Hérnias abdominais: trabalhadores informais sofrem sem amparo do sistema

Especialistas explicam o que é a enfermidade e a limitação que ela pode causar na vida pessoal e profissional; advogados esclarecem os direitos do empregado e deveres do empregador

Por Ana Paula Omena, Lucas França e Valdete Calheiros / Revisão: Bruno Martins | Redação

As hérnias abdominais são frequentes na população. Dependendo do tipo e da gravidade, podem ser uma doença incapacitante, causando dor e limitando atividades rotineiras e laborais.

O médico Herbert Toledo é especialista em Cirurgia do Aparelho Digestivo e titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva. Algumas vezes, inclusive, tem a satisfação de operar junto ao filho, o também médico Rodrigo Barbosa, cirurgião em São Paulo.

Ele explicou que a hérnia na parede abdominal consiste em uma falha na continuidade dos tecidos que dão sustentação à parede abdominal, podendo haver um prolapso nessa região por essa região estar mais enfraquecida, com a tentativa de migração de vísceras da cavidade abdominal.

“A doença pode ser assintomática ou levar ao surgimento de dor, principalmente se for na região inguinal. Esse quadro pode ser leve e o paciente acometido ter sua vida normal ou até mesmo ter o aprisionamento das vísceras nessa falha da parede abdominal. Neste caso, com indicação de cirurgia”, esclareceu.

Dr Herbert Toledo e na mesa de cirurgia com seu filho Rodrigo Barbosa também cirurgião

Conforme o médico Herbert Toledo, não há tratamento medicamentoso. Por isso, completou ele, é importante que sempre que houver essa suspeita de um caroço na parede abdominal ou um abaulamento diferente do habitual, que se procure um médico, preferencialmente um cirurgião.

Marivan Santos foi submetido a uma cirurgia de hérnia no dia 4 de abril deste ano. Ele sentia muitas dores quando pegava peso, mesmo pesos leves, durante seu cotidiano dentro de casa.

“Meu umbigo ficava aumentando de tamanho. Sentia muitas dores e desconforto. Não teve jeito. Tive que me operar. A primeira semana após o procedimento não foi das mais fáceis, por causa do dreno. Mas depois que o dreno foi retirado, estou bem melhor”, contou.

Marivan Santos

“A hérnia abdominal acomete qualquer idade, até mesmo no recém-nascido. Os homens são mais afetados do que as mulheres e a maioria destas hérnias acontecem na região inguinal, em torno de 75%”, diz o médico Herbert Toledo

E quando a doença limita a vida pessoal e funcional do trabalhador?

A advogada previdenciária Kamaziana Severo destacou, como especialista em Direito Previdenciário, a importância de esclarecer que trabalhadores sem vínculo empregatício – como autônomos, freelancers e informais – e que contribuem regularmente para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) têm direito aos benefícios previdenciários em casos de doenças que impossibilitem para a atividade laboral.

CONTRIBUIÇÃO E QUALIDADE DE SEGURADO

Mesmo sem um contrato formal de emprego, o trabalhador que efetua contribuições ao INSS mantém sua condição de segurado. Além disso, caso este deixe de contribuir, ele pode usufruir da prorrogação da qualidade de segurado por um período de 12 meses. Isso significa que, mesmo sem contribuições durante esse período, os direitos aos benefícios – como o auxílio-doença – permanecem assegurados.

Auxílio-doença: o benefício é devido aos segurados que se encontram temporariamente incapazes de exercer suas atividades laborais por conta de enfermidade. Para ter direito a esse auxílio, é necessário cumprir o período de carência (geralmente 12 meses de contribuição, salvo exceções) e passar pela perícia médica do INSS que comprove a incapacidade.

No caso específico de hérnia abdominal, o que fazer?

A possibilidade de recebimento do auxílio-doença para uma condição como a hérnia abdominal dependerá do grau de incapacidade ocasionado pela doença.

Se a hérnia, seja em decorrência de complicações, de sua sintomatologia ou do período pós-operatório (quando aplicável), comprometer significativamente a capacidade de trabalho do segurado, o benefício pode ser concedido.

Para tanto, é essencial que o trabalhador reúna toda a documentação médica necessária – laudos, exames e relatórios – que atestem o diagnóstico, a gravidade da condição e o impacto na capacidade laboral.

Entre os procedimentos junto ao INSS, é preciso que o cidadão faça a Confirmação da Condição de Segurado. “Verificar se as contribuições estão em dia ou se a prorrogação da qualidade de segurado está sendo aplicada, garantindo que o trabalhador continue elegível para os benefícios, mesmo que não haja contribuição recente”, detalhou a advogada Kamaziana Severo que, além de advogada especialista em Direito Previdenciário, é professora de Direito Constitucional.

A especialista lembrou do agendamento da perícia pelo sistema “Meu INSS” ou via telefone, conforme os canais oficiais.

Imprescindível é, conforme a advogada Kamaziana Severo, a organização da documentação. “Reunir todos os documentos necessários, tais como comprovantes de contribuição, extrato do CNIS [Cadastro Nacional de Informações Sociais], documentos de identificação, comprovante de endereço, principalmente, toda a documentação médica que comprove o diagnóstico de hérnia abdominal e a incapacidade temporária para o trabalho.”

A advogada esclareceu que durante a perícia médica, o perito avaliará a condição do segurado e que a documentação médica robusta pode fazer uma diferença significativa na decisão.

ANÁLISE E DECISÃO

Após a avaliação, explicou a advogada, caso o perito confirme a incapacidade, o auxílio-doença será concedido. “Se o benefício for negado, cabe ao segurado interpor recurso administrativo, geralmente com o auxílio de advogado especializado em Direito Previdenciário. Em suma, mesmo sem vínculo empregatício, os trabalhadores que contribuem para o INSS têm direitos à assistência previdenciária”.

“A prorrogação da qualidade de segurado é um importante mecanismo de proteção, assegurando que, mesmo após cessar contribuições, o trabalhador possa requerer benefícios, como o auxílio-doença, caso adoeça – inclusive em situações como a de uma hérnia que gere incapacidade para o trabalho. Em todos esses casos, contar com orientação jurídica especializada é fundamental para garantir o pleno exercício desses direitos”, finalizou Kamaziana Severo, que é diretora da Amprev (Associação das Mulheres Previdenciaristas de Alagoas). A profissional é uma atuante advogada na defesa de direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

Hérnia abdominal é falha na aponeurose

O cirurgião Álvaro Bulhões explica que a hérnia abdominal é uma falha na aponeurose, tecido que protege a cavidade abdominal, podendo ser congênita ou adquirida. A condição afeta homens e mulheres, podendo surgir em qualquer idade e, se não tratada, traz riscos como encarceramento e estrangulamento do conteúdo herniado.

Cirurgião Álvaro Bulhões




“Sem vínculo empregatício, sem proteção”

Conforme a advogada trabalhista e especialista em compliance, Valéria Fidélis, é importante esclarecer que trabalhadores que não são contratados segundo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não estão abraçados pela proteção da legislação, ou seja, os pejotizados, autônomos, uberizados, se eles não estão submetidos à anotação de carteira de trabalho, são desprotegidos contra os direitos decorrentes do vínculo de emprego.

“Então, no caso de exercerem na prática de atividade como empregados, ou seja, submetidos à subordinação, à pessoalidade, à habitualidade, recebendo salário, que é a onerosidade, eles podem ter reconhecido o vínculo de emprego e aí sim estarem resguardados pelos direitos previstos na CLT. Quanto às doenças adquiridas por empregados, é necessário que se identifique a causa, o nexo, se tem relação ou se foi ocasionada em decorrência do trabalho ou não”, explica Fidélis.

No áudio abaixo ela explica como isso pode ser feito. Ouça:


DISPENSA DISCRIMINATÓRIA

A advogada também destaca a importância de ressaltar que, independentemente de se tratar de uma doença não relacionada ao trabalho — chamada de doença comum — ou de uma doença adquirida no ambiente de trabalho, bem como de um acidente de trabalho ocorrido no exercício da função ou dentro do estabelecimento do empregador, o empregado regido pela CLT não pode ser demitido durante o período de tratamento ou afastamento.

“Caso isso aconteça, é considerado uma dispensa discriminatória e o empregado faz jus a uma indenização. Então, quando se trata de doença relacionada ao trabalho, ou acidente de trabalho, o empregado, ao retornar do benefício, ele possui ainda 12 meses de estabilidade no emprego, ou seja, durante esses 12 meses não pode ser demitido, exceto por justo motivo”, afirma a advogada.

No áudio abaixo, Fidélis esclarece os direitos e deveres do empregado e do empregador. Ouça:

Brasil é pioneiro no tratamento de hérnias

Gustavo Soares, presidente da Sociedade Brasileira de Hérnia (SBH), destacou que o Brasil é pioneiro no tratamento de hérnias. Técnicas mais modernas e os avanços garantem o acesso a tratamentos de ponta.

Em entrevista exclusiva com o Dr. Gustavo Soares, ele ressaltou os direitos do paciente e os segredos para um tratamento eficaz, bem como salientou o acesso ao tratamento de hérnias, tanto no sistema público quanto no sistema privado. Assista abaixo:

👨‍⚕️ “Hérnia é coisa séria!”

Dr. Heitor Santos, cirurgião e vice-presidente da SBH faz alertas importantes:

✅ Hérnias estão entre as principais causas de afastamento do trabalho no Brasil;

✅ A importância do diagnóstico precoce e da cirurgia como solução segura;

✅ O impacto dos mutirões de hérnia para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o país;

✅ Como a SBH promove informação de qualidade para a população;

✅ E um convite especial aos cirurgiões para participarem dos simpósios e eventos científicos da área.


🔔 Assista e entenda por que informação, prevenção e acesso à cirurgia podem transformar vidas.


Quando um trabalhador precisa se afastar do trabalho por motivo de saúde, é essencial conhecer os caminhos corretos para garantir o acesso ao benefício do INSS, atualmente chamado de auxílio por incapacidade temporária — o antigo auxílio-doença. Para isso, o primeiro passo é estar em situação regular como segurado da Previdência Social.

Segundo orientação da advogada previdenciária Danyelle Godoy, ao receber um atestado médico que recomende o afastamento das atividades, o trabalhador deve reunir toda a documentação necessária: documentos pessoais, laudos, exames e o atestado médico detalhado. Com isso em mãos, há duas formas principais de solicitar o benefício: pelo telefone 135, da Central do INSS, ou pelo aplicativo Meu INSS, disponível para smartphones.

Confira a entrevista completa com o passo a passo: