Enio Lins

O crime do craque Robinho

Enio Lins 22 de junho de 2023

Eça de Queiroz, num de seus magistrais livros, “O crime do padre Amaro”, publicado em 1875, visitando o poder do confessionário, aborda o pecado machista encapsulado e turbinado pela força da batina, versus a vulnerabilidade social da mulher.

Longe de se dissipar, esse poder destruidor do machismo se apresenta tão nocivo e covarde como nos séculos passados. Ao contrário do jogo de sedução retratado por Eça, a violência pura, o estupro, parece atrair mais aos cafajestes contemporâneos.

Os diálogos do tal Robinho poderiam ser impressos em cartões vermelhos, pois todas as falas dele são faltas graves, confissões de um mesmo crime: estupro. Estupro de vulnerável, violentação coletiva, covardia ainda maior e mais repugnante.

Não há arrependimento, sequer consciência pesada, apenas a reafirmação do prazer opressor, da naturalização da violência e a disposição – pusilânime – de fugir das responsabilidades, aventando o desejo da agressão física à vítima violentada.

Como de resto acontece com todos os covardes, o cara que é (ou foi) um craque está pisando na bola e fazendo uma sucessão de gols contra. Certamente aposta num apito mudo da arbitragem. Mas sua argumentação diz muito do lodo ideológico em que joga.

Emblemática é a comparação que o jogador, ex-capitão do Santos, faz entre si próprio e outro ex-capitão (dos demônios), o Jair. Se acha, juntamente com o mito, vítima de uma imprensa perseguidora. Pobres garotos, tão inocentes...

É o mesmo arcabouço ideológico que permeia, embasa, atos e fatos de gente como o falso messias e o craque estuprador, e nesse item – para esses canalhas – a máxima é: se a mulher merecer, é para ser estuprada. Simples assim.

Esse pensar – criminoso – é o mesmo que justifica tentativas de golpe e privilégios de todos os tipos, até os mais absurdos. É o direito de levar na marra. Afinal eles se acham ungidos e que o poder lhes permite tudo, e quem se opor a isso é “comunista”.

Esse praticar do poder machista, avassalador, é o que gera e faz multiplicar os feminicídios aqui e alhures, dentre outros horrores. Enquanto o craque segue impune dentro das quatro linhas, a falta por ele cometida continuará banalizada, permitida “na moral”.

Hoje na história

22 de junho de 1633 – Galileu Galilei, cientista e astrônomo, é condenado pela Santa Inquisição a renegar sua tese de que a terra não é o centro do universo, e sim um planeta que gira em torno do sol tal qual os demais.

Sua sentença foi lavrada em três condenações, resumidamente: 1) “abjurar, cura e detestar” suas opiniões como ofensivas à “Sagrada Escritura”; 2) sentenciado à prisão comum, em seguida pena convertida em prisão domiciliar para o resto de sua vida; 3) sua obra considerada blasfema, “Diálogo” foi banida e proibidas de publicação todas as obras de sua autoria.

Dizem as lendas que, ouvindo calmamente a lista de penalidades, cumpriu a primeira delas, renegando suas teorias científicas – mas, assim que fez a profissão de fé em voz alta, teria murmurado “e, ainda assim [a terra] se move”.

Em sua prisão domiciliar, Galileu continuou a pesquisar e escrever clandestinamente até 8 de janeiro de 1642, quando morreu, aos 77 anos. Na ocasião, admiradores tentaram enterrá-lo de forma digna, apropriada à sua importância histórica, em um mausoléu em tributo por sua obra científica, mas o papa Urbano VII desautorizou a iniciativa pelo fato de Galileu ser um condenado pelo Santo Ofício.