Enio Lins

Maceió e a especulação imobiliária ilimitada

Enio Lins 31 de outubro de 2023
Lagoa da Anta, muito antes do hotel, foto do site História de Alagoas

Muito se comentou, nas áreas interessadas pelo Urbanismo em Maceió a notícia de que o Hotel Jatiúca estaria para ser substituído por arranha-céus. Em linhas gerais, uma notícia chocante, impactante.

Uma transformação brutal se anuncia para um raro local maceioense urbanizado em harmonia com o ambiente, em horizontalidade original, ameaçando mudar de vez o panorama urbano herdado de uma Maceió tranquila.

Esse espaço foi ocupado no final dos anos 70 pelo hotel que transformou radicalmente o turismo em Alagoas. Mas que, para sua edificação, colocou em risco, pela primeira vez no Estado, tudo em torno de um acidente geográfico natural.

Existe, em Alagoas e no Brasil, uma triste tradição em relação aos acidentes geográficos naturais (lagoas, rios, cabos...): a ocupação desplanejada, anárquica e predatória – mas, em regra, essa posse não é exclusiva.

No caso da Lagoa da Anta, sua ocupação foi sui-generis. Apropriação privada, exclusiva; porém harmonizada (parcialmente) com o meio-ambiente, horizontalizada e com conservação do acidente geográfico natural.

Assim tem sido ao longo dessas cinco décadas desde a construção do revolucionário Hotel Altesa Jatiúca, sendo a (hoje esquecida) denominação “Altesa” traduzida, nos primórdios, como Arthur Lundgren Tecidos S.A.

Mais conhecido como Casas Pernambucanas, o grupo Arthur Lundgren Tecidos S.A., para instalar seu inovador hotel em Maceió, obteve do poder público vantagens– mas não, certamente, a cessão definitiva daquela área de Marinha.

Bem e/ou mal, ao se apropriar (indevidamente) de todo perímetro em torno de um acidente geográfico natural, o Hotel Altesa Jatiúca rimou com a altura dos coqueirais que envolviam a Lagoa da Anta e o mar de Mata-Garrote.

Sim, o hotel das Casas Pernambucanas mudou a denominação da antes Praia do Mata-Garrote para Jatiúca, espalhando o nome do sítio do Mestre Théo Brandão para toda a beira-mar desde a Ponta Verde até Cruz das Almas.

Mudou tudo, como numa espiral de novidades, inclusive privatizando também uma nesga de praia, por décadas, até que a prefeitura, enfim, ousasse reassumir uma estreita área, entre o hotel e a praia, como passeio público.

Agora se divulga que aquela tênue harmonização com a Natureza, ilhada na bagunça imobiliária, vai pro lixo, e a área – até então bucólica – será integrada à esculhambação urbana em que está se transformando o Litoral Norte da Capital.

Sem saneamento, sem vias adequadas, com gabarito liberado (pode-se construir quantos pavimentos der na telha), sem áreas verdes, o antes belo Litoral Norte de Maceió se atrofia pela ocupação urbana desordenada.

Com um trânsito cada vez mais caótico (a ponto de se imaginar que a destruição do corredor Vera Arruda seria útil) a substituição do atual Hotel Jatiúca por um apinhado de prédios (com quantos andares?) é uma estupidez, um acinte.

Mais um tremendo prejuízo urbano se anuncia para Maceió, cidade historicamente exaurida, depredada, anarquizada, pela especulação imobiliária ilimitada.