Dor crônica: o drama de mulheres que vivem com fibromialgia

Em Alagoas, não há dados oficiais sobre a quantidade de pacientes, tanto pela subnotificação - uma vez que muitas pessoas com a doença não procuram diagnóstico médico - quanto por não terem o diagnóstico confirmado

Por Lucas França e Valdete Calheiros - Repórteres / Bruno Martins: Revisão | Redação

Não há dados oficiais sobre a quantidade de pessoas com fibromialgia em Alagoas. Estudos mostram que cerca de 2,5% da população brasileira está acometida pela doença, mas não há registros oficiais com o número exato destas pessoas – nem no Brasil, nem no Nordeste.

A razão para essa imprecisão é multifatorial: subnotificação, uma vez que muitas pessoas com fibromialgia não procuram diagnóstico médico ou não têm o diagnóstico confirmado, o que subestima o número real de casos; a dificuldade de diagnóstico, já que a fibromialgia é uma doença complexa e muitas vezes subdiagnosticada, pois seus sintomas podem ser confundidos com outras condições; e a falta de estudos epidemiológicos. Embora existam alguns estudos, a pesquisa sobre a prevalência da fibromialgia ainda é limitada em muitas regiões.

A presidente e fundadora da Afibal – Associação dos Fibromiálgicos de Alagoas, Arivane de Araújo Costa, explicou que a entidade precisa ser fortalecida para contribuir e ampliar o debate sobre a inclusão, o acesso a tratamentos e políticas públicas voltadas para essas pessoas.

A Afibal é uma entidade estadual sem fins lucrativos, fundada no dia 7 de agosto de 2014, com o objetivo de promover políticas públicas e acolher pessoas diagnosticadas com fibromialgia no estado de Alagoas. Com quase 10 anos de atuação, tem trabalhado para conscientizar a população sobre essa condição de saúde e garantir qualidade de vida para os pacientes.

A entidade está precisando de ajuda para adquirir uma sede própria e conseguir prestar um melhor atendimento aos seus associados. A Afibal representa as pessoas com fibromialgia no Conselho Estadual de Saúde de Alagoas (CES/AL). Quem quiser e puder ajudar, o número de contato é (82) 98830-3025.

“A Afibal presta orientação, acolhimento e atua na defesa dos direitos das pessoas com fibromialgia em Alagoas. Entre nossas principais ações, destaca-se a orientação sobre direitos: informamos sobre os benefícios garantidos por lei para pessoas com fibromialgia, oferecemos apoio para quem precisa, ouvindo e ajudando cada associado com acolhimento e suporte. Atuamos com representação política ao participarmos de reuniões com secretários de saúde e autoridades para exigir melhorias no atendimento e nas políticas públicas”, relacionou a presidente da Afibal, Arivane de Araújo Costa.

A entidade presta ainda apoio no acesso a benefícios públicos, como carteira de deficiência gratuita para transporte público coletivo municipal (com o Departamento Municipal de Transportes e Trânsito de Maceió - DMTT), cartão preferencial de deficiente para estacionamento (DMTT), carteira de deficiência preferencial para filas e RG de fibromialgia.

Cartão preferencial para estacionamento (Foto: Ascom DMTT - Arquivo)

Como no momento a Afibal está sem sede própria – a antiga era alugada e não houve mais condições de arcar com os custos do aluguel – as reuniões estão acontecendo de forma virtual.

Quem quiser se tornar associado da Afibal pode enviar para o WhatsApp da entidade (82) 98830-3025 os seguintes documentos: RG, CPF, comprovante de residência, laudo médico confirmando a fibromialgia e o comprovante de contribuição mensal no valor de R$ 30. O valor deve ser pago através da chave Pix CNPJ: 24.680.632/0001-01.

A diretora da Afibal, Ana Lydia Vasco de Albuquerque Peixoto, explicou que a fibromialgia foi incluída no Catálogo Internacional de Doenças apenas em 2004 (CID 10 M 79.7). A fibromialgia é uma doença multifatorial de causa ainda desconhecida que acomete o funcionamento do sistema nervoso central e o mecanismo de supressão da dor.

Diretora da Afibal, Ana Lydia Vasco de Albuquerque Peixoto (Foto: Arquivo pessoal)

FIBROMIALGIA E SUAS CARACTERÍSTICAS

A doença é caracterizada pela manifestação de dor crônica generalizada e recidivante, que se manifesta especialmente nos tendões e nas articulações. Dentre os sintomas sindrômicos estão: sensibilidade ao toque, síndrome do intestino irritável, sensação de pernas inquietas, dores abdominais, queimações, formigamentos, dificuldades para urinar, cefaleia, cansaço, sono não reparador, variação de humor, insônia, falta de memória e concentração, transtorno de ansiedade e depressão, dentre outros.

Paciente com fibromialgia recebeu diagnóstico aos 33 anos

A servidora pública Karla Santos de Oliveira tem 49 anos e recebeu a confirmação do diagnóstico aos 33. Com sintomas generalizados e muito singulares, ela diz que tem uma relação muito desafiadora com a fibromialgia.

O controle dos sintomas é possível através de terapia, atividades físicas e medicação. Mãe de uma menininha de cinco anos, ela explicou que já chegou a limitar a vida social, familiar e profissional por conta dos sintomas.

“A terapia tem ajudado e eu tenho conseguido entender os gatilhos e assim melhorar.” Karla Santos de Oliveira deixou um conselho a quem, como ela, se descobre com fibromialgia: “não é uma sentença, é o início de um caminho de autoconhecimento, autocuidado e necessidade de se priorizar”, concluiu.

Karla Santos de Oliveira tem 49 anos e recebeu a confirmação do diagnóstico aos 33 (Foto: Arquivo pessoal)

SECRETARIAS DE SAÚDE

A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Maceió afirmou que, ainda este ano, será implantada uma rede de cuidados com a doença.

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) destacou que a fibromialgia é uma condição que não é de notificação compulsória. A Secretaria conta com um cadastro de 800 pacientes para receber a carteira para pessoas portadoras de fibromialgia. No entanto, a pasta presume que o número seja maior, uma vez que há pessoas não diagnosticadas ou que não procuraram tratamento.

“O tratamento da fibromialgia é individualizado e não propõe sua cura. O objetivo é a redução do sofrimento de seus portadores, a melhora da funcionalidade e, na medida do possível, da autonomia pessoal e da qualidade de vida. No caso do Sistema Único de Saúde (SUS), a assistência ao paciente com fibromialgia ocorre em rede, ou seja, nas esferas municipal, estadual e federal. Primeiro, o paciente deve passar por uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do município de residência, cujo médico que o atender irá encaminhá-lo para assistência especializada, com reumatologia para o tratamento da dor e inflamação muscular; neurologia para a avaliação de possíveis distúrbios no sistema nervoso; psicologia para o suporte emocional e manejo do estresse; e fisioterapia, com o objetivo de melhorar a mobilidade e reduzir a dor muscular, entre outros. Esses encaminhamentos garantem que o paciente receba um tratamento multidisciplinar adequado às suas necessidades e podem ocorrer em unidades de saúde municipais, estaduais e federais, dependendo do encaminhamento do médico da Atenção Primária em Saúde e da existência de vagas na Rede SUS, cujo agendamento ocorre por meio da Central de Regulação”, detalhou.

No ano passado, a Sesau, em parceria com a Secretaria de Estado da Cidadania e da Pessoa com Deficiência (Secdef), passou a emitir a carteira para pacientes com fibromialgia nos Centros de Referência da Assistência Social (Cras), nas Secretarias Municipais de Assistência Social (Semas) e nas Centrais JÁ! de Maceió, situadas no Centro, Benedito Bentes e no Maceió Shopping. Para isso, é necessário apresentar o RG, CPF, Foto 3x4, Comprovante de tipo sanguíneo, Comprovante de residência, Número de telefone e o Laudo médico com CID e descrição da condição.

'O tratamento da fibromialgia é individualizado e não propõe sua cura. O objetivo é a redução do sofrimento de seus portadores, a melhora da funcionalidade e, na medida do possível, da autonomia pessoal e da qualidade de vida' - Sesau

Alagoanas com fibromialgia falam como é viver com as dores intensas

Há oito anos com a doença, a dona de casa Eluza Barbosa Custodio Ferreira, 57 anos, comenta que não foi fácil chegar ao diagnóstico e que a situação piorou devido a outras enfermidades já existentes. “Quando fiz uma bateria de exames mais profunda, mais séria, descobri a fibromialgia. Até então, achava que estava com alguma doença autoimune no fígado. Só a partir desses exames foi que tivemos a certeza do diagnóstico. As pessoas acham que é uma doença fantasma, que às vezes é da nossa cabeça, que está causando essa dor, que não aparece nos exames, não aparece nas coisas, mas com esse diagnóstico mais profundo que foi feito, eles chegaram a essa conclusão, três médicos juntos.”

No áudio abaixo, Eluza relata como foi a descoberta e como vive hoje com as dores crônicas.

Conforme a paciente, anteriormente um médico reumatologista disse que ela tinha artrite reumática, mas mesmo com as medicações, as dores não passavam. “As dores não reduziam, tinha períodos em que eu estava bem doente. Então, quando fiz novas baterias de exames, descobriu-se que eu tinha fibromialgia também. E também foi descoberto que eu tinha lúpus, que é uma doença inflamatória, os dois juntos. Ao descobrir, comecei o tratamento, e a ficha vai caindo. Eu cuidei da minha mãe, que acho que também teve lúpus, mas naquele tempo, em 1985, por aí, os estudos ainda não tinham avançado nessa questão de medicação. Então, minha mãe sofreu muito com essas duas doenças, perdeu o movimento do braço. Os médicos aqui na rede pública só se preocupavam com as manchas, porque o lúpus deixa manchas no rosto. Eles só se preocuparam com isso, e ela chegou a falecer. Então, quando ele me deu esse diagnóstico, eu já fiquei pensando no sofrimento que vi minha mãe passar e sabia que iria passar também”, relembra emocionada.

Eluza ressalta que o apoio da família é muito importante. “Ficamos aflitos e com um caldeirão de emoções. A família é a base para que a gente esteja em pé também. É importante a compreensão. Eu entendo, assim, pela minha casa, é difícil para mim que tenho a doença e é difícil para eles que convivem com a doença. Também entendo esse lado, que às vezes é difícil você ter uma pessoa que todo dia está com dor. É como se aquilo não tivesse fim. E às vezes as pessoas também ficam abaladas por essa condição. Mas assim, é preciso estarmos todos juntos, um dando força ao outro, para que o outro supere também essa situação.”

A paciente fala que, após o diagnóstico, vem a preocupação de como será o tratamento. “Chegam os questionamentos sobre como vamos tratar. Com a medicação, fazendo exercícios físicos como caminhada, pilates etc.? Aquela hidroginástica? Mas como sou restritiva, não posso fazer tudo isso. Então, só tenho 20 minutos de caminhada e me foi indicado também o pilates, mas ainda não fui. Como disse, é um tratamento caro para manter, tem esse porém. Por isso, vou ficar só na caminhada mesmo, porque por enquanto é o que posso fazer. É uma luta diária, mas pelo menos vejo que agora tem outras opções para cuidar da saúde e tratar, diferente de como foi com a minha mãe”, finaliza.

Enfermidade acomete de 2 a 22% da população de todo o mundo; no Brasil, a prevalência da doença varia entre 2,5 e 4,4%

De acordo com estudos recentes, a fibromialgia acomete de 2 a 22% da população de todo o mundo, predominantemente mulheres. No Brasil, a prevalência da doença varia entre 2,5 e 4,4% da população, sendo a segunda maior causa de doença reumatológica depois da osteoartrose. A fibromialgia possui sintomas difusos e os principais medicamentos disponíveis no mercado apresentam eficácia clínica discreta.

A relações públicas Andryelle da Silva, de apenas 31 anos, faz parte desse grupo de mulheres no mundo que convivem com a fibromialgia. No vídeo abaixo, a jovem conta quando foi diagnosticada e como conviver com a doença. Além disso, ela relembra a importância do Fevereiro Roxo - mês de conscientização sobre a fibromialgia.


DESCOBERTA

O diagnóstico da fibromialgia é realmente muito difícil. Ao pesquisar sobre o tema, entrevistar médicos, ouvir especialistas, confrontar depoimentos de pacientes e saber detalhes sobre os sintomas, o jornalista Lucas França, um dos autores desta reportagem, apurou o olhar e se voltou para as queixas da sua mãe, Maria Célia França da Silva, 55 anos.

A dona de casa Maria Célia surpreendeu seu filho. Ele tinha postado em suas redes sociais que estava fazendo um material sobre a doença e precisava de personagens para falar sobre o assunto. Célia de imediato enviou uma foto da receita médica – o documento confirmava que ela era portadora de fibromialgia.

Foto da receita médica (Foto: Arquivo pessoal)

Diabética e hipertensa, Célia foi diagnosticada com a doença recentemente e já iniciou o tratamento adequado com as medicações e métodos necessários. "Há anos venho sentindo muitas dores nos ossos e articulações - na verdade, são dores em todo o corpo, mas até então não sabia do que se tratava. A cada dia elas [dores] só aumentavam. Fiquei muito triste e, inclusive, com crises de ansiedade que culminaram em uma depressão. Estava com muito estresse devido às dores e por não saber de fato o que era, procurei o médico. O profissional me solicitou vários exames e neles foram detectados vários problemas de saúde. Entre eles, tendinite calcária nos dois ombros e quadril, bursite, osteoartrite, lombalgia, artrose, artrite e até uma hérnia de disco. Agora, para quem já é diabética e hipertensa ter esses diagnósticos... Não tem saúde mental que aguente. Sem querer me lamentar, para completar, deu derrame nas articulações e um cisto no joelho. Mas, mesmo assim, continuo confiando em Deus e acredito que Ele sabe de todas as coisas", conta a dona de casa.

Maria Célia relata que foi só após a bateria de exames que foi diagnosticada com fibromialgia. “O especialista me falou que as dores no corpo eram devido à doença. E, para piorar, foi também quando fiquei sabendo que não tem cura, apenas tratamento com uso de medicação para aliviar as dores. Além disso, também me orientou a fazer caminhadas e fisioterapia com um método que alivia essas dores intensas”, explica, acrescentando que não tinha conhecimento da doença antes do diagnóstico.

Célia França descobriu diagnóstico após uma bateria de exames (Foto: Arquivo pessoal)

O significado do Fevereiro Roxo

  • O Fevereiro Roxo é uma campanha de conscientização que se dedica a chamar a atenção da sociedade para as doenças crônicas, com foco especial em condições como o Alzheimer, a fibromialgia e o lúpus. A escolha da cor roxa para representar esse mês não é arbitrária; ela simboliza a luta contra essas enfermidades, que frequentemente envolvem desafios diários e persistentes para os pacientes.
  • Doenças crônicas são aquelas que persistem ao longo do tempo, muitas vezes sem cura definitiva, e podem afetar significativamente a qualidade de vida das pessoas. O objetivo do Fevereiro Roxo é ampliar a compreensão sobre essas condições, promover a solidariedade, arrecadar fundos para pesquisas e proporcionar apoio às pessoas que as enfrentam.

Diferenças entre a fibromialgia e outras doenças reumáticas

O diagnóstico da fibromialgia é bastante complexo, porque existem diversas outras doenças reumatológicas que simulam um quadro parecido. Até pessoas com hipotireoidismo crônico podem apresentar dor difusa e cansaço como principais sintomas.

De acordo com o Dr. Marcelo Corrêa, formado pela Universidade Federal do Pará (UFPA), com residência em Clínica Médica pela Universidade de Taubaté e em Reumatologia pela Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina e Mestrado em Reumatologia pela mesma instituição, o médico reumatologista responsável deve descartar qualquer outra possibilidade antes de determinar o quadro. “É claro que duas condições podem coexistir, algo especialmente comum no caso da fibromialgia”, explica.

Ainda segundo o especialista, identificar a doença é muito importante para um tratamento mais eficaz. “Condições, como dor no final da coluna, podem ser extremamente limitantes e fazer com que o paciente perca sua independência ao longo do tempo. Assim, o indivíduo fibromiálgico também tende a desenvolver problemas psicológicos, como depressão e ansiedade, especialmente quando não tratado. Ainda não existe uma causa definida para o surgimento da fibromialgia. No entanto, algumas hipóteses ajudam a determinar quem possui maior risco de desenvolvê-la e, portanto, precisa de acompanhamento médico precoce. Pessoas com histórico familiar da síndrome, por exemplo, costumam sofrer com o problema com mais frequência”, esclarece Corrêa.

Dr. Marcelo Corrêa (Foto: Arquivo pessoal)

O especialista aponta ainda que o estresse crônico também parece estar relacionado à fibromialgia, assim como situações graves de trauma psicológico ou físico. “Tais condições, especialmente quando repetidas, prejudicam a liberação de hormônios que podem alterar as reações do corpo à dor. Assim, pequenos estímulos podem provocar dores intensas e incapacitantes. Especialistas já procuraram relação com problemas autoimunes e inflamatórios sem sucesso. Frequentemente, pacientes fibromiálgicos apresentam dor na lombar e em outras partes do corpo sem qualquer sinal de inflamação”.

FIBROMIALGIA PODE MATAR?

“A fibromialgia não mata, porém pode tornar-se um quadro bastante grave e incapacitante. Ela é uma condição crônica, portanto não possui cura. Pacientes afetados pelo problema sofrem com grande perda de qualidade de vida e independência, algo que piora ainda mais o quadro fibromiálgico”, alerta o médico.

Corrêa reafirma que a doença é crônica e complexa, e seus sintomas incluem manifestações físicas, como dores nas costas e dor na coluna cervical, combinadas com manifestações psicológicas. Portanto, é necessário incluir uma equipe multidisciplinar no tratamento.

“O reumatologista deve realizar o diagnóstico e as primeiras recomendações. Ele também será o responsável por ajudar o paciente a controlar a dor, incluindo dores na lombar. Os medicamentos utilizados devem estimular a analgesia do próprio corpo e diminuir a recepção de dor pelo cérebro. Alguns dos medicamentos também são usados para outras doenças, como alguns anticonvulsivantes e antidepressivos. Pacientes precisam ser bastante cuidadosos quanto ao uso de medicamentos para a dor. O reumatologista deve prescrever analgésicos e o indivíduo nunca pode automedicar-se. A ingestão de medicamentos não indicados pelo médico pode até prejudicar o quadro álgico. Além do tratamento farmacológico, indivíduos com fibromialgia devem ter acompanhamento psicológico. Também é possível utilizar fisioterapia e exercícios físicos em etapas posteriores do tratamento, algo que ajuda a prevenir a dor e recuperar a independência. O paciente precisará realizar alterações em sua rotina para conviver com a doença. Manter práticas saudáveis de atividades físicas e realizar acompanhamento constante com especialistas ajudará a manter o quadro estável”, pontua o reumatologista.

Estudo de universidade brasileira sobre fibromialgia é capa de revista científica internacional

O portal Tribuna Hoje entrou em contato com as universidades públicas e privadas de Alagoas que ofertam cursos/faculdades de saúde para saber se havia algum artigo, estudo ou pesquisa científica sobre a fibromialgia. No entanto, as assessorias das instituições consultadas informaram que, no momento, não há nada em desenvolvimento. Mas a reportagem descobriu, durante a apuração, que no Laboratório de Autoimunidade e Imunofarmacologia, do Departamento de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina – campus Araranguá (LAIF/UFSC), um estudo sobre a doença foi desenvolvido e inclusive foi escolhido para estampar a capa da revista internacional Neural Regeneration Research (NRR) – Pesquisa em Regeneração Neural, em tradução livre.

A pesquisa, intitulada “Efeito da ativação dos receptores dopaminérgicos no modelo experimental de fibromialgia”, é de autoria de Carlos Pereira Martins, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Neurociências (PPG NEURO/UFSC), cuja dissertação de mestrado foi defendida em dezembro de 2020, sob orientação do professor Rafael Cypriano Dutra.

Capa da revista Neural Regeneration Research em que o artigo está disponível (Imagem: Reprodução)

De acordo com o docente que orientou o projeto, foi demonstrado amplamente que um medicamento usado para tratar a doença de Parkinson, conhecido como pramipexol – que ativa os receptores do neurotransmissor dopamina – foi capaz de inibir o desenvolvimento e a progressão da fibromialgia em animais de laboratório.

Dutra ressalta que os resultados do estudo representam avanços consideráveis nas perspectivas de novos tratamentos para a doença, bem como outros tipos de dores crônicas com medicamentos utilizados em outras doenças, que já possuem estudos clínicos de segurança e eficácia. Esse “reposicionamento” dos medicamentos pode encurtar as distâncias na aplicação clínica desses fármacos em doenças de difícil tratamento.

O estudo da UFSC teve o apoio financeiro do PPG NEURO/UFSC, Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação de Santa Catarina (Fapesc), Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia-Inovação em Medicamentos e Identificação de Novos Alvos Terapêuticos (INCT-Inovamed), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O artigo completo, cujo título em inglês é “Pramipexole, a dopamine D3/D2 receptor-preferring agonist, attenuates reserpine-induced fibromyalgia-like model in mice”, pode ser acessado aqui - https://journals.lww.com/nrron....

Pesquisa internacional pode ser uma nova esperança para pacientes com dor crônica

Uma pesquisa inovadora em testes com pacientes diagnosticados com fibromialgia tem mostrado potencial e eficácia no alívio dos sintomas de quem sofre com dor crônica. O estudo, que começou em 2017, envolve a administração de microbiomas intestinais, composição bacteriana presente no organismo, em pacientes com o distúrbio. Ele está em andamento no Rambam Health Care Campus, um dos maiores hospitais da região norte de Israel, em Haifa.

Coordenado por Amir Minerbi, MD/PhD, vice-diretor do Instituto de Medicina da Dor do Rambam, membro do Instituto de Pesquisa Clínica do Rambam e professor sênior da Faculdade de Medicina Technion – Ruth e Bruce Rappaport, o estudo conta com a participação de 15 pacientes mulheres do hospital que lutam contra fibromialgia grave e resistente ao tratamento. A pesquisa foi conduzida em colaboração com pesquisadores da Universidade McGill, no Canadá, os professores Yoram Shir e Arkady Khotorsky, e a médica-cientista Milena Pitashny, chefe do Centro de Microbioma Clínico e de Pesquisa em Rambam. O estudo contou com financiamento da Weston Family Foundation e do Ministério da Saúde de Israel.

Minerbi destaca que os microbiomas de sujeitos saudáveis de pesquisa foram transplantados e administrados a esses pacientes por meio de uma cápsula ingerível. Desse total, 11 participantes relataram menos dor, fadiga e distúrbios de memória, superando os efeitos dos tratamentos anteriores. “Essa melhora, inclusive, continuou por meses e os pacientes retornaram ao trabalho, aos estudos e ao estilo de vida habitual.”

Ainda conforme Minerbi, ele e os demais pesquisadores queriam descobrir se a microbiota intestinal também poderia influenciar os processos de dor. O estudo se concentrou na dor na fibromialgia por vários motivos: a causa desconhecida, sua prevalência e a falta de um método diagnóstico ou de tratamento eficaz.

Microbioma intestinal (Imagem: Reprodução)

O pesquisador explica que a fase inicial incluiu a análise das diferenças estatísticas na composição do microbioma entre indivíduos saudáveis e aqueles com fibromialgia. “Foram encontradas diferenças marcantes entre 20 espécies bacterianas, que variaram em prevalência entre os dois grupos. Observamos que quanto maiores as diferenças no grupo da fibromialgia, mais graves eram seus sintomas.”

O especialista disse que em análises posteriores foi descoberto que as bactérias liberavam certas substâncias ligadas ao sistema nervoso e à intensidade da dor relatada pelos pacientes. “Encontramos uma ligação quase direta entre a concentração de substâncias específicas influenciadas pela atividade bacteriana e a intensidade da dor relatada pelos pacientes. É importante ressaltar que essas substâncias podem ser medidas no sangue. Esta descoberta pode permitir o desenvolvimento de exames de sangue para diagnosticar e monitorar a fibromialgia.”

O especialista do Rambam descreve que “devido à sua natureza indescritível, a fibromialgia é categorizada mais como um distúrbio do que como uma doença. Apesar de existirem muitos sintomas, sua causa não é clara. Por isso, atualmente, não há outro método de diagnóstico além dos relatos subjetivos dos pacientes.”

Para Minerbi, o sistema médico negligenciou a doença e as pacientes do sexo feminino muitas vezes enfrentam ceticismo por parte dos seus prestadores de cuidados de saúde. “A causa subjacente dos sintomas permanece desconhecida e isso dificulta o desenvolvimento de tratamentos específicos. Contamos com o controle da dor e o tratamento da fadiga e da perda de memória. No entanto, tudo isso é paliativo e ineficaz.”

Para estabelecer a causalidade, ou seja, se esses microbiomas específicos causavam a fibromialgia, os pesquisadores transplantaram microbiomas de pacientes saudáveis do sexo feminino em camundongos livres de bactérias. Dentro de duas semanas, os ratos exibiram sintomas de fibromialgia que persistiram durante meses, fornecendo evidências convincentes do papel do microbioma no desenvolvimento da fibromialgia.

Uma investigação mais aprofundada revelou um impacto no sistema imunológico, perturbando o seu equilíbrio e fazendo com que ele atingisse áreas do sistema nervoso responsáveis pela sensação de dor. Os ratos receberam antibióticos para tratar o microbioma doente. Notavelmente, os sintomas de dor nos ratos desapareceram rapidamente.

Devido ao sucesso inicial da pesquisa, o grupo de pesquisadores preparou uma investigação mais abrangente. “Faltou grupo de controle e randomização no estudo. Em breve, recrutaremos 80 pacientes para um ensaio maior e controlado, no qual esperamos confirmar nossas descobertas”, acrescenta Minerbi, o que abre caminho para uma maior compreensão e possíveis avanços no diagnóstico e tratamento para pessoas que sofrem de fibromialgia.

As informações que constam nesta retranca da matéria foram extraídas do site https://medicinasa.com.br/ e publicadas no dia 19 de janeiro de 2024.

Direitos previdenciários de quem convive com a doença

A advogada especialista em Direito Previdenciário e professora de Direito Constitucional, Kamaziana Severo, explanou sobre a fibromialgia e os direitos previdenciários, contando sobre o que a lei garante aos portadores da doença.

“A fibromialgia, também chamada de Fadiga Crônica, é uma síndrome caracterizada por dores musculoesqueléticas generalizadas, frequentemente acompanhadas de fadiga, distúrbios do sono, problemas de memória e alterações de humor. Ela está inserida no rol de doenças ditas invisíveis ou ocultas, pois não traz consigo sinais visíveis ao olhar”, discorreu a advogada que é diretora da Amprev – Associação das Mulheres Previdenciaristas de Alagoas.

Segundo ela, a condição impacta significativamente a qualidade de vida dos pacientes. No Brasil, completou, diversas leis em âmbito federal, estadual e municipal asseguram direitos aos portadores de fibromialgia.

“Destaca-se prioritariamente a Lei Federal nº 14.705 de 2023, que estabelece diretrizes para o atendimento pelo SUS às pessoas com fibromialgia, garantindo acesso a equipes multidisciplinares e a tratamentos específicos”, frisou a profissional que atua na defesa de direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

Advogada Kamaziana Severo (Foto: Arquivo pessoal)

Kamaziana Severo citou ainda que, no estado de Alagoas, a Lei nº 8.293 de 2020 dispõe sobre a inclusão das pessoas com fibromialgia nas filas preferenciais em estabelecimentos públicos e privados, além do direito ao uso de vagas de estacionamento especiais.

“Além da Lei Estadual nº 8.460 de 2021, que institui a política pública estadual de proteção e fomento dos direitos da pessoa com fibromialgia, garantindo atendimento multidisciplinar, participação da comunidade na formulação de políticas públicas, disseminação de informações relativas à fibromialgia, além de incentivo à formação e capacitação de profissionais especializados”.

No tocante às garantias legais nos municípios, um importante marco ocorreu no município de Aracaju, que instituiu o Dia Municipal da Fibromialgia. Já a Câmara Municipal de Maceió permite que pessoas com fibromialgia estacionem em vagas destinadas a idosos, gestantes e deficientes. A identificação dos beneficiários é feita por meio de um cartão e de um adesivo expedido pelo Poder Executivo Municipal.

Entre os direitos garantidos, as legislações mencionadas asseguram aos portadores de fibromialgia diversos direitos, incluindo o atendimento preferencial com prioridade em filas de bancos, repartições públicas e estabelecimentos comerciais; vagas de estacionamento com direito a utilizar vagas reservadas para pessoas com deficiência; transporte público, em algumas localidades, acesso ao passe livre intermunicipal; e atendimento multidisciplinar, com acesso a acompanhamento médico especializado, fisioterapia e suporte psicológico.

“Para usufruir desses direitos, é fundamental que o paciente obtenha a Carteira de Identificação da Pessoa com Fibromialgia (CIPF). A emissão dessa carteira geralmente requer documento de identificação pessoal, foto 3x4 e laudo médico emitido por especialista, contendo o diagnóstico de fibromialgia com o respectivo CID (M79.7)”, esmiuçou.