
A Lei da Reforma Psiquiátrica no Brasil completou 23 anos no último dia 6 de abril. No entanto, passadas mais de duas décadas da sua promulgação, Alagoas ainda não sabe o destino correto que deve dar aos seus pacientes psiquiátricos nem dos custodiados no Centro Psiquiátrico Judiciário Pedro Marinho Suruagy. E o problema piorou bastante desde o afundamento do solo provocado pela mineradora Braskem. Rachaduras enormes e comprometimento da estrutura física do Hospital Escola Portugal Ramalho agravaram ainda mais a situação.
Também conhecida como Lei Antimanicomial ou Lei Paulo Delgado, o texto tem como fundamento o tratamento mais humanizado dos pacientes acometidos por doenças mentais, com o fechamento gradual de manicômios e hospícios existentes no país. A diretriz é a internação do paciente somente se o tratamento fora do hospital se provar ineficiente.
Desde agosto de 2023, os manicômios judiciais existentes no Brasil suspenderam a entrada de novos pacientes. E, até maio do ano passado, todos os estabelecimentos deveriam ter sido desativados em definitivo. Pelo menos é isso o que determina a resolução 487/23 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O texto estabelece procedimentos e diretrizes para efetivar, no Judiciário brasileiro, a política antimanicomial. Há ainda estabelecimentos não desativados.
Com a determinação do CNJ para a interdição total e o fechamento de unidades de custódia e tratamento psiquiátrico em todo o país, o destino dos pacientes psiquiátricos e custodiados do Centro Psiquiátrico Judiciário (CPJ) de Alagoas entra em pauta. A Resolução nº 487/23 marca um divisor de águas ao romper com a lógica manicomial e exigir que estados e municípios assegurem atendimento em liberdade, baseado na dignidade, no cuidado e na inclusão social.
Longe de ser uma transição simples, o processo expõe fragilidades históricas da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no estado. Fiscalizações realizadas pela Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos revelaram falhas estruturais que comprometem desde o acolhimento básico nas unidades de saúde até os serviços mais complexos, como os leitos psiquiátricos em hospitais gerais e nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). A promotora Micheline Tenório, do Ministério Público de Alagoas (MP/AL), destacou que as deficiências afetam toda a população, mas impõem ainda mais desafios para quem cumpre medida de segurança judicial.

Neste cenário, a Defensoria Pública do Estado de Alagoas (DP/AL) tem atuado para garantir que a desinstitucionalização desses pacientes ocorra de forma segura, com o suporte necessário e o respeito aos direitos humanos. Mais do que defender casos individuais, a instituição se mobiliza na construção de soluções coletivas e políticas públicas que deem fim definitivo ao modelo asilar, ainda presente sob outras formas.
Para a Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, a atuação conjunta e a responsabilização compartilhada são vistas como essenciais para que os cidadãos com transtornos mentais sejam acolhidos com dignidade, cuidado e inclusão, rompendo com antigos modelos excludentes e reafirmando os princípios da política antimanicomial.
De acordo com a promotora Micheline Tenório, a Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos em Alagoas identificou situações preocupantes durante fiscalizações realizadas em equipamentos de saúde mental e assistência social no estado. As irregularidades encontradas resultaram na abertura de procedimentos para apuração dos casos e adoção das medidas cabíveis pelo MP/AL.
“As fiscalizações revelaram que a Rede de Atenção Psicossocial é deficitária em todo o estado, tanto em número de equipamentos quanto de pontos de atenção, desde a porta de entrada – as unidades básicas de saúde – até os níveis de maior complexidade, como os leitos de saúde mental em hospitais gerais e os Centros de Atenção Psicossocial tipo III”, explicou. “A escassez de estrutura atinge não só os pacientes com medidas judiciais, mas também a população em geral”, destacou.
REDE DE ASSISTÊNCIA É AINDA MAIS FRAGILIZADA
Ainda conforme a promotora, além da saúde, o setor da assistência social também precisa ampliar sua atuação. A rede da assistência é ainda mais fragilizada, especialmente no que diz respeito aos serviços residenciais terapêuticos e demais pontos de atenção que deveriam oferecer suporte e inclusão. De acordo com o Ministério Público, a responsabilidade sobre a garantia desses direitos é compartilhada entre o estado, os municípios, os familiares e a própria sociedade.
Micheline Tenório enfatizou que o acompanhamento da política antimanicomial em Alagoas é feito de forma integrada por diversas instituições por meio do Comitê Estadual Interinstitucional de Monitoramento da Política Antimanicomial (Ceimpa), órgão vinculado ao Poder Judiciário. O comitê é formado por secretarias estaduais e municipais, Ministério Público, Defensoria Pública, universidades, órgãos de controle social e representantes da sociedade civil organizada.
O Ministério Público de Alagoas, além de ser membro ativo do Ceimpa, mantém uma atuação permanente na fiscalização das políticas públicas ligadas à saúde mental. “A instituição está presente em todo o território alagoano, por meio de suas promotoras e seus promotores de Justiça, que seguem comprometidos com a garantia dos direitos humanos e o fortalecimento da rede de atenção psicossocial”, completou.
Déficit expõe fragilidade da política antimanicomial e populacional em Alagoas

Desinstitucionalização com dignidade
Defensoria Pública acompanha de perto processo de transição do modelo manicomial em Alagoas
Defensores defendem construção de políticas públicas humanizadas e cobram do estado o cumprimento da Lei Antimanicomial e da Resolução 487 do CNJ
A Defensoria Pública do Estado de Alagoas tem atuado firmemente no acompanhamento dos casos de pacientes internados sob medida de segurança no CPJ, especialmente no processo de desinstitucionalização dessas pessoas. A atuação da instituição vai além da defesa individual — que ampara aqueles que não têm condições de contratar um advogado —, alcançando também o campo coletivo, com articulações para a criação de políticas públicas mais humanas e inclusivas.
Segundo os defensores públicos Marcelo Barbosa Arantes e Roberta Gisbert de Mendonça, a maioria das pessoas que estão em processo de desinstitucionalização não foi condenada criminalmente, mas sim considerada inimputável ou semi-imputável, tendo recebido uma medida de segurança e não uma pena. Essa medida consiste, geralmente, na internação por tempo indeterminado.

O desafio, agora, é garantir que os direitos dessas pessoas — especialmente daquelas sem vínculos familiares — sejam respeitados e que elas recebam um tratamento digno, fora dos muros institucionais. “É imprescindível que o estado alinhe o trabalho entre a Secretaria de Saúde e a de Assistência e Desenvolvimento Social. Para quem foi abandonado, a legislação já prevê alternativas, como Residências Terapêuticas [RTs] e inclusivas. Falta efetivar”, explicou a defensora Roberta.
As famílias que ainda mantêm vínculo com os pacientes recebem acompanhamento direto da Defensoria. Já aqueles que não têm mais laços familiares devem ser acolhidos por políticas públicas que garantam moradia, assistência psicossocial contínua e inclusão social.
LONGE DO IDEAL
A Defensoria considera que o estado não cumpre integralmente as obrigações legais previstas na Lei 10.216/2001 e na Resolução 487. Segundo os defensores, ainda há muito a ser construído e efetivado para uma boa assistência em saúde mental, tanto às pessoas em conflito com a lei, como é o caso das que estão internadas no CPJ, como para as demais pessoas com sofrimento mental ou psicossocial.
“Há uma carência enorme no número de CAPS, considerando a relação de equipamentos atualmente disponíveis e a população do estado. Faltam Residências Terapêuticas e, principalmente, residências inclusivas, previstas na Lei Brasileira de Inclusão [Lei 13.146/2015]”, pontuaram.
“Existe ainda uma grande dificuldade de articulação entre a rede de atenção básica e os CAPS, sem contar no grande déficit de leitos psiquiátricos em hospitais gerais, sendo totalmente descabido falar na manutenção de hospitais psiquiátricos para esse tipo de serviço à população, conforme normativas do próprio Ministério da Saúde. A Defensoria Pública, em cada uma dessas frentes, tem acompanhado, cobrado e articulado, especialmente junto ao Poder Executivo, para que essa política pública seja estabelecida de modo minimamente satisfatório em nosso estado”, ressaltaram os defensores Marcelo Barbosa Arantes e Roberta Gisbert de Mendonça.
Apesar dos avanços jurídicos trazidos pela Lei Antimanicomial (Lei 10.216/2001) e pela recente Resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça (2023), o defensor Marcelo Arantes alerta que o cumprimento dessas normas ainda está longe do ideal: “Faltam CAPS, faltam Residências Terapêuticas e, principalmente, faltam residências inclusivas. O que vemos é uma dificuldade real de articulação da rede e a Defensoria tem cobrado isso do Poder Executivo.”
A mensagem é clara: a superação do modelo manicomial é um imperativo legal e ético. E para que essa transição ocorra com respeito à dignidade humana, é preciso mais do que leis — é necessário compromisso político, estrutura adequada e ações integradas entre os diversos setores do estado.
Justiça interdita hospital psiquiátrico e encerra era dos manicômios em Alagoas
Com proibição de novas internações no Centro Psiquiátrico Judiciário, estado inicia transição para modelo de cuidado em liberdade, alinhado à política antimanicomial e aos direitos humanos
Uma mudança profunda está em curso no modo como o estado trata pessoas com transtornos mentais em conflito com a lei. Em setembro de 2023, a Justiça de Alagoas interditou parcialmente o CPJ Pedro Marinho Suruagy, localizado dentro do sistema prisional, proibindo novas internações a partir do dia 4 de agosto daquele ano. A medida cumpriu a Resolução nº 487/2023 do CNJ, que instituiu a Política Antimanicomial do Judiciário brasileiro.

A decisão da 16ª Vara Criminal de Maceió representa mais que uma medida administrativa: marca o início de uma nova era, onde o isolamento e a exclusão dão lugar ao cuidado em liberdade, à inclusão social e à construção de redes de apoio comunitárias. O entendimento é claro: hospitais psiquiátricos não representam mais uma solução legítima — são estruturas que pertencem ao passado e cuja manutenção contraria os princípios básicos dos direitos humanos.
O Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL) afirmou que existe uma rede especializada para atender as pessoas que estavam anteriormente internadas no CPJ Pedro Marinho Suruagy.
“A Rede de Atenção Psicossocial do estado é composta por diversos pontos de atenção estruturados para atender as mais diversas necessidades em saúde do paciente judiciário, dispensando um acompanhamento integral e continuado”, detalhou o TJ/AL.
O Poder Judiciário alagoano também explicou que os pacientes judiciários em cumprimento de medida de segurança no CPJ foram submetidos ao estudo biopsicossocial realizado pela Equipe de Acompanhamento ao Paciente Judiciário (EAP Desinst/Sesau) recebendo assim o Plano Individualizado de Desinstitucionalização.
Os pacientes com referência familiar, acrescentou o Tribunal, retornaram ao convívio familiar e comunitário e estão em acompanhamento nos Centros de Atenção Psicossocial de seu território, os sem referência familiar – um total de 33 pacientes – serão acolhidos em serviços residenciais de moradia assistida integrante da RAPS, denominados Residências Terapêuticas (RTs), previstas para serem entregues até julho deste ano. O cuidado em saúde será realizado pelo CAPS de referência. Por enquanto, esses 33 pacientes permanecem aguardando no CPJ.
Em janeiro do ano passado, eram 93 custodiados, pessoas em sofrimento mental que entraram em conflito com a Lei e estavam em tratamento no CPJ Pedro Marinho Suruagy.
Ainda conforme o Tribunal de Justiça, os pacientes judiciários submetidos a medidas de segurança são usuários dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Esses indivíduos necessitam de acompanhamento contínuo para garantir sua reinserção social e comunitária, assim como qualquer outro cidadão que apresente necessidades e vulnerabilidades semelhantes. A criação de unidades específicas para esse público poderia caracterizar uma grave violação dos Direitos Humanos.
“A reintegração social é o objetivo fim da medida de segurança, e será alcançada conforme a singularidade de cada paciente judiciário, considerando suas potencialidades, habilidades e limitações funcionais”, salientou o TJ/AL.
Na avaliação do Tribunal, a RAPS foi estruturada para permitir que pessoas em sofrimento mental recebam uma assistência integral à saúde em seu território, no convívio comunitário e familiar, sendo a internação o último recurso a ser buscado como forma de tratamento.
“Os pacientes judiciários serão encaminhados para a Rede de Atenção Psicossocial do território ao qual estão vinculados, sendo os Centros de Atenção Psicossocial os ordenadores do cuidado”, resumiu o Poder Judiciário alagoano.

Sem o devido acompanhamento médico e tratamento contínuo, pessoas ainda mais vulneráveis
Para o Conselho Federal de Medicina (CFM), nem o sistema prisional comum nem o sistema público de saúde têm estrutura suficiente para receber essa população de forma adequada. A preocupação é que, sem o devido acompanhamento médico e sem tratamento contínuo, essas pessoas fiquem ainda mais vulneráveis, podendo gerar situações de violência, reincidência criminal e abandono completo do cuidado com a saúde mental.
Hospitais psiquiátricos são considerados obsoletos e violadores de direitos
Em breve, não haverá mais o tratamento em isolamento, fechado em uma instituição asilar. Para a Justiça, todos os hospitais psiquiátricos, são estruturas ultrapassadas, obsoletas, que ferem os Direitos Humanos.
A Resolução 487 do CNJ, de 15 de fevereiro de 2023, estabelece que a autoridade judicial tem um prazo de seis meses para determinar a interdição parcial dos estabelecimentos congêneres de custódia e tratamento psiquiátrico no país. Além disso, em até 12 meses, estas instituições deverão ser interditadas totalmente, encerrando suas atividades.
Com a interdição parcial do Centro Psiquiátrico Judiciário de Alagoas, o estabelecimento não poderá receber novas internações, sendo a internação compulsória cumprida em leito de saúde mental em Hospital Geral ou outro estabelecimento de saúde pública referenciado pelo Centro de Atenção Psicossocial da Rede de Atenção Psicossocial.
A medida de internação só deverá ocorrer em casos excepcionais, após elaboração de um laudo biopsicossocial por profissionais de saúde. O local para o qual a pessoa com transtorno mental em conflito com a lei será encaminhada será determinado pelo juiz que decretar a sentença.
Ainda conforme a regulamentação do CNJ, bem como a Lei Federal 10.216/2001, após a alta hospitalar, o acompanhamento psicossocial poderá continuar nos demais dispositivos da Rede de Atenção Psicossocial, em meio aberto.
De acordo com a assessoria de comunicação da Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (Seris), a mudança segue uma determinação do Conselho Nacional de Justiça. Em Alagoas, desde agosto do ano passado, ocorrem reuniões entre as instituições responsáveis e também com instituições da sociedade civil.
Desde agosto de 2023, os manicômios judiciais existentes no Brasil suspenderam a entrada de novos pacientes. E, até maio de 2024, todos os estabelecimentos deverão ser desativados, em definitivo. Ou pelo menos deveriam ter sido. É isso o que determina a resolução 487/23 do CNJ. O texto estabelece procedimentos e diretrizes para efetivar, no Judiciário brasileiro, a política antimanicomial.
A proposta foi instituída em 2001 pela Lei 10.216, mas, na prática, pessoas consideradas inimputáveis pela Justiça e que foram sujeitas a alguma medida de segurança continuaram a ser encaminhadas para instituições conhecidas por HCTPS – Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico.
A lei de nº 10.216/2001 dispõe sobre a proteção e os direitos às pessoas com transtornos mentais e reforça a necessidade da aplicabilidade de um modelo diferenciado para assistência em saúde mental.
O propósito é cuidar permitindo que esse público seja beneficiário de um atendimento qualificado e humanizado, possibilitando a minimização do agravamento da doença. Também é preciso realçar que o SUS assegura a prestação de serviços em todas as áreas, inclusive em forma de prevenção.
Com o fechamento dos hospitais psiquiátricos, o destino dos custodiados e daqueles que aguardam julgamento tornou-se objeto de intenso debate. Assim, a resolução do CNJ, criada após um lapso temporal de 22 anos, foi editada a fim de dar efetividade à política antimanicomial prevista na Lei.
Para garantir o tratamento psiquiátrico após a extinção dos manicômios judiciários, a resolução trouxe a figura das Redes de Atenção Psicossocial.
Assim, a resolução aponta os serviços que compõem as RAPS: CAPS; Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT); Centros de Convivência e Cultura, as Unidades de Acolhimento (UAs); e leitos de atenção integral (em Hospitais Gerais, nos CAPS III), presentes na Atenção Básica de Saúde, na Atenção Psicossocial Estratégica, nas urgências, na Atenção Hospitalar Geral, na estratégia de desinstitucionalização, como as Residências Terapêuticas, o Programa de Volta para Casa (PVC) e estratégias de reabilitação psicossocial.
Caberá ao Judiciário e ao SUS, conforme a resolução, cooperarem para a transferência dos pacientes às RAPS. Nelas, os pacientes terão plano terapêutico singular elaborado e a escolha do tratamento feita por equipe multidisciplinar.
Segundo o documento, as internações não foram abolidas, mas deverão ser determinadas de acordo com a prescrição médica e quadro clínico da pessoa, por uma equipe de saúde, tirando do juiz a possibilidade de definir se o indivíduo será internado ou não.
Hospital Escola Portugal Ramalho: o presente e o futuro da saúde mental em Alagoas
Um novo Hospital Escola Portugal Ramalho (HEPR), única unidade hospitalar psiquiátrica da rede pública de Alagoas, será construído no bairro de Jaraguá, em Maceió, e abrigará os pacientes do atual que, hoje, funciona de forma precária, no Farol. A unidade mudará de endereço devido ao afundamento do solo causado pela Braskem.
Até o momento, sem data certa para mudança, já que dependem da construção do novo, pacientes, familiares de pacientes e funcionários do Hospital Escola Portugal Ramalho estão na expectativa para a transferência para o novo endereço.

Ainda em agosto de 2023, os deputados estaduais aprovaram o projeto de lei que autoriza o estado a doar terreno para construir o novo Hospital Escola Portugal Ramalho. O texto autoriza também a alienação ou doação de prédios públicos para realocação das escolas estaduais afetadas pelo afundamento do solo no Pinheiro, em Maceió.
Dias depois, já no início de setembro de 2023, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) e a Universidade Estadual de Ciências da Saúde (Uncisal) anunciaram mudanças na atenção psicossocial. À época, o secretário de Estado da Saúde, Gustavo Pontes de Miranda, anunciou que Alagoas terá 98 novos leitos para ampliar a Rede de Atenção Psicossocial.
O projeto de lei é de autoria do governo de Alagoas e tem o objetivo de realocar os prédios públicos atingidos pela mineração feita pela empresa Braskem.
O HEPR está com sua estrutura comprometida apresentando rachaduras por conta do afundamento de solo provocado pela Braskem e está, há anos, com recomendação técnica de ser abandonado.
A assistente social e supervisora do HEPR, Maria Derivalda Andrade, afirmou que o novo Hospital Escola Portugal Ramalho pretende continuar o atendimento de emergência psiquiátrica.
Segundo ela, o Núcleo de Saúde Mental da Uncisal irá definir se o equipamento irá também atender outras demandas como hospital especializado com leitos de saúde mental.
A supervisora da unidade psiquiátrica disse ainda que que está sendo discutido pelo Núcleo de Saúde Mental da Uncisal uma unidade de emergência psiquiátrica – para o manejo do paciente em crise. “Porém, tais discussões serão pactuadas com o Grupo Condutor da RAPS, responsável pelo desenho e redesenho.”
Conforme Maria Derivalda Andrade, a proposta é que as internações sejam breves para a continuidade do cuidado no território. Fazem parte do eixo básico da proposta as práticas integrativas e complementares no SUS, a Política Nacional de Humanização e o Cuidado Interprofissional com as famílias numa perspectiva de Clínica Ampliada.
O HEPR é uma unidade assistencial da Uncisal e é referência na prestação de serviços na área da saúde mental no estado.
Os pacientes aguardarão a transferência definitiva. “Todos nós estamos sob estresse desde o final de 2020. Os pacientes e seus familiares estão temerosos. Os funcionários também, já que toda a área ao entorno está desocupada”.
Unidade psiquiátrica possui 160 leitos
Em janeiro deste ano, o HEPR completou 69 anos. A unidade psiquiátrica possui 160 leitos para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas em situações de urgência e emergência psiquiátrica. Entre os leitos, há residentes em situação de abandono familiar. Trabalham no Hospital cerca de 400 funcionários.
O HEPR funciona como emergência psiquiátrica, com equipe multidisciplinar e em regime de 24 horas. É o único a atender emergências psiquiátricas. Além da estrutura hospitalar, possui dois Centros de Atenção Psicossocial (CAPS Casa Verde e CAPS AD) e um Ambulatório de Especialidades em Saúde Mental (Pisam).
Conforme o Serviço Geológico do Brasil, a mineração feita pela Braskem para extração de sal-gema, um tipo de cloreto de sódio utilizado na fabricação de soda cáustica e PVC, provocou o problema de rachaduras na estrutura, comprometendo a integridade física do prédio.
O fenômeno geológico se agravou em 2018, com um tremor de terra e surgimento de rachaduras no bairro do Pinheiro. A partir daí, o problema se espalhou e atingiu bairros vizinhos, Mutange, Bebedouro e Bom Parto. No final de 2020, parte do bairro do Farol, onde fica o Hospital Escola Portugal Ramalho, também entrou no mapa de monitoramento.
Os equipamentos de saúde mental da Uncisal encontram-se inseridos na área de monitoramento – criticidade 00 e 01 – situando-se em um dos bairros afetados devido à exploração de sal-gema pela empresa petroquímica Braskem.
O nível crítico da área de monitoramento foi definido pelo Mapa de Linhas de Ações Prioritárias, produzido pelas Defesas Civis do Município de Maceió e Nacional, com apoio do Serviço Geológico do Brasil.
De acordo com o HEPR, a situação da área de criticidade da unidade vem sendo discutida desde 2021 quando ficou acordada a construção de novas e modernas infraestruturas a serem entregues à sociedade alagoana.
À época foi solicitada a inclusão do HEPR no Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF) da Braskem.
A Defesa Civil de Maceió disse que aproximadamente 50% da área em que o Portugal Ramalho está situado sofre com a movimentação do solo. A cada trimestre, a unidade de saúde recebe visita técnica da Defesa Civil.
Hospital Escola opera dentro da capacidade contingenciada
O Hospital Escola Portugal Ramalho, referência no atendimento psiquiátrico em Alagoas, equipamento essencial na assistência em saúde mental do estado, tem atualmente 111 pacientes internados e opera dentro de sua capacidade contingenciada, apesar de ter 160 leitos habilitados.
De acordo com Helcimara Martins Gonçalves, diretora-geral do Hospital Escola Portugal Ramalho, a unidade de saúde funciona como a única emergência psiquiátrica do estado e é 100% SUS, enfrentando desafios estruturais que limitam sua ocupação plena. No entanto, ela ressalta que, mesmo diante das dificuldades, continua sendo fundamental para garantir o atendimento a pessoas com transtornos mentais graves e em crise.
SERÁ FECHADO?
Essa é uma das principais dúvidas que surgiram nos últimos meses, mas a direção do hospital garante que o fechamento não está nos planos. “Pelo contrário, a unidade será substituída por um novo hospital psiquiátrico, que será construído pela Braskem, garantindo não apenas a continuidade do atendimento, mas também a ampliação e modernização da estrutura de assistência em saúde mental”, frisou.

“Além disso, há uma perspectiva de mudança no perfil assistencial da unidade, o que será definido com base em estudos detalhados para identificar as principais demandas da população. Esse planejamento será conduzido pela Uncisal, responsável pelo hospital, em conjunto com especialistas da área técnica”, ressaltou.
REDE DE APOIO AINDA INSUFICIENTE
Embora existam serviços especializados na RAPS, como os CAPS, Unidades de Acolhimento, Leitos de Psiquiatria em Hospitais Gerais e Residências Terapêuticas, segundo Helcimara Martins Gonçalves, Alagoas ainda não possui uma rede territorial estruturada para atender toda a demanda.
“Essa falta de estrutura reforça a importância do Hospital Portugal Ramalho, que continua sendo a principal porta de entrada para pacientes em crise psiquiátrica. Enquanto a rede não é fortalecida, muitos pacientes dependem da internação para estabilizar seus quadros clínicos”, observou.
ACOMPANHAMENTO PÓS-ALTA E DESAFIOS NA TRANSIÇÃO
Ainda conforme a diretora, o acompanhamento de pacientes após alta hospitalar é um desafio constante. Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e CAPS são os responsáveis por esse monitoramento, mas a equipe multidisciplinar do hospital desempenha um papel fundamental nesse processo, garantindo um retorno seguro ao lar e a continuidade do tratamento.
“A grande maioria dos pacientes permanece internada apenas pelo tempo necessário para estabilizar o quadro clínico, sendo posteriormente encaminhada para acompanhamento ambulatorial. No entanto, a transição para novas formas de atendimento ainda precisa ser aprimorada, respeitando as necessidades individuais de cada paciente e garantindo sua reinserção social com suporte adequado”, explicou.
O FUTURO DA SAÚDE MENTAL EM ALAGOAS
Para Helcimara Martins Gonçalves, a construção da nova unidade hospitalar representa um passo importante para a modernização da assistência em saúde mental no estado, mas ainda há muito a ser feito para fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial.
“Sem um sistema estruturado de suporte comunitário, muitos pacientes continuarão dependendo das internações prolongadas, o que sobrecarregará o hospital e dificultará o tratamento adequado”.
“O desafio agora é garantir que o novo hospital seja acompanhado de políticas públicas eficazes para expandir e fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial, garantindo um atendimento humanizado e contínuo para todas as pessoas que precisam de suporte em saúde mental”, completou.
Projeto de Lei vem atender pedido de anos do Ministério Público de Alagoas
O Projeto de Lei de autoria do governo vem atender ao pedido feito há anos pelo Ministério Público de Alagoas, solicitando medidas emergenciais para a realocação do HEPR. A unidade passa por um lento processo de afundamento do solo em Maceió.
O pedido foi feito após o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (NDDH) do órgão analisar um relatório que classifica as condições estruturais da unidade hospitalar como risco à vida de pacientes e profissionais da saúde. O documento foi elaborado a partir de uma inspeção da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Alagoas (OAB/AL), do Conselho Regional de Enfermagem (Coren/AL) e do Fórum de Saúde Mental de Maceió.
A Lei 10.216/2001 estabelece normas sobre os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e regula os tipos de internações psiquiátricas. De acordo com o artigo 6º da Lei, a internação só pode ser feita se houver laudo médico que a justifique, com a descrição dos motivos.
O Movimento da Luta Antimanicomial lembra que, como todo cidadão, estas pessoas têm o direito fundamental à liberdade, o direito a viver em sociedade, além do direto a receber cuidado e tratamento sem que para isto tenham que abrir mão do seu lugar de cidadãos.
A internação pode acontecer sob três requisitos. O primeiro é a internação voluntária (aquela que se dá com o consentimento do usuário), o segundo é por internação involuntária (aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiros) e, por fim, a internação compulsória (aquela determinada pela Justiça).
Secretaria Municipal de Saúde de Maceió – Na capital, a Secretaria de Saúde afirmou que está junto ao Poder Judiciário nesse processo de transição para o fechamento do manicômio judiciário. Alguns pacientes que eram pacientes do local já estão retornando para suas famílias e vão continuar sendo atendidos pela Rede de Atenção Psicossocial, como é o caso dos CAPS.
“As pessoas que não têm mais referência familiar ou estão impossibilitadas de retornar para suas famílias irão para as Residências Terapêuticas que serão implantadas para recebê-las. Paralelamente, o município vem buscando o investimento para a construção de novos CAPS e ampliação da rede”, finalizou a nota.
Centro Psiquiátrico Judiciário fecha ainda neste semestre
O presidente do TJ/AL, Fábio Bittencourt, discutiu, no mês de março, em uma reunião, o cumprimento da política antimanicomial instituída pelo CNJ.
“São diversas pessoas que se encontram em situação de medida de segurança, de internamento, e o CNJ determinou que fosse dado fim aos manicômios para essas pessoas serem encaminhadas a casas terapêuticas. Vamos tentar, junto ao governo, instituir essa política”, afirmou o desembargador.

O CPJ de Alagoas não recebe novos casos de cumprimento de medida de segurança provisória ou definitiva desde setembro de 2023. Ainda se encontram nas dependências do CPJ 45 pessoas, segundo o juiz Yulli Roter, coordenador do Grupo Interinstitucional de Atenção à Saúde Mental do TJ/AL.
“A ideia é que o fechamento do Centro ocorra ainda neste primeiro semestre. Algumas dessas pessoas voltam para o convívio familiar e outras vão para Residências Terapêuticas”, explicou. Ainda de acordo com o magistrado, a associação encarregada da gerência dessas residências já foi contratada.
“Falta agora o cofinanciamento entre estado e município”. A questão da assistência a pacientes portadores de doenças psiquiátricas vem sendo alvo de muitas discussões entre profissionais da área, autoridades e a população em geral.
Uma nova reunião para tratar do assunto será marcada no TJ/AL, com representantes do Ministério Público e da Defensoria. O tema também deve ser levado pelo presidente Fábio Bittencourt ao governador Paulo Dantas.
Psicóloga defende acompanhamento ainda maior em Rede de Atenção Primária
A psicóloga Cristina Rocha trabalha no CAPS Rostan Silvestre, na Jatiúca. No local, são atendidas de 40 a 50 pessoas por dia. Todos são adultos e moradores dos bairros de Ipioca até o Pontal da Barra.
São usuários com transtorno mental grave, severo e persistente, no momento da crise. O atendimento é realizado, minimamente, duas vezes por semana.
A psicóloga defendeu um acompanhamento ainda maior na Rede de Atenção Primária de saúde. “Os pacientes com transtornos mentais têm também, claro, todos os problemas físicos que as demais pessoas. São também pacientes cardíacos, com pressão arterial elevada e que podem, eventualmente, precisar de uma cirurgia ortopédica, por exemplo”.

Sobre os usuários em conflito com a Lei, um ponto foi observado pela psicóloga: alguns detalhes ainda precisam ser acertados. “Somos serviços de saúde, não temos o preparo dos serviços de segurança pública. Portanto, precisaremos ter esse suporte”, considerou.
Conforme a psicóloga, o trabalho multidisciplinar para ter um alcance ainda maior precisa contar também com a ajuda dos usuários e seus familiares. Via de regra, acrescentou Cristina Rocha, as mulheres aderem mais ao tratamento do que os homens.
Ampliar a rede de atendimento e aumentar o horário de funcionamento para 24 horas são algumas das necessidades apontadas pela profissional. “A Prefeitura de Maceió já avançou muito, mudanças importantes e significativas já foram alcançadas, mas faltam alguns passos ainda. Em especial, no atendimento a alguns usuários que perderam vínculos familiares”, pontuou.
A psicóloga citou alguns problemas que dificultam a adesão ao tratamento como problemas de locomoção ou até mesmo a percepção pessoal sobre o tratamento.
A usuária Maria José da Conceição, 50 anos, casada e com filhos, mora no bairro de Cruz das Almas, e é um exemplo de que o tratamento traz resultados.
Há 17 anos, ela está em acompanhamento depois que teve um surto psicótico ao saber que o ex-marido e pai da sua única filha, até então, matou a menina de três anos espancando-a e estrangulando-a até sua morte.

“Ele fez isso para se vingar de mim. Por anos, me senti culpada. Carreguei para mim o peso do crime que ele cometeu. Ele foi preso. Depois foi solto e eu fiquei em uma prisão mental, achando que eu era a criminosa. Ele acabou com a vida da minha filha e com a minha vida”, recordou.
Ao iniciar o tratamento, Maria José da Conceição estava extremamente doente mentalmente. Hoje consegue sorrir e andar de cabeça erguida. “Voltei a viver. Consegui entender que eu não tive culpa. O crime foi cometido nos dias em que ele estava com a minha filha, devido à visita paterna conquistada na Justiça. Nunca esqueço da minha filha. Vou levar a dor até o último dia da minha vida, mas agora a dor não é mais dona da minha vida, faz parte da minha vida, da minha história”, contou, emocionada. Ela casou e foi mãe novamente.
O vigilante Ericsson Tadeu Sabino de Melo, 56 anos, teve quadros de depressão e ansiedade ao passar por uma mudança brusca no setor em que trabalhava.
“Antes de entrar no fundo do poço, eu mesmo resolvi procurar ajuda. Não deixe para acontecer o pior, não espere a depressão tomar conta da sua vida”, ensinou.

Ele contou que no CAPS é bem atendido e se sente acolhido. Ele destacou o “excelente trabalho” feito pela equipe multidisciplinar.
O Tribunal de Justiça de Alagoas explicou que existe uma rede especializada para atender pessoas egressas dos hospitais psiquiátricos, a RAPS.
A Rede é composta por diversos pontos de atenção estruturados para atender as mais diversas necessidades em saúde do paciente judiciário, dispensando um acompanhamento integral e continuado.
A reintegração social, explicou o Tribunal de Justiça, é o objetivo fim da medida de segurança, e será alcançada conforme a singularidade de cada paciente judiciário, considerando suas potencialidades, habilidades e limitações funcionais.
Hospital Ib Gatto Falcão dobra capacidade de ala psiquiátrica
O governo do Estado garantiu, no início de abril deste ano, que o Hospital Ib Gatto Falcão dobrasse a capacidade da ala psiquiátrica para fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial.
Conforme o governo, a unidade conta com equipe multidisciplinar reforçada e espaços adequados para terapias, reabilitação e acompanhamento dos pacientes. A ala de psiquiatria do Hospital Ib Gatto Falcão passa a contar com 12 leitos psiquiátricos e dois leitos de estabilização.

O Hospital Ib Gatto Falcão, referência em atendimento na região de Rio Largo, deu um passo importante no fortalecimento da assistência em saúde mental no estado. A unidade é vinculada à Sesau.
A ampliação representa a consolidação da Rede Estadual de Atenção Psicossocial. Segundo o diretor-geral da unidade, Graciliano Ramos, a ampliação representa um avanço significativo na valorização da saúde mental como componente essencial da saúde pública. Para ele, o aumento do número de leitos psiquiátricos significa um marco para a unidade hospitalar.
Ainda segundo Graciliano Ramos, a unidade conta atualmente com sete especialistas em saúde mental, entre supervisores plantonistas com cargas horárias de 12 e 24 horas, preparados para atender qualquer paciente que chegue à unidade.
A ampliação integra um conjunto de investimentos estratégicos do governo de Alagoas na área da saúde, com foco na humanização dos serviços e na ampliação do acesso ao cuidado especializado, especialmente em áreas sensíveis, como a saúde mental.
Conselho Regional de Psicologia – Para o Conselho Regional de Psicologia, o processo é longo e necessita que a RAPS esteja preparada para acolher e acompanhar estes usuários. Depois de tantos anos em que a Reforma Psiquiátrica avançou na criação de vários serviços, os manicômios judiciários ficaram “esquecidos”, então, é necessário que se olhe para esta clientela criando estratégias para um atendimento efetivo; as Residências Terapêuticas podem ser uma delas e vem sendo utilizada para a desinstitucionalização de pacientes residentes nos hospitais psiquiátricos.
Implantação da Rede de Atenção Psicossocial com foco na desinstitucionalização
A coordenadora da RAPS da Sesau, a assistente social Tereza Cristina Tenório, afirmou que o estado de Alagoas segue avançando na desinstitucionalização de pessoas em sofrimento mental e na implantação das Residências Terapêuticas (RTs), conforme o cronograma previsto. Segundo ela, os planos de desinstitucionalização já foram concluídos e os termos de colaboração entre Sesau, SMS e a instituição responsável pela implantação e gestão dos serviços foram assinados.
"Estamos finalizando os últimos trâmites burocráticos para que a implantação das RTs seja efetivada. O nosso esforço é garantir que tudo ocorra dentro do tempo previsto", afirmou Tereza Cristina.

A estruturação da RAPS em Alagoas considera o porte populacional dos municípios e as necessidades regionais. Desde 2023, com a vigência da Resolução 487 do CNJ, as ações de capacitação e expansão da rede foram intensificadas, com recursos federais ampliados, apoio do programa Novo Plano de Aceleração do Crescimento para construção de novos CAPS e parcerias com o Ministério da Saúde e a Fiocruz.
Entre os avanços, Tereza destacou a capacitação “Nós na Rede”, que vai formar mais de 2.100 profissionais em todo o estado; a formação de 900 trabalhadores em manejo de crises por meio da Supervisão de Atenção Psicossocial (SUAP) da Sesau; além da ampliação de leitos de saúde mental no Hospital da Criança e no Hospital Ib Gatto, em Rio Largo, com Murici reabrindo seus leitos e Penedo iniciando processo de implantação. Outros municípios também manifestaram interesse.
A equipe técnica da SUAP, por meio da EAP Desinstitucionalização (EAP Desinst), atua em três frentes: desinstitucionalização, monitoramento e avaliação. Os usuários egressos de instituições são acompanhados por CAPS e unidades de saúde.
Tereza Cristina reforçou que a proposta da RAPS não se limita à ampliação de estruturas, mas representa uma mudança cultural profunda. “A sociedade ainda carrega o estigma de que pessoas com transtorno mental são perigosas. Esse preconceito precisa ser superado. A RAPS não é para isolar, mas para cuidar em liberdade, com projetos terapêuticos singulares e integração social”, enfatizou.
A coordenadora ressaltou que a convivência simultânea dos dois modelos – o manicomial e o da atenção psicossocial – impede que os investimentos sejam totalmente direcionados para a RAPS. “A rede só será efetivamente ampliada quando os manicômios forem extintos. O cuidado em liberdade, previsto no SUS, deve ser prioridade”, concluiu.
Segundo ela, a responsabilidade penal de pessoas com transtornos de personalidade que cometem crimes deve seguir o sistema prisional, enquanto a RAPS acolhe e trata quem precisa de cuidados por transtornos mentais que se agravaram por ausência de assistência adequada.
A expectativa é de que, com os esforços em curso, Alagoas avance de forma sólida na consolidação de um modelo de saúde mental humanizado, descentralizado e livre de estigmas.
Encerramento de hospitais psiquiátricos preocupa entidades médicas
A decisão do CNJ de desativar os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico tem gerado apreensão entre médicos, especialistas e entidades da saúde. Para o Conselho Federal de Medicina (CFM), a medida pode agravar ainda mais a situação de milhares de pessoas com transtornos mentais que cumprem medida de segurança após cometerem crimes.
“O fechamento pode colocar em risco tanto os pacientes quanto a população, devido à falta de estruturas adequadas para o tratamento de pessoas com transtornos mentais em conflito com a lei”, alertou o presidente do CFM, José Hiran Gallo.
Segundo ele, a decisão foi tomada sem ouvir os profissionais da área médica — justamente os que lidam diretamente com essa realidade. “O segmento médico, uma das partes mais importantes envolvidas no processo, não foi consultado. Os impactos serão graves, afetando os serviços de saúde mental e a segurança pública. O Brasil está diante de uma situação calamitosa e urgente”, destacou.
EMERGÊNCIAS SOBRECARREGADAS
O psiquiatra alagoano Emmanuel Fortes Cavalcanti, terceiro vice-presidente do CFM, reforça a preocupação. Segundo ele, a redução dos leitos psiquiátricos e o fechamento dos HCTPs têm sobrecarregado as emergências dos hospitais gerais, que não estão preparados para acolher pacientes com transtornos mentais severos.
“Essa é uma situação que traz insegurança tanto para os pacientes quanto para os profissionais de saúde. Essas pessoas não recebem a atenção adequada e ainda geram um sentimento de vulnerabilidade nos espaços de atendimento”, disse Fortes. “A linha do bom senso mostra que o hospital psiquiátrico é necessário, assim como ambulatórios específicos para o tratamento de doenças mentais.”
O CFM e outras entidades médicas se manifestaram oficialmente contra a resolução do CNJ e reafirmaram o compromisso de defender o direito à saúde mental dos brasileiros. “Seguimos ao lado da sociedade, nos posicionando contra qualquer retrocesso, por meio de campanhas, ações judiciais e extrajudiciais. Nosso objetivo é proteger a saúde pública, a medicina psiquiátrica e, principalmente, os pacientes que mais precisam”, concluiu Fortes.