Enio Lins

O samba do branquelo doidivanas e seu enredo discriminatório

Enio Lins 26 de abril de 2024

Esfuziante vereador carioca apresentou um projeto de lei cujo objetivo é proibir “cardápios vegetarianos e/ou veganos em unidades de ensino”. Se aprovada e sancionada tamanha excrescência, receitas dessas duas opções de pratos saudáveis serão censuradas, subtraídas, das mesas nas creches e escolas públicas da capital fluminense. É sério, não é piada. Trata-se do Projeto de Lei nº 3.027/2024, em plena tramitação pelas comissões daquela casa. Ô patriotas, quêde a liberdade de alimentação?

SE A MODA PEGA...

No batuque, no chorinho e na bossa nova, no carnaval, na ginga, no culto ao sol e ao mar, o Rio sempre forneceu régua e compasso para desenhar modas Brasil afora. Mas, desgraçadamente, também os maus exemplos cariocas – como a favelização, as milícias e o tráfico pesado – fazem escola (que não são de samba) em todos os estados. O perigo, e a tendência, é que projetos desse teor venham a se espalhar pelo país como mais uma contaminação patriotária.

EXTREMA IDEOLOGIZAÇÃO

Na esdruxula justificativa do projeto, segundo o site Metrópoles, o distinto edil carioca afirma que “a pauta ambiental se tornou associada ao vegetarianismo e ao veganismo”, e que “o tema foi sequestrado pela ‘militância de esquerda’ e que esta ‘torna cada dia mais o assunto objeto mais de crendice que de ciência séria’”. Entende o nobre vereador que a ideologia (de direita) está acima de tudo, enxergando apropriação esquerdista sobre todas as ideias alternativas. Daí esse impróvido personagem vir dar-lhes combate sem tréguas, nem clemência, muito menos inteligência.

DEMARCAÇÃO DE ESPAÇOS

Além da ignorância e estupidez, propostas como essa demonstram uma política de demarcação de território, buscando carimbar “o inimigo” com uma marca indelével para o isolar. Figuras como o vereador Zero-Dois procuram cravar estigmas ideológicos, políticos, raciais e/ou comportamentais junto à opinião pública, procurando ampliar suas próprias bases usando para tal a desinformação e o preconceito. Nesse tipo de manipulação, alternativas distintas do padrão usual, como a alimentação diferenciada, passa a ser uma “marca do mal”, um selo identificador de alguém, ou grupo, que deve ser discriminado e exorcizado.

REDUCIONISMO E DIREITISMO

Vegetarianismo e veganismo são duas concepções de alimentação saudável, envolvem entendimentos alternativos sobre a vida e nuances ideológicas não-convencionais, é verdade. Mas, necessariamente, não são “de esquerda” – a história recente informa a quem queira saber que Gandhi era vegetariano/vegano e Hitler também, assim como foram Tesla, Einstein, Leonardo da Vinci, Pitágoras, Rosa de Luxemburgo... e hoje vivem saudáveis, sem pensar em morder um taco de carne, celebridades como Xuxa, Felipe Neto, Greta Thunberg, Leonardo de Caprio, Paul McCartney... seriam todas essas criaturas comunistas comedoras de folhinhas e brotinhos?

HIPOCRISIA COMO MÉTODO

Esse tipo de estigmatização, voltada para a política de transformar o inimigo em alvo de fácil identificação, usa a hipocrisia como ferramenta, pois dentro do seu próprio círculo, entre os “homens de bem”, para perseguir homossexuais (LGBTQI+), negros, pardos, índios, pobres, mulheres, nordestinos, ecologistas, vegetarianos, veganos... são tolerados homossexuais (LGBTQI+), negros, pardos, índios, pobres, mulheres, nordestinos, ecologistas, vegetarianos, veganos – desde que sejam devotos do mito da extrema-direita. O que vale, para essa turma, é o ódio a ser destilado.