Enio Lins
Os riscos de um mundo superpovoado por notícias falsas
Nas redes sociais, centro da comunicação contemporânea, as forças democráticas perdem de lavada para a extrema-direita no mundo inteiro. Nessa levada quem tem a força são os criadores de fake news. A partir dos Estados Unidos, a modalidade criminosa do deep fake (mentira profunda, em tradução tosca) se espalhou para o resto do planeta como uma pandemia, influenciando nos confrontos políticos e turbinando a ascensão eleitoral de extremistas como Donald Trump. Em 3/3/2021, a CNN ouviu a pesquisadora americana Laura Edelson, da Cybersecurity for Democracy, que declarou: “de uma forma ou de outra, as fontes de desinformação de extrema direita são capazes de se envolver no Facebook com seu público muito, muito mais do que qualquer outra categoria (...). Isso provavelmente é muito perigoso em um sistema que usa engajamento para determinar qual conteúdo promover”. Segundo a pesquisadora da NYU (New York University), “nosso estudo recente de que postagens de fontes de desinformação no Facebook [mostra que as notícias falsas] obtiveram seis vezes mais engajamento do que notícias factuais durante as eleições de 2020 nos Estados Unidos”. Laura estende seu depoimento às outras redes sociais, informando que, na maioria delas, as ferramentas de controle da veracidade das informações são falhas e com acesso dificultado às pesquisas independentes.
PIX DA DISCÓRDIA
No caso específico do Pix, a partir do espalhamento de uma edição adulterada de fala do ministro Haddad, há oito dias, a oposição teve 20 vezes mais interações nas redes sociais do que o governo – segundo levantamento da CNN. Um massacre. O governo se viu obrigado a recuar da proposta da Receita Federal acompanhar movimentações mensais suspeitas acima de R$ 5 mil, por conta da incapacidade de explicar que tal vigilância não geraria nenhum novo imposto, e apenas possibilitaria mais condições de rastreamento de operações do crime organizado. O efeito do vídeo criminoso foi previsto por Sidônio Palmeira que, em cima do fato, no dia 9 de janeiro, antes mesmo de assumir a SECOM, sugeriu ao ministro Fernando Haddad a gravação de um vídeo verdadeiro como resposta. Mas a superioridade da extrema-direita é tamanha que essa fake news provocou uma queda de 15,3% nas transações com Pix nos primeiros 14 dias de janeiro, em relação ao mesmo período do ano passado, conforme divulgado pelo UOL. Ou seja, ao invés do traficante ficar preocupado com suas transferências de alto valor, o camelô da esquina ficou com medo de pagar uma taxa qualquer numa venda de R$ 50 e passou a recusar Pix. Esse tropeço na comunicação obrigou o governo federal a recuar no projeto de acompanhar movimentações potencialmente suspeitas, revogando – no dia 15, menos de uma semana depois do bombardeio das fake news – o ato normativo que alterava as regras de fiscalização da Receita Federal sobre transações financeiras.
RESISTIR É PRECISO
Enfim, a mudança na Comunicação do governo federal, mesmo com grande demora, vem ainda a tempo de mudar, com alguma eficiência, a estratégia e as táticas de enfrentamento nas redes sociais. O posicionamento governamental é essencial na luta da banda sã da sociedade contra a banda podre da desinformação. Mas, o mais importante é ter consciência de que, para a Democracia virar o jogo o jogo no cyberespaço, é indispensável o avanço das forças cidadãs, não-governamentais, multiplicando o engajamento com criatividade, ousadia, e sabendo superar divergências secundárias entre as muitas formas democráticas de pensar.
Enio Lins
Sobre
Enio Lins é jornalista profissional, chargista e ilustrador, arquiteto, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas. Foi presidente do DCE da UFAL, diretor do Sindicato dos Jornalistas, vereador por Maceió, secretário de Cultura de Maceió, secretário de Cultura de Alagoas, secretário de Comunicação de Alagoas, presidente do ITEAL (Rádio e TV Educativas) e coordenador editorial da OAM.