Petrucia Camelo

BORBULHAR DO CHAMPANHA

Petrucia Camelo 23 de janeiro de 2025

É preciso parar o redemoinho do cotidiano para a celebração do Ano Novo, que bate à porta, para promover a alegria do desejo de mudança, para atender ao modelo de desenvolvimento em voga. Mas as aves no céu, os peixes no mar não mudam as suas rotinas, salvo se algo de funesto assim os obrigar. Talvez, porque sabem que novo somente é a nossa primeira vez, quando se abrem os olhos na luz; os demais são ilusórios, são conjecturas, bens que não duram e não se transportam para outra dimensão.

Mas o ser humano é mais complexo no entendimento desse processo; talvez, se deva ao sopro divino, que o tornou dual; matéria e espírito que conduzem o mesmo ser, cada qual com suas necessidades, funcionalidades, fragilidades e fortaleza para as realizações que nem sempre se coadunam; às vezes se chocam, contradizem-se; no entanto, fortalecem-se, quando atendem o proposto de ambas as entidades, como bem se lê nos escritos do apóstolo Paulo: Somos atribulados por todos os lados, mas não desanimados; somos postos em extremas dificuldades, mas não somos vencidos; somos perseguidos, mas não somos abandonados; prostrados por terra, mas não aniquilados... (Cor 4,8-11; cf. FI 3,10).

É nesse clima de exaltação ao ser humano que se chega às festas de final de anos. Tem-se o Natal comportado, estritamente familiar, porém a celebração do Ano Novo é efusiva à alegria, à felicidade, de fé em si mesmo e em Deus, pela satisfação da celebração em família com adornos natalinos, dos sucessos contabilizados no final do ano. É claro que vivenciam essa realidade aqueles que aderem ao trabalho, e não aqueles que tropeçam na pedra do caminho, que geram os acontecimentos que mexem com a vida e, sobretudo, felizes pela aventura de estar vivos, até mesmo pelo borbulhar do champanha.

Há um conjunto de beleza que adere ao ser humano um lado provocador que faz pensar o que Deus quis dizer, quis fazer-se entender nesse relacionamento humano e divino. Mas como compreender o Seu modo de falar, senão o de acabar o que se denomina de talentos, dons atribuídos a todos e que não devem ser guardados? Então, seria a forma espiritual a mais concreta de registro de Deus na natureza humana?

Na tentativa de se completar este pensamento, deve se dizer dos exemplos que se têm: como as obras famosas do mundo das artes, as descobertas científicas e tecnológicas para o melhoramento da saúde e das comunicações; os dogmas da igreja, as interrogações das correntes filosóficas e de outros para cuidarem das coisas do espírito.

Há, no decorrer do ano, um vaivém contínuo de indivíduos e de grupos de indivíduos que correm atrás de afazeres; contudo há incontáveis que não têm coisa alguma a fazer, como se o mundo não pertencesse a eles. Mesmo assim, com essa imensurável diversificação, não há controvérsia; os desígnios da vida estão na base e não estremecem: o direito de viver, de progredir e de exemplificar, para as gerações futuras tomarem conhecimento.

O Ano Novo, no novo ano, funciona como uma nova ferramenta a alavancar, como um trapézio, a levar de um lado para o outro as situações, o que não tem serventia, mesmo correndo o risco de despencar, como um depósito de coisas ultrapassadas que logo se devem lançar à correnteza, abrindo novos espaços, dando lugar ao novo.

Sugere-se que esta deve ser a meta da caminhada a cada início do novo ano, pois haverá perdas e ganhos, e novos tesouros serão alcançados, dentre eles, o mais valioso: a conquista de si mesmo com os agradecimentos a Deus pela oferta dos talentos que lhe foram dados.

Ao brindarem o ano novo na taça translúcida, as borbulhas do champanha abrilhantarão a festa, simbolizando a "criação leve, efêmera e gratuita" que deve fazer pensar no processo cíclico de 365 dias e noites que Deus oferece, a permitir que se faça o que de melhor aprouver. Não há presente maior para os seres humanos.