Enio Lins

A moça que saiu de Dois Riachos para conquistar o mundo

Enio Lins 05 de agosto de 2023
Sua majestade, Marta, em desenho do genial Quinho Ravelli

Marta, a magnífica, como todo mundo soube, na quarta-feira, 2 de agosto, anunciou sua aposentadoria da seleção feminina de futebol. Impactou uma imensa legião de fãs, mas escolheu o momento certo para encerrar uma fase.

“Ela se despede da camisa amarela com 116 gols, dois títulos de Pan-Americano (2003 e 2007), duas medalhas olímpicas de prata (2004 e 2008), três Copas América (2003, 2010 e 2018) e um vice-campeonato de Copa do Mundo (2007)”.

Acima, entre aspas, está replicado um eficiente resumo publicado pelo site https://www.lance.com.br/, em reportagem onde destaca os seis títulos (cinco consecutivos) de “Melhor Jogadora do Mundo”, marca também inédita.

Marta encerra sua jornada na seleção aos 37 anos, depois de disputar seis copas do mundo, desde 2003, e como a maior artilheira em toda história dos mundiais (feminino e masculino), com 17 gols na conta-poupança.

Pelé encerrou sua carreira profissional aos 37 anos, depois de disputar quatro copas do mundo (desde 1958) e ganhou três. Nas Copas marcou 12 de seus 1.283 gols, e conquistou o título popular de maior jogador de futebol da história.

Pelé e Marta: duas personalidades majestáticas mundiais, sem dúvida. Atletas que brotaram em ambientes discriminatórios e venceram todos os obstáculos, projetando-se para muito além do esporte e se consolidaram como ícones globais.

Marta, no particular de sua história ainda em curso, é uma pioneira. Primeira craque reconhecida mundialmente no até então desconhecido e menosprezado segmento feminino do futebol – tido como esporte exclusivo para homens.

Mas a guerreira de Dois Riachos não aposentou seu protagonismo, afinal existem mais uniformes, mais disputas além da Copa do Mundo. Marta ainda tem muito a fazer pelo esporte e pelas lutas femininas.

Ela goleou, rompeu barreiras. Venceu – aqui e alhures – num mundo misógino, repleto de discriminações machistas, sociais, comportamentais, sexuais, raciais, regionais. Sobre ela pesam mais preconceitos que pesaram contra Pelé.

Seu largo sorriso é um gol de placa permanente, direto, sem firulas. Riso que acompanha seus lances no campo, suas entrevistas, seus momentos com fãs e com a namorada – aqui chutando para longe o preconceito sexual.

Marta chorou na entrevista dada um dia antes do jogo que desclassificaria o Brasil da Copa 2023. Lágrimas ao recordar as dificuldades de começo de carreira, mas talvez intuísse, por sensibilidade e experiência, a desclassificação que se avizinhava.

Lágrimas justas nos dois sentidos, pois seu começo de carreira foi puro desbravamento, desde os rachas no leito do rio seco em Dois Riachos. E a desclassificação iminente significava encerrar a carreira sem levantar a taça do mundo.

Mas agora é hora de alargar o sorriso por tudo que conquistou e pelo que conquistará a partir do encerramento do ciclo Copa do Mundo. A partida continua. Lhe resta um bom tempo como jogadora profissional e muitas são as opções no porvir.

Importante é a menina de Dois Riachos seguir jogando o jogo da luta contra a discriminação, o jogo da formação esportiva, o jogo da inclusão social... Uma celebridade internacional com o conteúdo de Marta não se aposenta das grandes causas.

Aplausos para Marta, aplausos por sua atuação na Seleção Brasileira Feminina de Futebol, aplausos por seu papel na luta pela afirmação dos direitos das mulheres, aplausos por tudo que fez – mas, especialmente, aplausos por tudo que certamente fará depois de colocar no cabide a camisa canarinha.