Alisson Barreto
VIRTUDE: CONSTÂNCIA NO BEM
Virtude: constância no bem
Como uma prática habitual pode libertar
Por Alisson Francisco R. Barreto
Há uma prática habitual que escraviza e, relaxando a consciência, gera a cegueira: o nome dela é vício. Ora, como pode uma prática habitual escravizar (o vício) e outra libertar (a virtude)? Este é o tema a ser tratado nas linhas que se seguem.
Prezado leitor, responda para si: se algo é bom, esse algo é vício ou virtude?
Bom ou ruim são qualidades acerca do que apetece aos sentidos. Ou seja, para algo ser bom, deve ser saboroso, lustroso, gostoso… Ora, sabe-se que algumas coisas podem ter sabor bom e não fazerem bem. Agora refaça a pergunta: algo bom é vício ou virtude?
Percebeu que pode acontecer que a pessoa sinta algo bom ou alguma satisfação por algo que pode levar a um vício? Então, o leitor poderia perguntar: posso dizer que o vício é algo bom? Obviamente, a resposta é não! Ora, questione este que vos escreve: como algo pode ser bom e mal ao mesmo tempo? Eis a questão, o fato de algo não poder ser bom e mau ao mesmo tempo não significa que pode ser bom e mal, concomitantemente. Quando você prova um bolo, sendo indagado, responde que o bolo está bom ou responde que está ruim (mau). Porém, pode acontecer que o bolo esteja bom e envenenado. Então, como o leitor classificará tal bolo: bom ou mau? Um bolo gostoso com veneno insípido seria um bolo bom, mas não seria um bem: faz mal, é um mal. Ao contrário, um remédio amargo não é bom, mas é um bem!
Nisso, nota-se também que o mal não é necessariamente algo cuja natureza não possa alegrar os sentidos, mas é algo que subsiste em algum bem, mas que, corrompido, faz mal, tornando-se um mal. Exclua totalmente o veneno do bolo saboroso e ele será um bolo bom e um bem, pois dá sabor e alimento. Naturalmente, a mesma linha de raciocínio serve para diabéticos, os intolerantes a lactose etc.: algo pode ser gostoso, mas para tal pessoa ser um mal. Percebe-se que aí há a identificação de que há males gerais e males específicos, pois nem todos atingem a todos. Uma bactéria pode viver no mosquito sem fazer mal a ele e ser terrível para humanos!
Uma pessoa pode experimentar uma droga e sentir nela tal prazer que passe a não conseguir viver sem ela, tornando-se viciada, adicta, passando a executar uma prática habitual de sustentação de sua dependência. Mas aquela sensação que lhe aparenta boa é, na verdade, um mal, pois a faz escrava da sensação e, por conseguinte, escrava da substância.
Ora, desse entendimento, já se pode concluir que as sensações também podem ser armadilhas. Já parou para observar como as sensações de compras ou de um espelho de academia podem levar uma pessoa a ser uma consumista compulsiva ou uma narcisista?
No caso da virtude, a prática habitual pode ou não ter uma correspondência dos sentidos. Na verdade, a prática virtuosa, muitas vezes, leva a uma libertação, inclusive, das sensações. Assim, a sensação de ficar confortável em uma rede a balançar-se pode ser interrompida pelo amor misericordioso pelo pedinte que bate à porta à procura do alimento.
O que faz uma realidade se tornar uma virtude na vida de um ser humano é a constância, a habitualidade da prática. Em outras palavras, um ato isolado não possibilita afirmar que uma pessoa é virtuosa, mas a reiteração do agir no bem instiga a afirmar que se trata de uma pessoa de virtude.
A essa altura o leitor já sabe que algo bom pode ser um vício e algo ruim pode ser uma virtude, lembrando-se de que a sensação de uma droga é tida como boa, mas escraviza; e sair do conforto para atender a um pedinte pode ser desconfortável (ruim), mas liberta. No primeiro exemplo, trata-se de um mal bom; no segundo, um bem de sensação ruim. Note, caro leitor, que, depois de um tempo, o primeiro exemplo acaba por gerar sensações ruins e o segundo acaba por gerar sensações boas. Levando a concluir que a sensação imediata não pode servir de parâmetro para as boas escolhas, mas as boas escolhas geram bons frutos adiante. Plantar uma árvore pode ser pesaroso, todavia, sua sombra e seus frutos podem se tornar grandes benefícios, a longo prazo.
Pode-se resumir as virtudes em teologais, evangélicas e humanas cardeais. As teologais são infusas por Deus no coração do homem: fé, esperança e caridade (amor). As evangélicas são a pobreza, a obediência e a castidade, que se tornam votos para os religiosos. As virtudes humanas cardeais são as que dão direção e geram todas as demais virtudes que dependem da ação humana: prudência, justiça, fortaleza e temperança (moderação).
O exercício de praticar as virtudes pode ser desafiador e, por vezes, árduo, penoso ou mesmo doloroso; no entanto, são espinhos que fazem brotar o precioso odor da santidade. A prática das virtudes tem muito a ver com a cruz e com o rosário, requer amor – fonte, sustento e essência de toda virtude – terá momentos gozosos, uma cristificante perseverança dolorosa, mas por fim a união com o Crucificado nos mistérios dolorosos da vida leva à união com Cristo na glória de Deus.
Eis, pois, em suma, como a constância no bem é libertadora: começa a nos habituar com o bem, ajuda a superar a nós mesmos por meio da via dolorosa, mas depois não seremos mais um mero eu, estaremos na liberdade de unidos ao Senhor e todo o nosso eu será Cristo a viver em nós!
Maceió, 25 de maio de 2016.
No amor da Virgem Santíssima,
Alisson Francisco Rodrigues Barreto
Alisson Barreto
Sobre
Alisson Francisco Rodrigues Barreto é poeta, filósofo (Seminário Arquidiocesano de Maceió), bacharel em Direito (Universidade Federal de Alagoas), pós-graduado em Direito Processual (Escola Superior de Magistratura de Alagoas), com passagens pelos cursos de Engenharia Civil (Universidade Federal de Alagoas) e Teologia (Seminário Arquidiocesano de Maceió). Autor do livro “Pensando com Poesia”, escritor na Tribuna com o blog “Alisson Barreto” (outrora chamado de “A Palavra em palavras”), desde 2011. O autor, que é um agente público, também apresenta alguns dos seus poemas, textos e reflexões, bem como, orações no canal Alisson Barreto, no Youtube, a partir do qual insere seus vídeos aqui no blog.