Enio Lins

Verdades sobre o golpe militar no Dia da Mentira

Enio Lins 29 de março de 2024

Como nossa Tribuna só volta a circular no dia 2 de abril, por conta do feriadão da Semana Santa, adianto aqui itens que dariam ótimas pautas entre 30 de março e 1º de abril, datas decisivas para o golpe militar de 1964, há exatos 60 anos. Vamos por partes:


1 - GOLPE MILITAR PURO

O golpe foi militar. Esse papo de “civil -militar”, é conversa para o gado dormir. Lógico que muitas lideranças civis armaram e participaram da intentona de 64, mas esses paisanos golpistas foram, por sua vez, golpeados pelos fardados. Carlos Lacerda é o maior exemplo dessa rasteira: líder inconteste pela insurreição desde 1954, dançou em 64 – foi cassado e teve a carreira política liquidada.

2 - CIVIS EXCLUÍDOS

Lideranças civis imaginavam usar as forças armadas para destituir seus adversários nacionalistas cheios de votos (Jango, JK, Brizola...), alijá-los das eleições seguintes e então – sem concorrência – ocupar o poder pelo voto, em 1965. Magalhães Pinto, governador de Minas Gerais, até que tentou se antecipar (ao próprio Lacerda, governador da Guanabara) no dia 31 de março, dando corda ao General Mourão em sua aventura pessoal de virar a mesa.

3 – MOURÃO, O PRECOCE

Olímpio Mourão Filho estava no comando da 4ª Região Militar, em Minas Gerais, quando resolveu tomar a iniciativa de dar um golpe de Estado antes que seus colegas de farda fizessem isso. No alvorecer de 31 de março, colocou suas tropas em marcha, a caminho do Rio e de Brasília. Mas aquele dia se findou com suas forças rebeldes estacionadas e com João Goulart na presidência da República. Nenhum dos conspiradores militares de alta patente confiava no general mineiro, nem o presidente decidia contra-atacar, e o golpe empacou – não aconteceu naquela data.

4- BRIGAS NA CASERNA

Unânimes no quesito “destruição da Democracia”, os conspiradores de alto coturno desconfiavam um do outro e travavam sua guerra interna nas casernas. Generais, almirantes e brigadeiros insurgentes, ao longo de dez anos, arengavam dentro das suas cavernas na preparação geral e nas tentativas isoladas de golpes (como Jacareacanga e Aragarças). Engalfinhavam-se para definir qual grupo seria o Manda-Chuva e quem seria o ditador no pós-golpe. Em 31 de março, nenhum comandante de tropa ficou ao lado de Mourão, alvo da desconfiança de todos os demais sediciosos.

5 – MILITARES PELA DEMOCRACIA

Muito se falava sobre o “esquema militar” de João Goulart e se esperava (e se temia) uma ordem do comandante supremo das Forças Armadas para o confronto com os rebeldes. Mas isso não aconteceu. Talvez por decisão isolada de Jango, talvez pela pouca disposição de oficiais superiores ao combate. Mas, dentre os militares que defendiam a Democracia em 1964, depois da vitória do golpe, 6.591 sofreram punições oficiais, muitos foram presos e torturados, vários foram assassinados – segundo levantamentos posteriores feitos pela Comissão da Verdade.

6 – PRIMEIRO DE ABRIL

Enfim, o golpe tentado desde 1954 ganhou a parada tão-somente no final do dia 1º de abril de 1964. João Goulart não renunciou, abrigou-se no Rio Grande do Sul – viajou num avião da FAB pilotado pessoalmente pelo brigadeiro Othon Correia, alagoano e herói da II Grande Guerra Mundial. A verdade é que os golpistas venceram naquele Dia da Mentira. Nas primeiras horas de 2 de abril de 1964, sob a mira das armas, o Congresso Nacional foi “convencido” a declarar vaga a presidência da República.