A luta para manter os manguezais de pé em Alagoas

Projetos inovadores combatem destruição, promovem a conservação e trazem esperança para bioma que encolheu aproximadamente 14% em 17 anos no estado

Por Luciana Beder e Valdirene Leão - Repórteres / Bruno Martins - Revisão | Redação

Os manguezais fazem parte de um dos ecossistemas mais diversificados do planeta. O bioma é muito importante para a natureza e para os seres humanos pela sua capacidade de captar CO₂ da atmosfera. Conforme o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o ecossistema é o lar de mais de 3 mil espécies de peixes e 120 milhões de pessoas em todo o mundo dependem dele como meio de subsistência. Sem os manguezais, a terra seria acometida por 39% mais inundações.

Os mangues têm um grande papel no combate ao aquecimento global, já que sua capacidade de armazenamento de carbono é de três a cinco vezes maior do que as florestas tropicais, conforme estima a União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, do inglês International Union for the Conservation of Nature).

Mas esse habitat está desaparecendo. Não há estudos recentes, mas os que existem já apontam para um cenário preocupante. Conforme o Projeto de Mapeamento Anual da Cobertura e Uso do Solo no Brasil (MapBiomas), feito pelo Observatório do Clima em colaboração com 18 instituições, Alagoas perdeu 14% de manguezal em 17 anos. A redução no estado é menor que a média brasileira, que foi de 20%. Também menor que as reduções ocorridas no Paraná (23%) e na Bahia (21%), mas não menos preocupante.

Publicado em 2018, o Atlas dos Manguezais do Brasil aponta que Alagoas tem 5.537,27 hectares (ha) de manguezais, o que representa 0,2% de sua extensão territorial e 0,4% de toda área de manguezal do país.

(Foto: Adailson Calheiros)


BRASIL

Conforme o atlas, o ecossistema manguezal apresenta uma extensão de aproximadamente 14.000 km² ao longo do litoral do Brasil. Os estados que têm maior área ocupada por mangues são: Maranhão com 505 mil ha (36%), Pará com aproximadamente 390 mil ha (28%) e Amapá com 226 mil ha (16%). Essa área de manguezais situada ao norte do Brasil constitui a maior porção contínua do ecossistema sob proteção legal em todo o mundo. Os demais estados não superam 0,4% de seus respectivos territórios.

Ainda conforme o atlas, o Brasil perdeu cerca de 100 mil hectares de manguezais desde 1980, principalmente ao longo das costas sudeste e sul, sendo que aproximadamente 50% dessas perdas são atribuídas à carcinicultura.

“Além de consequências ecológicas, a degradação desse ecossistema também acarreta perdas socioeconômicas, uma vez que, nas áreas onde o manguezal foi suprimido total ou parcialmente, a oferta dos serviços ecossistêmicos à população se torna comprometida”, ressalta o estudo.

Apesar do cenário preocupante, em Alagoas três projetos desenvolvidos por uma Organização Não Governamental (ONG) e pelas iniciativas pública e privada trazem esperança ao bioma e às espécies que dependem dele. O Mangue Vivo, o Nosso Mangue e o Pró-Manguezais foram criados para combater a destruição e promover a conservação dos manguezais no estado.

A luta para manter de pé o ecossistema ameaçado de extinção tem sido um desafio, mas em alguns casos já é possível ver resultados. Tem ajudado a evitar ou desacelerar o desmatamento e reflorestar áreas degradadas.

Bruno Stefanis: “Mês a mês áreas são derrubadas em Paripueira. Apresentamos vídeos panorâmicos à prefeitura. Não tivemos ainda retorno. Chamamos a atenção do MP para onde está sendo construído um condomínio. Ali já perdemos uma área gigantesca de mangue”

(Foto: Edilson Omena)



Mangue Vivo protege bacia hidrográfica do Pratagy

Idealizado pelo Instituto Biota de Conservação, o projeto Mangue Vivo nasceu com o objetivo de proteger os manguezais da bacia hidrográfica do Pratagy. Com o patrocínio da Coca-Cola, o projeto consiste no monitoramento de 14 áreas de manguezais, um total de 300 hectares, que vai do bairro de Jacarecica, em Maceió, até o município da Barra de Santo Antônio, no Litoral Norte de Alagoas, uma região onde a especulação imobiliária avança em uma velocidade impressionante ao tempo em que a vegetação encolhe.

O presidente do instituto, o biólogo Bruno Stefanis, explica que foi procurado pela empresa, que queria fazer um trabalho de reflorestamento e recomposição hídrica na região onde ela atua. A fábrica da Coca-Cola tem duas plantas aqui em Alagoas. A dos refrigerantes, que fica no Benedito Bentes e pega a base hidrográfica do Pratagy, e da Cristal, que é no polo industrial e pega a base hidrográfica do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Manguaba (CELMM).

Como busca conservar a fauna marinha em todo o estado, quando surgiu a ideia de um projeto de florestamento, o Biota logo viu um potencial nos manguezais, porque é uma floresta que tem conexão com o mar. O projeto tem o objetivo de proteger as florestas de manguezais para a captação de carbono, ajudar no combate às mudanças climáticas e também na recomposição hídrica.

“A gente propôs esse projeto de monitoramento para proteger esse bioma que é superimportante para toda a fauna marinha, porque milhares de animais entram no mangue para reproduzir. Eles dependem do mangue para poder viver. Então muito da cadeia alimentar da gente, dos peixes, tem uma ligação direta com o manguezal. E o próprio peixe-boi é um animal que precisa do mangue para poder se reproduzir e beber água doce nos rios”, salienta Stefanis.

Arthur Ferraz, gerente de Relações Externas da Solar Coca-Cola, destaca que a empresa tem como ambição ser referência em sustentabilidade no território em que atua. Ele explica que este propósito está alinhado com os compromissos globais do Sistema Coca-Cola em temas centrais como água e resíduos. “Neste sentido, temos buscado parceiros e iniciativas para gerar impacto positivo nas comunidades em que estamos inseridos.”

O trabalho desenvolvido nos manguezais pelo Biota é positivo para empresa. “Contribuir para a conservação e recuperação da Bacia do Pratagy é uma dessas ações em andamento que muito nos orgulha. Temos uma relação muito forte com Alagoas e com os alagoanos e sabemos a relevância que essa região hidrográfica tem para o estado. É nosso papel, na condição de indutor de um desenvolvimento econômico sustentável, liderar e nos engajar em iniciativas como essa, feita em parceria com um instituto local de referência como o Biota”, enfatiza Ferraz.

MONITORAMENTO

O monitoramento dos manguezais é feito mensalmente em todas as áreas mapeadas, por meio de drone, que fotografa a situação a cada mês. Com as imagens registradas, é gerado um mapa em tempo real. O levantamento poderia ser por meio de satélite. Mas, conforme Stefanis, o Biota optou pelo drone porque o satélite tem uma margem de erro muito grande.

“Ele tem um erro mais ou menos de quase dois hectares e dois hectares é muito para um manguezal. Então, quando a gente for perceber, depois que o manguezal perder dois hectares, a gente já perdeu uma área de mangue inteira. E a margem de erro com o drone é quase milimétrica. Ele consegue diagnosticar até meio metro de supressão de mangue”, explica Stefanis.

O trabalho começou em fevereiro deste ano. A cada mês, após o monitoramento e registro de todas as 14 áreas, dois relatórios são elaborados. Um relatório de atividades, que é encaminhado à empresa patrocinadora, e o outro é um relatório técnico, que é disponibilizado no site do Biota para toda a sociedade e protocolado no Ministério Público do Estado de Alagoas (MP/AL), Ministério Público Federal em Alagoas (MPF/AL), Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL), Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis em Alagoas (Ibama/AL), Área de Proteção Ambiental (APA) Costa do Corais, Batalhão de Polícia Ambiental (BPA), Prefeitura de Maceió, Prefeitura de Paripueira, Prefeitura de Barra da Santo Antônio, APA do Pratagy e Comitê da Bacia Hidrográfica do Pratagy (CBHP).

Projeto Mangue Vivo (Foto: Edilson Omena)

Com esse levantamento, o Biota tem alertado as autoridades sobre onde e quando ocorrem situações de desmatamento e aterro dos mangues nessa região. Nos locais de monitoramento, o instituto também fixou placas indicando a existência do projeto. Nelas há um QR Code através do qual a população pode acessar os relatórios. “Além de alertar as autoridades, a nossa presença mensal na área tem inibido que novos aterros e novos desmatamentos sejam feitos”, destaca o presidente da ONG.

Mostrando os locais agredidos, o antes e o depois da área desmatada, o monitoramento técnico do Biota tem sido um facilitador para o trabalho do Poder Público, que tem o papel de fiscalizar e punir os infratores. E as denúncias da ONG e seus relatórios técnicos têm dado um empurrão nessas ações.

A previsão de monitoramento na bacia hidrográfica do Pratagy é de um ano. Ao final desse período, o Biota segue o levantamento nas lagoas Mundaú e Manguaba, conforme o acordo firmado com a Coca-Cola. “Esse é um trabalho que envolve muito custo, com pessoal, equipe e drones. Então, dependendo da situação, a gente pode até fazer o primeiro ano aqui [na bacia do Pratagy], o segundo ano lá, depois voltar para cá para ver se houve uma redução drástica no ano que não teve monitoramento. Então, a gente ainda está estudando essa possibilidade”, diz o biólogo.

A ideia da ONG é que outras empresas apoiem o projeto, para que ele possa crescer e atender outras áreas.

População e imprensa abraçam o projeto

A população também tem ajudado. Bruno conta que depois que iniciou o projeto na região, a população tem ligado para o Biota para denunciar casos de agressão ao meio ambiente. “Muitas dessas vezes o pessoal espera ser final de semana, noite, para fazer [foto] e manda pra gente. Como somos uma ONG e não temos poder de polícia, então a gente faz a denúncia ao órgão competente, que multa os infratores.”

Conforme Stefanis, a população se sente contemplada quando vê que a denúncia dela resultou em fiscalização e a pessoa que estava aterrando o mangue foi autuada. “É bastante satisfatório a gente ver que a população está abraçando o projeto também”, comemora.

As denúncias contam também com a divulgação da imprensa, que, ao tomar conhecimento das infrações, apura os fatos e os leva ao conhecimento da população. Para Stefanis, a divulgação na imprensa é também uma forma de pressionar o Poder Público, além de inibir possíveis infratores. “Ter visibilidade do que está sendo feito é muito importante, porque quando alguém vê coberto na mídia que a pessoa lá que estava aterrando o mangue se deu mal, vai pensar duas vezes em fazer o mesmo”, avalia.

No dia 31 de julho deste ano, por exemplo, informações do Biota repassadas à imprensa garantiram que a sociedade tomasse conhecimento do aterramento de manguezal para mudar o curso do Rio Garça Torta e beneficiar moradores de um condomínio particular da região, que estaria de posse de uma autorização do IMA/AL. As denúncias partiram dos moradores de Guaxuma e Garça Torta. Segundo eles, o Condomínio Morada da Garça foi construído em uma Área de Preservação Permanente (APP).

Desvio de rio em condomínio na Garça Torta (Foto: Edilson Omena)

Por meio de nota, o IMA/AL afirmou que recebeu uma solicitação de um condomínio para promover a reabertura do leito preferencial do Riacho de Garça Torta, cuja foz estava se precipitando cada vez mais ao norte. “A situação estava causando grave processo erosivo na vegetação de restinga situada à frente do condomínio, criando assim uma escarpa de dois metros e ameaçando a estrutura dos imóveis. O avanço também estava provocando impactos ao meio ambiente marinho e costeiro adjacentes. Devido a essa situação, foi autorizada a reabertura da foz do rio no seu curso preferencial. Vale ressaltar que não foi autorizada qualquer intervenção no manguezal nem o fechamento do leito do rio”, informou o órgão ambiental.

AUTUAÇÕES

Conforme Stefanis, várias pessoas e empresas já foram multadas, autuadas e estão reparando o dano causado. No caso do aterramento em Garça Torta, no dia 3 de agosto, o condomínio responsável por práticas irregulares relacionadas à intervenção hídrica no riacho foi notificado pela Semarh.

De acordo com a equipe de fiscalização, a intervenção hídrica realizada pelo condomínio Morada da Garça não possuía autorização. O órgão destacou que o riacho sofreu modificações que podem impactar negativamente a fauna e a flora da região, além de afetar o regime de fluxo de água.

Um outro caso, ocorrido em abril deste ano, foi a interdição de um terreno que estava sendo aterrado ilegalmente na região da APA Costa dos Corais, próximo de um mangue, no bairro da Pescaria, em Maceió. O aterramento foi flagrado pelo monitoramento do projeto Mangue Vivo.

Aterro de manguezal em Pescaria (Foto: Edilson Omena)

A denúncia foi veiculada pelo jornal Tribuna Independente e pelo portal Tribuna Hoje. Durante a apuração da matéria, a Prefeitura de Maceió informou que fiscais de meio ambiente foram ao local e constataram que a obra do aterro estava irregular, pois não possuía autorização ambiental para ser realizada. Conforme a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb), antiga Secretaria Municipal de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente (Sedet), a placa fixada no local era falsificada, baseada em um modelo de autorização ambiental disponível no site da secretaria. O documento não possuía número do processo e nem da licença. Um adesivo de interdição foi posto sobre a placa pelos fiscais.

Após a publicação, o responsável pelo local entrou em contato com a reportagem para informar que tinha autorização ambiental da Semurb e que a região não se encontra em APA.

“Tudo foi georreferenciado. O técnico da prefeitura visitou o local e a área de preservação ambiental não é ali. Fica trezentos metros mais à frente. Inclusive, ali nunca foi mangue, era um campo de futebol desde a década de 1940. Tem manifesto de transporte, licença de material, licença ambiental, todos os recursos obrigatórios pela legislação. Nada foi feito irregular”, afirmou o corretor de imóveis André Vieira à época.

Mas o caso continua em investigação na Semurb. Neste mês de novembro, a fiscalização do órgão suspendeu a licença ambiental da obra. “A cassação do documento aconteceu pela atuação irregular do aterro, que estava invadindo ilegalmente a região da APA Costa dos Corais, próximo a um mangue. Além disso, a falta de titularidade do documento também se somou aos motivos para a suspensão, tendo em vista que o responsável titular pela área já faleceu”, informou a secretaria.

Ainda de acordo com a Semurb, técnicos ambientais comprovaram as irregularidades durante fiscalização para comprovar a invasão à APA e utilizando as prerrogativas do Código Municipal de Meio Ambiente (Lei Municipal nº 4548/96), suspenderam a licença do estabelecimento.

Áreas estão encolhendo e ambientalista sente que está apenas retardando extinção

Ao final de um ano de monitoramento na bacia do Pratagy, a ONG vai elaborar um relatório final com o balanço geral do trabalho na região, com informações sobre número de fiscalizações por parte dos órgãos públicos, quantidade de denúncias e áreas que reduziram e aumentaram. Esse material será apresentado ao patrocinador.

Mas já é possível constatar que em alguns pontos as áreas de mangue estão diminuindo. Um exemplo é o manguezal localizado em Paripueira, no Litoral Norte de Alagoas.

“Mês a mês a gente vê áreas sendo derrubadas. Além do mapa, fizemos vídeos panorâmicos e a apresentamos à Prefeitura. Não tivemos ainda um retorno. Chamamos inclusive a atenção do Ministério Público para aquela área onde está sendo construído um condomínio, desmatando uma área gigantesca de mangue. Ali já perdemos vários hectares de mangue”, aponta Bruno Stefanis.

Mapeamentos feitos pelo Instituto Biota em abril de 2022 (foto acima) e em agosto de 2022 (imagem abaixo) mostram o desmatamento na área do Rio do Forte, em área de Paripueira (Fotos: Reprodução / Instituto Biota)

Procurada, a Diretoria de Comunicação do MP/AL informou que a Promotoria responsável pelo caso é a de Recursos Hídricos, mas que não poderia nos dar um retorno sobre as providências que o órgão irá tomar em relação ao problema, porque a promotora da pasta encontra-se de férias.

A Secretaria de Meio Ambiente e Turismo do município de Paripueira informou que realizou uma inspeção no local após denúncias da população e confirmou que o empreendimento Dom Valenthym possui autorização dos órgãos competentes para a construção na área em questão. O órgão destaca ainda que a localidade é classificada como uma APP, de acordo com o Código Florestal, Lei número 12.651/2012.

“Ressaltamos que, no caso do desmatamento, a fiscalização e a competência para autuar ou embargar a obra cabem aos órgãos estaduais e federais de proteção ambiental, uma vez que a prefeitura não detém prerrogativas legais para realizar tais ações”, esclareceu a secretaria por meio de nota.

O IMA/AL, por sua vez, informou que não autorizou qualquer intervenção no manguezal pela Valenthim Construtora & Empreendimento Ltda no município de Paripueira. “A licença ao empreendimento foi concedida pelo IMA mediante condicionantes, entre as quais, a proibição de qualquer intervenção em Área de Proteção Permanente, onde está a vegetação de mangue, conforme o que determina a Lei 12.651, de 25 de maio de 2012. No entanto, o órgão vai enviar uma equipe de fiscalização ao local para verificar se as condicionantes estão sendo cumpridas. Caso sejam constatadas irregularidades, o IMA vai adotar todas as providências cabíveis”, garante o órgão.

Assim como essa situação, o projeto tem constatado mês a mês várias infrações. E uma área que é aterrada em dois dias, por exemplo, pode levar anos para ser recuperada, porque o mangue vai levar muito tempo para crescer. Quem realiza o trabalho de preservar esse bioma tem até a impressão de que o tempo está contra eles.

“A gente vive numa pressão e muitas vezes tem a sensação de que é só um retardatário, a gente fica só retardando o problema. Se tem tanta gente querendo casa na praia, tanto condomínio surgindo, vão ser construídos onde esses condomínios? A gente, da área ambiental, parece que está sempre enxugando gelo, mas talvez, se não fosse esse enxugar gelo, o problema estaria muito maior. Então, se é o que dá para fazer, a gente vai fazer isso”, lamenta Bruno.

Biólogo destaca que bioma precisa de uma proteção maior

Ao mesmo tempo em que os manguezais são importantes para a qualidade do ar, para evitar a erosão marinha e para a reprodução dos animais, também são muitos visados pelo homem por estarem próximos ao mar. “Todo mundo quer uma casa em frente ao mar. Todo mundo quer estar no resort de frente para o mar. Então o mangue ele é muito visado, ele é muito cobiçado. Por isso precisa de uma proteção maior. Ele já é uma Área de Preservação Permanente, mas quando não é monitorado o pessoal vai comendo aos pouquinhos e daqui a pouco a casa está toda dentro do mangue. Aí é um protocolo muito maior para demolir, para recuperar a área. Então evitar essa parte é a nossa função nesse projeto. Evitar que o mangue seja destruído e, com isso, a gente faz a recomposição hídrica e também ajuda na diminuição do aquecimento global”, ressalta Bruno.

Ecossistema ameaçado traz riscos de sobrevivência também às espécies que dependem dele (Foto: Edilson Omena)

O biólogo destaca também a importância dos manguezais no combate às mudanças climáticas. “Os eventos extremos estão acontecendo, a gente está tendo cheia e seca onde não existiam e o mangue é uma barreira biológica. Além dele absorver toda essa questão do carbono, recomposição hídrica, ele também impede o avanço do mar. O aquecimento global derrete a geleira, aumenta o nível do mar e os mangues estão ali para barrar isso.”

Conforme Stefanis, o mangue e a restinga são algumas das melhores barreiras para evitar erosão. “E todo esse tipo de vegetações, que levaram milhões e milhões de anos se adaptando para sofrer essa pressão, estão sendo removidas para botar muro, troco de coqueiro, que não têm funcionalidade.”

Essas barreiras muitas vezes dissipam energia, mas jogam para o vizinho e saem quebrando tudo do outro lado. Ao contrário do manguezal, onde a energia entra, ela vai sendo dissipada aos poucos. O especialista avalia que, como barreira biológica natural, o manguezal é o melhor fixador de terra. “Ele não tem como impedir esse avanço do mar, mas tem como minimizar os estragos. O mar avança sobre ele, porém essa energia é dissipada. Ela não destrói a terra, não faz buracos, não derruba barrancos”.

Mundo

O Atlas dos Manguezais do Brasil aponta que a redução deste tipo de vegetação não ocorre apenas em Alagoas e no Brasil. Os ecossistemas vêm desaparecendo em nível global a uma taxa anual entre 1% e 2,1%, principalmente em função da carcinicultura, urbanização, poluição, entre outras intervenções. As perdas históricas variam entre 35% e 86% e as taxas continuam aumentando, principalmente em países em desenvolvimento, onde se localizam mais de 90% dos manguezais do mundo. Conforme o PNUMA, 67% dos manguezais foram perdidos ou degradados até hoje. A mudança climática, a exploração madeireira, a agricultura, a aquicultura, a poluição e o desenvolvimento costeiro são apontados como os fatores que contribuem para a degradação do ecossistema.

Negócio de impacto colabora com a preservação dos mangues no Pontal da Barra

O Negócio de Impacto Socioambiental (Nisa) Nosso Mangue nasceu sem muitas pretensões. O projeto foi criado pela ambientalista Mayris Nascimento, moradora do Pontal da Barra, bairro histórico de Maceió banhado pela Lagoa Mundaú, berço de pescadores e artesãos. A jovem de 27 anos enxergou um problema e buscou a solução. Ao procurar o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para buscar soluções para o trabalho sobreviver financeiramente, ela percebeu que tinha nas mãos um negócio de impacto. O melhor é que estava voltado para o meio ambiente onde ela cresceu.

O local é fonte de pertencimento para a ambientalista. “A lagoa para mim tem um significado muito grande, porque é o ambiente onde eu brincava quando era criança. Toda minha vivência, toda minha história gira em torno da lagoa”, lembra Mayris.

O projeto começou em 2019. No período de pandemia foram feitas algumas ações pontuais. Mas a empresa só entrou em operação em 2022. E a ação inovadora já mostrou a que veio. Tem recuperado e regenerado áreas de manguezais a partir do turismo regenerativo e da compensação da pegada de carbono na Lagoa Mundaú, na região do Pontal da Barra.

Há pouco mais de um mês a empresa chegou à marca de mais de 15 mil mudas plantadas. Foram 11.848 de mangue vermelho e 3.256, do branco. O índice foi divulgado e comemorado no perfil da empresa no Instagram: “não são apenas números, é o impacto da nossa jornada”.

Nosso Mangue sobrevive com a comercialização de passeios na Lagoa Mundaú (Foto: Adailson Calheiros)

O Nosso Mangue funciona com a comercialização de pacotes de passeios pela Lagoa Mundaú. Chamado também de turismo de experiência, o passeio oferece uma vivência na rota do manguezal, onde é possível conhecer a importância do ecossistema, as ilhas da região e sua história, receber informações sobre a importância de conservar e preservar esse ecossistema, além de se inteirar sobre alguns indicadores da fauna e da flora e das áreas recuperadas. “No meio da rota, as pessoas podem plantar suas mudas de mangue e, no final, a gente para no meio da laguna para elas tomarem banho e conhecerem o que é o massunim, taioba... Finalizamos essa rota explicando sobre a importância do nosso mangue, do papel dele e o quanto a gente tem propensão de gerar impacto do negócio em si”, explica Mayris.

A empreendedora destaca a importância do passeio para quem vivencia a experiência, para o ecossistema e para a comunidade local. “Tem toda uma rota ecológica, onde as pessoas, sejam de Maceió ou os turistas que estão vindo para conhecer a capital, vivenciem a cidade além do mar. As pessoas vêm conhecer o Caribe brasileiro que é Alagoas. Por que não conhecer Maceió além do mar? Por que não levar um pouquinho da cultura, da tradição, do folclore e principalmente da lagoa? A gente sabe o quanto ela [a lagoa] influenciou economicamente o desenvolvimento do nosso estado. Então a gente traz essa vertente das pessoas irem lá conhecerem um pouco do contexto do Pontal da Barra, conhecer como surgiu o Nosso Mangue e conhecer a importância do complexo estuarino lagunar e, principalmente, do manguezal.”

Os passeios são feitos aos finais de semana. Mas o Nosso Mangue já está com projeto de expandi-los também aos dias úteis. A Colônia de Pescadores do Pontal da Barra é o ponto de encontro do público que pretende vivenciar a rota regenerativa. A embarcação comporta oito pessoas. O valor cobrado por pessoa é de R$ 50 e já inclui um lanche natural com frutas da estação. Mais informações sobre os passeios e outras ações podem ser conferidas na conta do Nosso Mangue no Instagram.

Lagoa Mundaú (Foto: Edilson Omena)

O projeto desenvolve também o trabalho de educação ambiental com a comunidade e os pescadores locais. Embora a região não sofra com a especulação imobiliária, algumas áreas de manguezais têm sido suprimidas para comercialização da vegetação, que é utilizada como alimento para o gado. A ação ocorre por falta de conhecimento sobre a importância do ecossistema para reprodução dos animais e para quem sobrevive da pesca.

A empreendedora explica os benefícios que os manguezais podem trazer para quem está às margens da lagoa e para todo mundo em todos os contextos. “Ele é um berçário natural. O mangue tem a capacidade de sequestrar de 5% a 10% de carbono. A cada um hectare de mangue recuperado você aumenta a reprodutividade das espécies. Têm diversos fatores. Se toda a costa que fica às margens da lagoa estivesse recuperada, o impacto das enchentes que a gente teve [ano passado] não seria esse, seria bem menor. Porque ele é um bloqueador desses impactos que as marés trazem durante as enchentes. Então são diversos benefícios que ele traz. E quando a gente traz a iniciativa de valoração desse ecossistema, é justamente para que as pessoas tenham o olhar do quanto ele é importante, de que ele não está ali por acaso no meio ambiente”, reforça Mayris.

“Passeio beneficia a natureza e fortalece o vínculo entre as pessoas e o ambiente”

Quem vivencia a experiência a considera incrível. A captadora de recursos Millane Barbosa já participou de dois passeios e está ansiosa para participar novamente. Para ela, é uma forma de apoiar a iniciativa, que, além de proporcionar experiências agradáveis, contribui ativamente para um futuro mais sustentável.

“Como amante da natureza, sempre busco atividades que proporcionem contato direto com o meio ambiente. Participar do passeio no mangue não só atendeu a essa expectativa, mas também me surpreendeu ao integrar o cuidado ambiental como parte fundamental da experiência. A iniciativa não apenas proporciona momentos agradáveis em meio à natureza, mas também promove a conscientização ecológica, algo que considero crucial nos dias de hoje”, afirma.

Após fazer o passeio duas vezes, Millane quer repetir experiência (Foto: Arquivo pessoal)

Para Millane Barbosa, saber que o Nosso Mangue é dedicado ao reflorestamento de áreas de manguezais em Maceió é uma notícia inspiradora. “Iniciativas como a do Nosso Mangue não apenas restauram ecossistemas importantes, mas também envolvem a comunidade, educando sobre a importância da preservação ambiental. É louvável ver esforços assim que não apenas beneficiam a natureza, mas também fortalecem o vínculo entre as pessoas e o ambiente em que vivem”, destaca.

O estudante universitário Augusto Pimenta levou o sobrinho Mateus, de três anos, para fazer o passeio. Ele também considera a experiência singular. “Amei cada momento, especialmente quando tivemos a oportunidade de plantar. Explorar aquele lugar não só proporcionou momentos especiais com meu sobrinho, mas também nos permitiu conhecer mais sobre nossa cidade. A importância do mangue ficou evidente e, ao plantar, sentimos que estávamos contribuindo para a preservação desse ambiente vital”, afirma.

Para ele, a satisfação em participar do passeio foi surpreendente. “Foi incrivelmente satisfatório e gratificante para mim. Além disso, tivemos a chance de frequentar um bairro [o Pontal da Barra] que não costumamos visitar, enriquecendo ainda mais nossa conexão com o ambiente local. Essa experiência foi verdadeiramente marcante”, destaca.

Augusto e o sobrinho Mateus com Mayris Nascimento do Nosso Mangue (Foto: Adailson Calheiros)

O bancário Charles Henrique Alves também vivenciou a experiência. Para ele, foi um momento de paz e relaxamento, com muito aprendizado. “Pouco tenho contato com a natureza. Conhecia os manguezais só de ouvir falar, achava que o mangue era um ecossistema e não uma planta. Não sabia da importância deles para a nossa região. Aí descobri no passeio que os manguezais ajudam muito contra os gases que provocam o efeito estufa, até mais que as florestas. Li que os nossos manguezais estavam sendo destruídos pelas ações do homem, mas não sabia da tamanha importância deles. O passeio foi ótimo. O contato com a lagoa, o mangue e a natureza deixam um sabor de quero mais”, diz.

Ideia inovadora rende premiações

Apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal), a ideia inovadora de Mayris mudou sua realidade. O projeto já lhe rendeu três premiações: Startup Nordeste, BNDES Garagem e GDH Indústria. As premiações têm o objetivo de ajudar a acelerar o negócio para continuar impactando a comunidade.

Conforme ela explica, primeiro veio o Startup Nordeste, que é para acelerar tanto startups quanto negócios de impactos só do Nordeste. Depois veio o BNDES Garagem, que é voltado para acelerar negócios de impacto do Brasil. E o último foi o GDH Indústria, que é voltado para soluções para indústria. Nesse caso entra o projeto de prototipagem da solução da pegada de carbono.


No DemoDay do BNDES Garagem [do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], que reconhece e acelera negócios que geram impacto social e ambiental, o Nosso Mangue concorreu com mais de 604 startups do Brasil e conquistou o primeiro lugar na edição 2022.

Fruto de projetos sociais, Mayris avalia que o mercado dos negócios de impacto ainda tem muito a expandir, tanto em Alagoas como no país. Hoje, os recursos do projeto Nosso Mangue são oriundos apenas dos passeios. Mas ela vem buscando solução para a compensação da pegada de carbono para torná-la rentável.

ECONOMIA DO FUTURO

O diretor executivo de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) da Fapeal, João Vicente Lima, explica que a empresa Nosso Mangue venceu um edital para transformar ideias em negócios inovadores. Ele vê o projeto como uma solução muito engenhosa, por ser uma resposta que o mercado precisa e ainda se tratar de uma empresa genuinamente alagoana.

“O projeto da empresa é focado na diminuição da emissão em larga escala de gases do efeito estufa. E o Nosso Mangue procura solucionar o problema e entra como uma solução para comercialização da compensação da pegada de carbono. É uma empresa realmente engajada e preocupada com a sustentabilidade do planeta”, afirmou.

Lima ressalta que o apoio ao projeto é mais uma iniciativa da Fapeal em apoiar áreas estratégicas para o desenvolvimento do estado. Neste caso específico, o apoio a negócios de impacto social e ambiental. “No mundo inteiro só se fala em como induzir, oportunizar a empresas soluções para esse problema que é gigantesco, que é exatamente o do lançamento de gases de efeito estufa na atmosfera. Nós costumamos dizer que é uma empresa criada para essa economia do futuro que nós já vivemos”, disse.

Pró-Manguezais pretende recuperar bioma em Alagoas

Além da questão ambiental, os manguezais têm grande relevância socioeconômica, pois representam um meio de sobrevivência para a população pesqueira e ribeirinha de Alagoas. A preocupação com este habitat, com os animais que nele vivem e com a população que o tem como meio de sobrevivência fez surgir em novembro de 2022 o Pró-Manguezais.

Fruto de cooperação entre instituições públicas municipais, estaduais e federais, coordenado por MP/AL e MPF/AL, o Pró-Manguezais tem a pretensão de recuperar, proteger e conservar os manguezais em todo o estado. Seu lançamento ocorreu no dia 16 de novembro no Instituto Federal de Alagoas (Ifal) em Marechal Deodoro, seguido do plantio de mudas de mangue às margens da Lagoa Manguaba.

Lançamento do Pró-Manguezais ocorreu em novembro deste ano (Foto: Anderson Macena / Ascom MP/AL)

O projeto-piloto prevê a realização de ações nos municípios de Marechal Deodoro, Roteiro e Barra de São Miguel, podendo ser expandido para outras localidades. Entre as ações estratégicas a que se propõe para proteger o bioma estão a elaboração de diagnóstico sobre a situação atual do ecossistema, o mapeamento das áreas existentes, a instalação de viveiros para a produção de mudas, a realização de ações para reabilitação ambiental, elaboração de plano de conservação da fauna e ações de educação ambiental.

O projeto se estrutura em quatro eixos: recuperação de áreas degradadas, conservação da fauna, captação de recursos para a conservação dos manguezais e educação ambiental. Uma das primeiras ações estratégicas será o diagnóstico das condições atuais dos manguezais.

“Juntando esses eixos, preservamos a matéria-prima com que as comunidades tradicionais trabalham, conscientizando os diversos atores sociais e revigorando esse ecossistema, naturalmente se está contribuindo para o desenvolvimento dessa atividade econômica que é tão importante para a população ribeirinha”, afirma a procuradora da República Juliana Câmara, coordenadora do projeto Pró-Manguezais pelo MPF/AL.

Tudo isso com o objetivo de promover sua conservação, uso sustentável e proteção às espécies de fauna e flora e seus habitats, mantendo suas áreas e usos tradicionais, de modo a reduzir a degradação.

Durante o lançamento, a responsável pela Promotoria de Recursos Hídricos do MP/AL, Lavínia Fragoso, apontou que o equivalente a 100 mil campos de futebol [em vegetação de manguezais] desapareceu em menos de 50 anos, principalmente no Sul e Sudeste do Brasil. “Ao trabalhar os mangues, estamos trabalhando os recursos hídricos, a flora, a fauna, os habitats desses animais e também as comunidades tradicionais, para promover o uso sustentável desses recursos”, afirmou.

Promotora Lavínia Fragoso (Foto: Ascom MP/AL)

O Pró-Manguezais ainda está em estágio inicial, mas algumas ações já começaram, conforme relatório do MP/AL. As reuniões com os órgãos parceiros foram iniciadas no segundo semestre de 2022 e, no âmbito do MP/AL, o projeto foi publicado no Diário Oficial do Estado em março deste ano.

Após a assinatura do Termo de Cooperação Técnica entre os órgãos parceiros, conclusão do projeto e definição das áreas prioritárias, houve o diagnóstico da fauna dos manguezais, definição das espécies e áreas para conservação da fauna e flora, escolha da área para implantação de viveiros para produção de mudas em três municípios do Litoral Sul alagoano e elaboração do mapeamento temático dos remanescentes de manguezais das áreas prioritárias.

Também foram elaborados o projeto arquitetônico e o orçamento da obra para implantação dos viveiros. O MPF conseguiu, através de Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) e Acordos de Não-Persecução Penal, a doação de equipamentos para serem utilizados nas atividades do projeto.

Nesta primeira etapa, estão sendo realizadas campanhas educativas direcionadas à comunidade, para cada público-alvo específico, como a plantação de mudas em Marechal Deodoro, em uma parceria com o Ifal.

A coordenadora do projeto pelo MPF/AL, Juliana Câmara, explicou o porquê da necessidade de realização do projeto por etapas. “A recomposição da vegetação do manguezal não é uma coisa tão simples como possa parecer, não basta ir lá e plantar as mudas. Envolve um diagnóstico da situação atual do ecossistema, as áreas precisam ser estudadas, inclusive para averiguar qual a espécie mais adequada e, muitas vezes, esse replantio precisa acontecer em propriedades privadas e, para isso, os proprietários precisam ser conscientizados. E as ações têm um foco não apenas na vegetação, mas também nas espécies de fauna, já que os manguezais são conhecidos por ser o berçário da vida marinha”.

Coordenadora do Pró-Manguezais pelo MPF/AL, procuradora da República Juliana Câmara (Foto: Ascom MP/AL)

A procuradora da República destaca ainda a importância do regime de cooperação com diversos órgãos e instituições. “A grande sacada é essa união de esforços envolvendo tanto órgãos de caráter técnico como os municípios, que representam o Poder Executivo e têm de fato o poder de gestão. Outro aspecto muito importante de se fazer isso em conjunto é conseguir promover atividades de educação ambiental à comunidade. Então, envolvendo diversos setores, tanto de órgãos públicos como de organizações não governamentais, a gente consegue chegar à comunidade na ponta que precisa ser conscientizada da importância desses ecossistemas, das medidas que precisam ser diuturnamente tomadas para preservação”, ressalta Juliana Câmara.

Segundo a promotora Lavínia Fragoso, a ação de levantamento de áreas através de geoprocessamento ainda se encontra em curso, dada a complexidade do levantamento de campo, que será realizado pelo IMA/AL e Ibama/AL.

Parceiro do programa, o IMA/AL informou que vai realizar, junto com os municípios de Marechal Deodoro, Barra de São Miguel e Roteiro, a escolha de áreas pilotos para a questão do repovoamento da vegetação de mangue. “Após essa fase, poderão ser identificadas novas áreas para que sejam definidas medidas para a recomposição dos manguezais. No decorrer do projeto, o IMA, por meio do setor de geoprocessamento, estará realizando a atualização da cobertura vegetal desse importante ecossistema em Alagoas”, ressaltou o órgão por meio de assessoria.

Ufal será parceira no projeto para ajudar a recuperar ecossistema

A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) deve fazer parte do projeto em breve. Segundo o professor e pesquisador de Ecologia de Ecossistemas, mais especificamente de Manguezal e Estuário, Alexandre Ricardo de Oliveira, o termo de cooperação técnica deve ser assinado ainda neste mês de novembro. “Começamos a participar informalmente e agora vamos participar formalmente, quando a Ufal assinar o termo de cooperação. Inicialmente, foi pensado um local para ser viveiro de mudas, no Ifal de Marechal, que já tem um terreno, e a Ufal sugeriu que esse centro de recuperação de manguezais fosse também um espaço para pesquisa e extensão, para dar apoio na questão de replantio”, explica.

O professor ressalta o objetivo de recuperação de áreas degradadas e restauração ecológica do manguezal e a intenção de expansão do projeto. “Nosso objetivo é fazer com que o projeto abarque outros municípios do sul, como Jequiá da Praia, Coruripe, Piaçabuçu e também municípios do norte, como Japaratinga. A ideia é que os manguezais sejam realmente protegidos. Houve uma paralisação da destruição dos manguezais, mas recomeçou. No Litoral Norte, por exemplo, começaram a invadir novamente, aterrar. Então, a ideia é que a gente, nesses casos, proponha projetos de restauração ecológica, plantando mudas provenientes do centro de recuperação de manguezais”, afirmou.

Professor Alexandre Ricardo de Oliveira (à esquerda) é pesquisador de Ecologia de Ecossistemas, mais especificamente de Manguezal e Estuário (Foto: Arquivo pessoal)

Oliveira explica ainda que as espécies são selecionadas de acordo com a zonação. “A ideia é fazer a restauração ecológica, plantar mangue, literalmente. A gente seleciona as espécies de acordo com a sua zonação específica. Então, analisamos isso para, com técnicas de reflorestamento para área de manguezal, realizar o plantio das mudas. Buscamos entender como é a composição da flora desses manguezais, se estão se desenvolvendo direito, se estão estáveis ou sofrendo algum tipo de impacto, para realizarmos ações para que voltem ao seu estado mais estável”, esclareceu.

Segundo o pesquisador, o manguezal é um ecossistema de extrema importância. “É um dos mais produtivos em relação à matéria orgânica, sendo responsável pela produção de nutrientes para todos os ecossistemas aquáticos. Além disso protege contra erosão marinha, é o berçário de espécies importantes de moluscos (sururu), crustáceos (caranguejo-uçá e siri), peixes, mamíferos aquáticos e aves. Existem estudos que apontam o manguezal como um dos maiores sequestradores de carbono da atmosfera, podendo sequestrar até oito vezes mais carbono do que ecossistemas tropicais”, destaca.

A coordenadora do projeto pelo MPF/AL, Juliana Câmara, ressalta a importância da participação da Ufal no Pró-Manguezais. “A Universidade Federal está prestes a assinar o termo de cooperação e isso traz uma contribuição científica fundamental, que vai, sem dúvida, auxiliar e robustecer ainda mais esse trabalho”, afirma.

Nosso Mangue e Mangue Vivo ganham notoriedade

As ações do Nosso Mangue e Mangue Vivo voltadas à preservação dos manguezais têm ganhado notoriedade no estado. Tanto que o Nosso Mangue e o Instituto Biota de Conservação, responsável pelo projeto Mangue Vivo, passaram a fazer parte de outros projetos que envolvem esse ecossistema.

O negócio de impacto Nosso Mangue e o Biota também estão inseridos no Pró-Manguezais, projeto que abordamos nesta matéria e que é coordenado pelo MP/AL e pelo MPF/AL.

O Nosso Mangue e o Biota também foram consultados pelo MPF/AL sobre a compensação ambiental na bacia do CELMM, na região afetada pelo afundamento do solo, ocasionado pela mineração de sal-gema pela empresa Braskem.

Dos cinco bairros afetados pelo afundamento do solo em Maceió, três ficam às margens da Lagoa Mundaú. Devido à subsidência, a região de Bebedouro, Mutange e Bom Parto perdeu o equivalente a 15,73 hectares de manguezal.

Região de Bebedouro, Mutange e Bom Parto perdeu mais de 15 hectares de manguezal por conta do afundamento de solo (Foto: Edilson Omena)

Para reparar os danos, um acordo socioambiental entre a Braskem e órgãos de controle foi firmado em dezembro de 2020. A partir dele foi criado o Plano Ambiental do Meio Biótico (PAMB). O plano propõe a compensação ambiental por meio de restauração florestal de 47,19 hectares de manguezal.

Conforme o MPF/AL, o PAMB teve início com ações de restauração do manguezal localizado no Flexal, em Bebedouro, em uma área de 1,45 hectare. Restam ainda 45,74 hectares de áreas para serem restauradas.

A empresa responsável pelo replantio, a Tetra Tech, informou ao MPF/AL que está mantendo diálogos com as Prefeituras de Marechal Deodoro, Coqueiro Seco, Roteiro e Maceió. Também com o projeto Nosso Mangue, IMA/AL e Conselho Gestor da APA da Ilha de Santa Rita. A consultoria visa buscar áreas passíveis de receber restauração de manguezal e uma delas é a Ilha do Lisboa, situada na bacia do CELMM na região de Maceió.