Enio Lins

Recordações da boemia alagoana na virada do século

Enio Lins 23 de fevereiro de 2024

Alípio Jorge se foi. Sobre a história do Bar do Alípio, pode e deve ser lido ótimo trabalho publicado por Edberto Ticianeli no site História de Alagoas – vai o link: https://www.historiadealagoas.com.br/bar-do-alipio-comemorou-as-diretas-recebeu-odorico-e-esteve-na-rota-turistica-de-maceio.html

Publicada em 22 de julho de 2017, a reportagem de Ticianeli informa que Alípio Barbosa da Silva, pai do nosso personagem, fundou o Bar do Alípio em 1951, “tendo como local o Mercado Público de Maceió. Antes de chegar ao endereço no bairro do Pontal, o Bar do Alípio passou pela Praça do Pirulito, pelo Motonáutica, Caiçara e na Lagoa consolidou-se como um dos bares mais conhecido da capital”.

BATENDO CONTINÊNCIA PARA ALÍPIO

Lauro Pedroza, médico e colega de Alípio na Escola de Ciências Médicas, lembra uma ocorrência: “Temos uma história engraçada com Alípio, entre tantas, no ECEM [Encontro Científico dos Estudantes de Medicina] de Belém do Pará”.

“Éramos uns 5/6 caminhando pela madrugada de volta para o alojamento. Todos devidamente alcoolizados. Passamos por um quartel das Forças armadas, e tivemos que atravessar a rua, pois era proibido andar na calçada do mesmo. Mais adiante, um outro quartel no caminho, e teríamos que atravessar novamente a calçada. Alípio Jorge liderou a revolta e disse: – ‘Não vamos atravessar a rua porra nenhuma. Sou um ex-aspirante do NPOR (Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva) e pronto’. Andamos alguns metros… quando pula na nossa frente um soldado com um fuzil, e manda atravessar a rua. Alipio, então, grita apontando o dedo para o militar: ‘ENQUADRE-SE, PORRA!!! – Aqui é o ex-aspirante Alípio Jorge, caralho!’ – isso em 1978, em plena ditadura militar.”

“Ficamos olhando entre nós, sem acreditar naquilo, quando o colega Paulo Alfredo, hoje ortopedista, pegou Alípio pelas pernas e o colocou nas costas, pediu desculpas ao soldado, e atravessamos a rua. Dali seguimos até o alojamento, rindo da valentia alcoólica de Alípio”.

UMA REFERÊNCIA INCONTESTÁVEL

Ticianeli: “De um pequeno bar que, por volta de 1977, reunia as lideranças do movimento estudantil e os militantes do PCdoB, o Bar do Alípio se transformou num dos principais locais para se provar o melhor na cozinha alagoana, onde no auge da temporada passava por sua cozinha uma média de 100 quilos diários de camarão”.

Segue Edberto: “E não é pequena a galeria de personalidades que já provaram do tempero do Alípio e que deram sua aprovação as principais iguarias da casa como o Camarão à Moda da Casa, o Camarão Acebolado, a Caranguejada ou o Siri ao Molho de Coco. Lima Duarte, Mário Covas, Bruna Lombardi, Franco Montoro, Caetano Veloso, Orestes Quércia, Chico Buarque de Holanda, Nara Leão, Djavan e João Bosco”. Acrescento eu, por conta própria: José e Guta Mindlin, Paulo e Chico Caruso, Calos Militerno e Anilda Leão, Cacá Diégues... sem falar nos grandes artistas que se apresentaram lá, como os saudosos Baden Powell e Moreira da Silva, dentre outras estrelas nacionais.

ALÍPIO JORGE E A POLÍTICA

Militante das causas democráticas, “Alípio e seu bar eram referências para todas as correntes políticas”, escreveu o boêmio também conhecido como “Galego da Levada”: “Fernando Collor, em 1987, foi pessoalmente levar ao restaurante o convite para que representasse Alagoas na Feira Internacional de Turismo, no Rio de Janeiro. ‘E nós aceitamos o convite do governador e o nosso stand fez o maior sucesso no Hotel Nacional’, conta Alipinho”.

“Para o engenheiro Rui Guerra, aquele foi “um lugar único na cidade”. Ele lembra que gostava de frequentar o bar para tomar Noa-Noa, coquetel de cor avermelhada que misturava rum, conhaque, suco de maracujá e groselha. ‘Eu gostava muito de ir lá com o Guilherme [Palmeira] e quando o pessoal do PCdoB estava eu aproveitava para conversar com eles’ (...), ‘nós nos xingávamos muito uns aos outros, mas aqui tudo terminava numa boa’”, registra o site História de Alagoas.

MEMÓRIAS IMORTAIS

Para Alípio Jorge, os tributos da coluna e deste frequentador do chalé no Pontal, na beira do canal da Lagoa Mundaú, de onde guardo as lembranças dos papos com Alípio e o sabor das inigualáveis fritadas que só aquela cozinha sabia fazer. – VIVA ALÍPIO!