Enio Lins

A volta dos que não foram julgados em Nuremberg

Enio Lins 04 de novembro de 2023
Destacamento nazi-semítico da Polícia Judaica perfilado para ação, a serviço dos alemães, no Gueto de Varsóvia, em maio de 1941

Segue o genocídio em Gaza, apesar de até os Estados Unidos terem sinalizado por um cessar-fogo temporário (mais apropriado seria chamar de “cessar-massacre”, pois só um lado mantém a iniciativa, e avassaladora, de ataque).

Vítimas de várias tentativas de genocídio, sendo o chamado holocausto nazista uma delas, muitos judeus pelo mundo têm se manifestado contra a atual ação genocida praticada pelo governo israelense contra os palestinos em Gaza.

Em verdade, não são poucas, nem isoladas, as vozes judaicas contra as políticas excludentes, racistas e colonialistas que têm caracterizado o Estado de Israel desde mesmo antes de sua formalização, em 14 de maio de 1948.

JUDEUS CONTRA O TERRORISMO ISRAELENSE

Assim como o argumento original para a formação do moderno Estado de Israel busca amparo nas raízes religiosas do povo judeu, o contra-argumento contestando essa construção tem – da mesma forma – base religiosa.

Para parte do judaísmo ortodoxo, o povo hebreu estaria proibido – por Deus – de ter um país para chamar de seu, e a diáspora seria uma provação divina, cabendo se manter fiéis às escrituras e serem “bons cidadãos nos países que os abrigarem”.

Nos Estados Unidos, por conta de uma grande manifestação pró-Palestina, realizada em 27 de outubro, foram presos mais de 200 judeus antissionistas (jb.com.br) durante ato realizado na estação de trem e metrô Grand Terminal, em NY.

Organizado pela Jewish Voice for Peace (Voz Judaica pela Paz), a manifestação foi considerada a maior ação “de desobediência civil que a cidade de Nova York já viu em 20 anos”. A entidade judia exige “imediato cessar-fogo”.

Em Jerusalém, foram flagradas, e divulgadas em 1º de novembro, cenas de repressão da polícia política israelense contra judeus haredim (plural de “Haredi”, segmento ultraortodoxo do judaísmo), que protestavam contra o massacre de civis palestinos em Gaza.

Os haredim defendem a retomada das negociações de paz e a convivência entre dois estados soberanos: Israel e Palestina. O segmento Haredi aposta na “convivência pacífica possível com árabes, o que já ocorria em Jerusalém muito antes da fundação oficial do Estado de Israel, em 1948”, segundo o site revistaforum.com.br

PERSONALIDES JUDAICAS PELA PAZ

Apesar da aqui citada antes e famosa carta de Einstein, Arendt e outras celebridades (em 1948) ser tida como a primeira manifestação judaica contra as tendências nazifascistas no processo de fundação do Estado de Israel, esse tipo de denúncia nunca cessou.

Na contemporaneidade, se destacam na denúncia das práticas nazifascistas israelenses personagens judeus de grande respaldo mundial como Noam Chomsky e Norman Finkelstein (ambos filhos de famílias judias sobreviventes do holocausto nazista).

Nessa luta, faz falta Amós Oz (1939/2018), com duas guerras como soldado de Israel no currículo, e depois fundador da entidade pacifista Shalon Akhshav (Paz Agora), Prêmio Nobel de Literatura (2002) e defensor da Solução dos Dois Estados.

Evidentemente, a Solução dos Dois Estados está comprometida pelo massacre ou expulsão sistemática das populações não-judaicas de seu território ancestral entre o Mediterrâneo e o Jordão, e pela destruição das estruturas políticas da Autoridade Palestina.

Repetindo já escrito sobre isso, da área proposta pela ONU (em 1948) para o Estado Palestino, restava (em 2021) menos de 10% (superpovoada) com famílias palestinas, e depois do atual massacre em Gaza não se sabe quanto sobrará.

Movimentos como o Hamas e Hezbollah, ao expressarem – em contra-ataques insustentáveis – a revolta desesperada dos povos nativos em extermínio, terminam por fornecer mais motivação aos genocidas israelenses.

Na prática, os atuais Himmler, com a estrela de Davi na braçadeira, podem dizer que a “Solução Final para o Problema Palestino” está em franco andamento. Ironia crudelíssima: a nazi-semítica “Jüdische Ghetto-Polizei” chegou ao poder em Israel sem ter passado pelo Tribunal de Nuremberg. Historicamente, a tragédia se repete como farsa, ou ultratragédia, lembrando o alerta daquele magnífico judeu barbudo, famoso e revolucionário.