Petrucia Camelo

INTÉRPRETE DO TEMPO

Petrucia Camelo 09 de janeiro de 2025

O novo ano leva todos a acompanharem a sua marcha incontida, numa viagem sem retorno, pois tudo impele a ir em frente, como se estivessem acompanhando passos a serem seguidos ao som variado de instrumentos musicais, como se obedecessem a um chamamento no infinito, para um encontro com o desconhecido, o qual leva a humanidade a embrenhar-se numa apaixonante aventura a perseguir os mesmos afazeres, sonhos, enganos e desenganos, como se fosse a primeira vez.

Mas o grande orquestrador é o tempo, que tem no ser humano o seu maior intérprete a entender que, na trajetória, apesar de planos e projetos, coisa alguma se tem por certo, salvo o que é imutável, o que pertence ao eterno como, por exemplo, o que é sazonal, como as estações do ano e, com um adendo, que a terra se preste para plantar a árvore que dê frutos. E, a observar que, nessa marcha, o mar não se abre, e a travessia, se houver não é feita a pé enxuto.

E esse caminhar humano a interpretar o que se evidencia, o que faz parte do seu tratado, o que condiz com a sua história, tendo a interpretação do que se tem por certo, que é a vida e a morte, conta com os interesses, onde se aloja a capacidade criativa formada por estilos imensuráveis, traçando imagens ondulantes como as ondulações das serpentes sobre as areias quentes do deserto, firmes como a decisão de não mais influir no erro, tênues como as tendências místicas, elegantes como o pedido de desculpa, instáveis como os ímpetos das paixões, seletos a refletir o reconhecimento de valores.

Para o intérprete do tempo, ainda se dá como aliado às circunstâncias, levando a parafrasear o escritor Jorge Luis Borges: eu, sou eu e as minhas circunstâncias pessoais e geradas por sentimentos que afloram como coadjuvantes. Daí, como bem se encontra no companheirismo, na solidariedade, embora não tão em voga na contemporaneidade, pois é observável a sua falta nas atitudes mais simples, como bem se vê, até quando o devoto toma assento nos bancos da igreja, o mais confortável possível, ignorando o espaço do outro, não vê que, no banco, ainda caiba mais um, ou ao retornar do altar na comunhão, traz a apreensão no rosto de ter perdido o assento.

Na caminhada do novo ano, sem o devido preparo, ocorrem as discrepâncias e, consequentemente, como pessoa alguma deve ficar retida numa dor, embora geralmente o tombo leva o indivíduo a cair; ao se machucar, deve fazer como o inseto; quando esmagado espera um pouco e, logo reabilitado, vê-se a esvoaçar.

Mas, decerto, há um estranhamento nessa jornada infinita de novo ano: o que será que procura o viajor com tão pesada bagagem, a acompanhar e querer interpretar o tempo? Por certo, não é somente a pedra filosofal, nem o Santo Graal que procura, mas ao que sugere e o que reúne tudo o que o completa e o coroa de êxito, e
o êxito está no amor.