'A hérnia me parou, mas não me derrubou': o relato de Renato sobre superação e retorno à rotina

Estado de Alagoas realizou mais de 9 mil cirurgias de hérnia pelo SUS em dois anos

Por Ana Paula Omena e Thayanne Magalhães / Revisão: Bruno Martins | Redação

Renato Malta Florentino, 38 anos, acostumado com a correria do trabalho em almoxarifado e com o ritmo intenso da musculação, viu sua rotina mudar por completo quando começou a sentir uma dor insistente e um inchaço estranho na região abdominal. "Foi depois de uma tosse boba que senti aquela dorzinha chata, algo que antes eu não dava importância", contou.

O desconforto, até então sutil, logo se tornou um sinal claro de que algo não ia bem. "Quando apareceu o inchaço, fui direto ao médico. Não tive medo, só queria entender o que era e resolver", lembrou. O diagnóstico veio rápido: uma hérnia que exigiria cirurgia para que ele pudesse voltar com segurança às suas atividades.

Para Renato, a notícia não foi motivo de preocupação, mas sim de ação. “Fiz todos os exames, marquei a cirurgia e ouvi dos médicos que era um procedimento simples, desde que eu respeitasse o tempo de repouso”, explicou. A confiança na equipe médica o deixou tranquilo durante todo o processo.

Mas não foi fácil. Após a operação, os primeiros dias exigiram paciência e ajuda. “O pós-operatório é sofrido, principalmente pra fazer as necessidades básicas. Ter alguém pra ajudar nesse momento faz toda a diferença. É um período em que você precisa de cuidado e apoio”, frisou Renato.

A recompensa veio com o tempo. A dor sumiu, o incômodo desapareceu e Renato voltou à academia e ao trabalho com segurança. "Poder levantar peso de novo, praticar o que eu gosto e movimentar o estoque sem preocupação... é libertador", afirmou com um sorriso.

Hoje, ele compartilha sua história como incentivo a quem enfrenta o mesmo desafio: “Não tenha medo. Vá ao médico, faça os exames, se opere e cuide-se bem depois. A recuperação depende da gente. E o resultado vale a pena”.

A história de Renato mostra que, com atitude, informação e apoio, é possível transformar um contratempo em um recomeço com ainda mais força e cuidado. 


Chefe de almoxarifado de 38 anos precisou interromper a musculação e adaptar o trabalho após descobrir uma hérnia. Com coragem e apoio médico, ele enfrentou a cirurgia e hoje retoma suas atividades com qualidade de vida


Apesar da alta demanda

Procedimentos minimamente invasivos ainda são minoria em AL



Entre 2023 e 2024, mais de 9,6 mil cirurgias de hérnia da parede abdominal foram realizadas em Alagoas por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). O levantamento foi feito pela Sociedade Brasileira de Hérnia (SBH) e revela a dimensão da doença no estado, que segue a tendência nacional em que a hérnia inguinal, popularmente conhecida como “hérnia na virilha”, representa a grande maioria dos casos operados.

De acordo com os dados obtidos junto ao DataSUS, o estado realizou 4.596 procedimentos em 2023, sendo 142 aprovados em 2022, e 5.022 cirurgias ao longo de 2024. Do total acumulado de 9.618 procedimentos, a maior parte foi de cirurgias eletivas (8.504), ou seja, agendadas previamente. Os atendimentos de urgência somaram 1.114, o que equivale a 24% dos casos.

A hérnia inguinal se manteve como o tipo mais recorrente, totalizando 4.215 intervenções realizadas em Alagoas durante o biênio. Esse dado está em sintonia com a realidade nacional, onde esse tipo de hérnia representa cerca de 75% de todos os casos cirúrgicos.

Apesar da expressiva quantidade de cirurgias realizadas no estado, o acesso a procedimentos minimamente invasivos, como os feitos por videolaparoscopia — que utilizam pequenas incisões e garantem recuperação mais rápida ao paciente — ainda é bastante limitado. Em Alagoas, apenas 43 cirurgias (0,9%) utilizaram essa técnica no período analisado.

Doença comum e com impacto social


A hérnia abdominal é uma condição que atinge até um em cada quatro adultos, o que equivale a cerca de 28 milhões de brasileiros, segundo estimativas da Sociedade Brasileira de Hérnia. As manifestações mais frequentes incluem saliências ou abaulamentos visíveis na região da parede abdominal, geralmente acompanhados de dor ou desconforto — especialmente ao fazer esforço físico.

Além do impacto na saúde, as hérnias têm reflexos diretos no mercado de trabalho. Em 2023, mais de 28 mil trabalhadores foram afastados de suas atividades profissionais no Brasil devido a essa condição, que figura entre as principais causas de concessão de benefícios por incapacidade temporária, segundo o Ministério da Previdência Social.

Ações para reduzir a fila do SUS


A Sociedade Brasileira de Hérnia realiza anualmente mutirões gratuitos para atender pacientes do SUS em diferentes regiões do país. Alagoas já foi contemplado por uma dessas ações, que têm como objetivo diminuir a fila de espera por cirurgia e ampliar o acesso ao tratamento adequado.

Desde que os mutirões começaram a ser promovidos pela entidade, já foram realizadas aproximadamente mil cirurgias gratuitas em estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraíba, Ceará, Amazonas, Rio Grande do Sul, entre outros. Em 2024, a iniciativa foi realizada em Volta Redonda (RJ).

Em casos mais urgentes

Quando a hérnia já causa dor intensa, náuseas ou vômitos — o paciente deve ser atendido em caráter de emergência

Dados nacionais revelam baixa adesão a técnicas modernas

Em nível nacional, o SUS realizou 349.968 cirurgias de hérnia abdominal em 2024, sendo a maioria do tipo eletivo (311.300) e 38.665 consideradas urgências. Em 2023, foram 335.730 procedimentos, com 13,9% de urgências.

Apenas 0,62% das cirurgias em todo o país foram feitas com técnicas minimamente invasivas — índice semelhante ao observado em Alagoas. A falta de maior adesão a essas técnicas pode estar relacionada a fatores como custo, necessidade de capacitação médica especializada e estrutura hospitalar adequada.

CIRURGIAS MAPEADAS

Entre os procedimentos analisados pela Sociedade Brasileira de Hérnia no levantamento, constam desde intervenções comuns como a hernioplastia inguinal unilateral e bilateral, até casos mais complexos como hernioplastias com ressecção intestinal e reparos videolaparoscópicos. Todas essas intervenções são registradas no sistema do SUS sob diferentes nomenclaturas técnicas.

Apesar dos avanços tecnológicos na medicina, as cirurgias minimamente invasivas para correção de hérnias abdominais ainda representam uma pequena fração dos procedimentos realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2024, das 349.968 cirurgias de hérnias da parede abdominal efetuadas no Brasil, apenas 4.358 foram por técnicas menos invasivas, como a videolaparoscópica e a robótica, correspondendo a cerca de 0,64% do total.

A cirurgia videolaparoscópica utiliza pequenas incisões abdominais, com o auxílio de uma microcâmera e pinças, proporcionando ao paciente uma recuperação mais rápida, cicatrizes discretas e menor risco de infecção. Já a técnica robótica, indicada principalmente para hérnias grandes ou recidivadas, é realizada com o auxílio de um robô. Ambas as abordagens oferecem vantagens em termos de conforto pós-operatório e redução do índice de recidiva.

No entanto, o alto custo e a necessidade de profissionais com capacitação técnica avançada limitam a adoção dessas técnicas no sistema público de saúde. Segundo Gustavo Soares, cirurgião-geral e presidente da Sociedade Brasileira de Hérnia (SBH), "o número de procedimentos minimamente invasivos ainda é muito pequeno no Brasil. Uma das bandeiras da SBH é justamente criar condições para que esse indicador aumente".

A SBH também atua em um Projeto de Lei para oficializar o Dia Nacional de Conscientização sobre as Hérnias da Parede Abdominal, a ser celebrado em 19 de junho, visando aumentar a conscientização da população e direcionar verbas públicas para os pacientes afetados.

Quando a hérnia volta: os cuidados que evitam uma nova cirurgia


Avanços médicos tornaram a correção das hérnias da parede abdominal mais segura e eficaz, mas o sucesso depende também da atenção do paciente no pós-operatório

Dr. Igor Benevides


Com experiência em cirurgia abdominal, Dr. Igor Benevides alerta sobre a importância do cuidado no pós-operatório para evitar a reincidência das hérnias.

A maioria das pessoas só descobre que tem uma hérnia abdominal quando percebe um inchaço ou nódulo incomum na barriga. O que poucos sabem é que esse “carocinho” pode ser a ponta do iceberg de algo mais sério: um defeito na parede abdominal que permite a passagem de estruturas internas, como gordura ou até mesmo o intestino.

Essas chamadas hérnias da parede abdominal podem surgir por esforço físico excessivo, fraqueza muscular ou até após cirurgias anteriores. O tratamento é sempre cirúrgico e, na maioria das vezes, envolve a colocação de uma tela que reforça a musculatura da região.

“O uso da tela foi um divisor de águas”, explica o cirurgião Dr. Igor Benevides. “Antigamente, as cirurgias não contavam com esse recurso, e o índice de recidiva — ou seja, da hérnia voltar — era muito alto.”

Hoje, com técnicas modernas e materiais mais seguros, a chance da hérnia reaparecer é muito menor. Mas isso não significa que o risco foi eliminado. “Sim, as hérnias podem voltar, principalmente se o paciente não seguir corretamente as orientações do pós-operatório”, alerta o médico.

O retorno às atividades precisa ser cuidadosamente avaliado. “Cada paciente é único. O tipo de hérnia, o local onde foi feita a cirurgia e até as características físicas da pessoa influenciam no tempo de recuperação”, pontua Dr. Igor.

E um dos erros mais comuns é voltar cedo demais para a academia ou para atividades pesadas. “Muitas pessoas se sentem bem e acham que já podem levantar peso ou fazer esforço. Mas o que parece um progresso pode, na verdade, abrir caminho para uma nova cirurgia.”

A orientação é clara: siga à risca as recomendações médicas. “A cirurgia pode ter sido um sucesso, mas quem garante a recuperação plena é o paciente — com paciência, disciplina e cuidado”, conclui o especialista.

Afinal, prevenir uma nova hérnia é sempre melhor do que enfrentá-la novamente.

Ao TH Entrevista, especialista Aimê Araújo explica sintomas, riscos e importância do procedimento para evitar complicações graves