dantas confirma o fortalecimento da chapa do MDB.
# Resultado de uma ampla costura, a dupla Paulo Dantas & Ronaldo Lessa premia o esforço de articulação entre os veteranos da política alagoana.
# Por vez, a oficialização da candidatura de Simone Tebet à presidência da República confirma a capacidade do nacional do MDB de jogar em mais de uma posição.
# Apesar da candidatura da senadora do Mato Grosso do Sul estar aprovada, o MDB votará também, ou principalmente, em Lula e em Jair.
# Segundo o colunista Ricardo Noblat, “a cúpula do MDB acha que Tebet vai ultrapassar Ciro na eleição”. Sei não, mas isso não fará diferença.
# A Flimar, tradicional evento de Marechal Deodoro, está se arrumando para a Edição 2022 homenageando o Carnaval.
# Depois do intervalo por conta da pandemia, a Flimar 2022 deverá ser realizada de 1º a 4 de setembro com foco na literatura carnavalesca.
HOJE NA HISTÓRIA
28 DE JULHO DE 1938 – Lampião, Maria Bonita e mais nove integrantes do grupo são mortos por policiais de Alagoas, sob o comando do tenente João Bezerra, na localidade sergipana de Angicos. As cabeças, decapitadas, circulam por várias cidades, exibidas como troféus e comprovação do triste fim. A destruição dos bandos que atuavam no sertão nordestino passou a ser uma prioridade do Estado Novo, ditadura implantada no Brasil em 1937. O objetivo, antes de combater o banditismo, era fortalecer o Exército nacional, eliminando as forças que determinavam a lei e a ordem (ou desordem) no interior do País. Virgulino Ferreira, o mais célebre e longevo dos líderes do cangaço, hábil no que depois seria chamado de marketing pessoal, foi transformado em alvo estratégico e vários governos estaduais correram para o eliminar e ganhar as graças do regime Vargas. Outros, como o de Sergipe, seguiram política distinta, e Lampião se sentia em segurança nessas áreas. Por determinação do governador Osman Loureiro, as volantes alagoanas passaram a caçar os cangaceiros com mais ferocidade e, na noite de 27 de julho, atravessaram o Rio São Francisco, entraram no Estado vizinho e emboscaram o Rei do Cangaço quando o sol raiou. Depois de muitos anos, Vera Ferreira, neta de Maria Bonita e Lampião, passou a organizar uma missa no local do massacre todo dia 28 de julho.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.