Enio Lins

Formolmente, o coração é de Pedro IV

Enio Lins 23 de agosto de 2022

Chegou ao Brasil o coração de Pedro de Alcântara, aqui Imperador Pedro I e alhures Rei Pedro IV de Portugal. Foi monarca de dois tronos independentes: o brasileiro de 1822 a 1831, e o português entre março e maio de 1826. Mergulhado em formol desde 1834, quando parou de bater no peito de seu dono, na portuguesa cidade do Porto, o inanimado conjunto de músculos cardíacos que aterrissou em solo tupiniquim é, oficialmente, o de Pedro IV, Rei de Portugal.

Que jamais lhe seja esquecida a glória de liderar a independência brasileira, apesar de tê-la feito “antes que algum aventureiro o fizesse”, como recomendou seu pai, Dom João VI, preocupado com a inevitável perda da mamata tropical. Conforme desejo paterno, Pedro manteve as duas coroas sobre as mesmas cabeças, familiarmente, como se nada tivesse acontecido.

Pedro merece homenagens. Mas seu papel na história é merecedor de mais avaliações. Além dos benefícios da independência, os malefícios da forma como foi feita necessitam de mais estudos e de serem levados à balança da História. Naquele coração reinol, morto e formolizado, cujos primeiros e derradeiros batimentos se deram em solo lusitano, vive parte significativa das contradições e dos longevos problemas brasileiros.

Foi um golpe a Independência do Brasil? Se visto pela ótica de quem avalia a Proclamação da República como um golpe, sim. Ambas as rupturas se deram sem significativa participação popular e sem alteração radical no tocante aos sistemas políticos/administrativos do antes e depois. Mas, inegavelmente, foram rompidos laços essenciais nos dois casos.

Pedro I garantiu a continuação da dependência econômica do Brasil ao modelo de Portugal, aonde retornou como Pedro IV, para segurar sua filha – Maria II – no trono. O mesmo grupo, naqueles momentos, seguiu no poder nos dois lados do Atlântico, reduzindo a desenvoltura brasileira nos primeiros e essenciais passos para a construção de um país soberano de fato.

Fato é que o Brasil, entre as três maiores e mais ricas colônias europeias no Novo Mundo, é a menos desenvolvida. Os Estados Unidos dispensam apresentações sobre seu sucesso depois da separação (revolucionária) da Inglaterra. O Canadá, cujos progresso e riqueza ombreiam-se a seus vizinhos estadunidenses, ainda tem como soberana a coroa britânica. Ao Norte, portanto, dois caminhos (opostos) de sucesso. Ao Sul, uma via tortuosa, travada, indo e voltando eternamente ao “país do futuro”. Culpa do coração de Dom Pedro?

NOTAS

# Os lançamentos das candidaturas para a Assembleia Legislativa de Alagoas têm superado, alguns, os lançamentos das candidaturas majoritárias. Fenômeno inusitado, refletindo a tremenda disputa por cada cadeira na Casa Tavares Bastos.
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Nesta eleição é mais fácil um dromedário passar pelo buraco de uma agulha que um nome novo entrar no reino do Poder Legislativo alagoano, pois a estrutura solidária entre as 27 atuais titularidades da casa é sem precedentes.
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Essa estrutura solidária, imune às divergências pessoais, políticas e eleitorais entre deputados e deputadas em reeleição (pessoalmente ou através de nomes substitutos) é uma obra de engenharia política do presidente da ALE, deputado Marcelo Victor.
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O entrevero entre Antônio Albuquerque e Teca & Teresa Nelma, em ato público com a presença de Rui, não é coisa boa para Palmeira. Replicado como vídeo nas redes sociais, não deve causar dano nem a Albuquerque nem à Teca e/ou Teresa.
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Albuquerque, que manteve o controle da situação, receberá apoios do setor mais conservador; Teresa & Teca terão a solidariedade dos segmentos mais progressistas. Mas o tumulto no palanque majoritário é ruim para Rui.
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Releases simpáticos a Rodrigo Cunha, garantem que, “nas próximas pesquisas”, Fernando Collor despencará. Antecipando um “derretimento” do líder do PTB, o material lista acusações contra o único candidato a governador que defende o mito.

HOJE NA HISTÓRIA

23 DE AGOSTO DE 1892 – Deodoro da Fonseca, aos 65 anos, morre. Padecia de graves problemas de saúde devido a ferimentos recebidos na Guerra do Paraguai (1864/1870), e em 15 de novembro de 1889, por ser o único nome respeitado por todas as correntes opositoras ao regime imperial, foi literalmente retirado da cama, onde ardia em febre, para dar fim à monarquia no Brasil. O proclamador e primeiro presidente não era um republicano histórico, mas virou o maior símbolo da República.